Instituída pela Lei n. 12.305/10 e regulada pelo Decreto n. 7404/10, a Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS) abrange, sem dúvida alguma, grande parte dos assuntos ambientais que brevemente irão invadir o judiciário brasileiro.
Segundo a lei da PNRS, a responsabilidade pela adequada gestão dos resíduos, como as embalagens, por exemplo, será atribuída a todos aqueles que participarem do seu ciclo de vida (sejam fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores ou titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos). Nesse sentido, não há dúvida de que, muito embora essa responsabilidade seja individualizada e encadeada, todos poderão ser responsabilizados em casos de ocorrência de danos ambientais oriundos da má gestão dos resíduos sólidos derivados desses produtos ou, inclusive, do próprio produto após o seu consumo.
As normas, que são de 2010, ainda não estimularam ações categóricas por parte do poder público, tampouco apresentaram reflexos claros quanto à sua aplicação, porém não é recomendável, de maneira alguma, que os participantes (o setor empresarial, principalmente) busquem escudo na falsa segurança trazida pela “aparente” inércia do poder público, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou – em caso ocorrido antes mesmo da publicação dessas normas, no Recurso Especial n. 684.753 – de maneira positiva quanto à possibilidade de se impor a responsabilidade pós-consumo aos próprios fabricantes.
A lei da PNRS solidificou ainda mais esse entendimento, pois segundo o seu art. 1º, §1º, estão sujeitas à observância dos dispositivos dessa lei as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos, bem como aquelas pessoas que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos.
Assim, insertos na lei como um instrumento à sua concretização, os sistemas de logística reserva, que devem ser executados por aqueles que participam ativamente na fabricação e distribuição dos produtos, deverão auxiliar substancialmente na redução da geração de novos resíduos, bem como resultar em uma eficaz gestão ambientalmente adequada dos resíduos sólidos, uma vez que esses sistemas podem viabilizar a coleta e a restituição de determinados produtos ao setor empresarial. Essas medidas podem reduzir drasticamente a produção de novos resíduos, ou até mesmo o impacto daqueles já existentes, pois os setores responsáveis deverão reaproveitar os materiais devolvidos no seu ciclo produtivo ou, ainda, encontrar destino ambientalmente adequado àquelas partes que não podem ser reutilizadas.
Se tomarmos o exemplo do setor das embalagens, podemos afirmar que esses sistemas de logística poderão até mesmo reduzir, de certa forma, a possibilidade da responsabilização das empresas mediante prováveis passivos ambientais, uma vez que esse setor terá melhores condições de impedir que os seus produtos venham a desencadear problemas ambientais. Além do mais, se bem aplicadas, essas iniciativas poderão trazer consideráveis retornos financeiros, na medida em que a reutilização das embalagens retornáveis ou até mesmo o reaproveitamento de materiais na produção podem representar uma economia considerável às empresas que souberem gerir bem os seus ciclos produtivos.
Como instrumentos fundamentais à concretização dos sistemas de logística reversa, não podemos deixar de igualmente mencionar a importância dos acordos setoriais aos participantes desse processo, uma vez que esses acordos – que deverão ser firmados entre o Poder Público e os representantes setoriais – se apresentam como uma excelente ferramenta que pode ser utilizada em favor das esferas industriais e empresariais.
Vejamos, por exemplo, o acordo setorial das embalagens gerais, proposto ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) por uma coalizão de sindicatos e associações em representação de uma variada gama de participantes do ciclo de produção desses produtos. A adesão ao acordo, que apresenta um rol de responsabilidades individualizadas e encadeadas, poderá isentar os seus participantes, por exemplo, da obrigação de apresentar um plano de logística reversa individual ao MMA. Portanto, uma boa representação das empresas na etapa de elaboração e execução dos projetos é essencial, pois como dito anteriormente, um sistema de logística eficaz pode trazer diversos benefícios às empresas que aderirem ao acordo. Esse acordo, que ainda se encontra em processo de consulta pública (recentemente prorrogada pela Portaria n. 390 do MMA, em 23 de outubro deste ano), e que aparentemente caminha para o seu acerto final com o Ministério, requer atenção reforçada, pois devido à sua larga abrangência, que irá englobar um leque de embalagens que representam a grande maioria dos resíduos comuns, o acordo poderá representar um grande avanço na concretização das diretrizes previstas pela PNRS.
Certamente, a proteção ao meio ambiente pode andar de mãos dadas com o crescimento dos setores empresariais e industriais, uma vez que a destinação ambiental adequada dos resíduos e o retorno dos produtos/embalagens aos seus fabricantes não representa somente um substancial ganho ambiental, porquanto a prática de um eficaz sistema de logística reversa pode diminuir os custos de produção, bem como evitar os riscos de responsabilização desses setores, melhorando, assim, a imagem da empresa perante o mercado consumidor.
*Artigo escrito por Guilherme Berger Schmitt, mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e advogado associado à Buzaglo Dantas Advogados, parceiro voluntário do Instituto GRPCOM no blog Giro Sustentável.
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