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No recente dia 31 de outubro foi divulgado o último ato da verdadeira caça às bruxas que vem sendo imposta ao Terceiro Setor. Em ato absolutamente reprovável, a Excelentíssima Presidente da República expediu o Decreto n.º 7.592/2011, assinado em conjunto com o Ministro Chefe da Controladoria Geral da União, Jorge Hage Sobrinho, que determinou a suspensão das transferências de recursos federais a entidades sem fins lucrativos pelo prazo de 30 dias. Assim o fazendo, imputou a todo o Terceiro Setor a pecha da corrupção, esforçando-se em convencer a opinião pública de que todas as entidades se prestam a atividades ilícitas.

Motivado por escândalos recentes nas suas pastas ministeriais que custaram o cargo de seus pares, o governo preferiu igualar quadrilhas – que se utilizam de esquemas ilícitos que envolvem repasses de recursos a falsas entidades e que em momento algum podem ser chamadas de Terceiro Setor, mas de entidades criminosas – a todas as entidades do Terceiro Setor que desenvolvem atividades sociais de vital importância para o nosso país desde o seu descobrimento. Mas são coisas diferentes! Enquanto as falsas entidades se prestam a desenvolver atividades “empresariais” ilícitas – ou seja, distribuir lucros aos seus “donos” –, o verdadeiro Terceiro Setor desenvolve atividades sem fins lucrativos de relevância pública (portanto não são empresas e não têm proprietários, conforme costuma ser divulgado na mídia).

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A pior conseqüência deste ato para o Terceiro Setor certamente não é a suspensão dos repasses em si, muito embora as dificuldades operacionais que isto ocasionará sejam relevantes. Mas sim o fortalecimento do sentimento coletivo de repúdio às entidades sem fins lucrativos que vem sendo construído no Brasil, principalmente a partir da “CPI dos anões do orçamento” em 1993. De lá para cá a criminalização das ONGs pelos veículos de comunicação, somada à produção legislativa absolutamente desestruturante de suas atividades, tem levado a opinião pública a um preconceito acrítico que solidifica cada vez mais a expressão “pilantropia”, tão prejudicial ao verdadeiro Terceiro Setor. E o Decreto referido é o último ato desta série de ataques.

Não se está aqui, de forma alguma, defendendo a má utilização de recursos públicos por entidades sem fins lucrativos, tampouco a impunidade daqueles que se utilizam destas estruturas para o desvio de recursos. O que se defende é a seriedade, pois simplesmente jogar na vala comum o importante trabalho social realizado pelas entidades sérias que integram o verdadeiro Terceiro Setor, equiparando-as a quadrilhas, é dar as costas a uma realidade que merece debates mais técnicos.

Tivesse o governo dado continuidade às premissas extraídas do anterior Decreto n.º 7.568/2011, que alterou a legislação que rege as contratações entre o Poder Público e as entidades sem fins lucrativos para criar novas exigências e, além disso, determinou a criação de Grupo de Trabalho com participação paritária para discutir o tema, continuaríamos enaltecendo o caminho proposto. Tendo feito o contrário, merece críticas.

Neste momento, mais do que uma medida desmoralizante do Terceiro Setor, o que se faz necessário é a implementação do referido Grupo de Trabalho – o que deve acontecer em evento que ocorre entre 09 e 11 de novembro, em Brasília – para dar início a uma pauta de debates do Novo Marco Regulatório do Terceiro Setor no Brasil, que enfrente temas como:

a)Definição de uma política de Estado (não de governo!)para o Terceiro Setor, inclusive quanto ao seu relacionamento com o Poder Público, que traduza os mandamentos constitucionais de participação da sociedade civil e através da qual deverá ser definido se e como a República brasileira acolhe a realidade do Terceiro Setor;

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b)Concluindo pelo seu acolhimento, definições conceituais claras relativas a áreas de atuação do Terceiro Setor, requisitos transparentes de qualificação, regras unificadas de fomento e fiscalização, centralização do controle, regime tributário, e dentre tais temas sugerimos especialmente:

– Proibir a utilização dos convênios entre o Poder Público e o Terceiro Setor, aperfeiçoando ferramentas que propiciem controles formais e controles de resultados (como o termo de parceria, criado pela Lei n.º 9.790/99, a Lei das OSCIPs);

– Proibir as emendas parlamentares, obrigando que todo e qualquer relacionamento nesta seara seja objeto de concurso de projetos;

– Criar Agência Reguladora autônoma de fomento, regulação e fiscalização das atividades desenvolvidas pelo Terceiro Setor, a exemplo da Agenzia per le ONLUS italiana e da Charity Comission e do Office of the Third Sector do Reino Unido, ou estrutura semelhante .

*Artigo escrito por Leandro Marins de Souza, Doutor em Direito do Estado, advogado e colaborador do Núcleo Interdisciplinar do Terceiro Setor (NITS) da Universidade Federal do Paraná, parceira do Instituto GRPCOM.

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