Por Ilan Cuperstein/C40
As mudanças climáticas não são justas. A população menos responsável pelas emissões de gases de efeito estufa, as que menos se beneficiaram de nossas sociedades viciadas em combustíveis fósseis, são as que sofrem mais as suas consequências. Os mais pobres e mais vulneráveis das nossas sociedades estão desproporcionalmente em risco do aumento do nível do mar e de desastres relacionados ao clima. Mulheres e crianças sofrem mais que homens. Talvez, o mais injusto para todos, seja o fato de que são as próximas gerações que viverão com as consequências das mudanças climáticas a longo prazo.
É nas cidades que essas tensões aparecem de forma mais grave. Mais de 50% da população mundial vive em cidades e a tendência é de desigualdade crescente entre cidadãos urbanos. Em várias das cidades que crescem mais rapidamente no mundo, um bilhão de pessoas vivem atualmente em favelas, sem acesso à terra, habitação ou serviços básicos. À medida que as mudanças climáticas aumentam a vulnerabilidade de cidades a riscos, sejam eles de enchentes, secas ou eventos climáticos extremos, essa desigualdade se torna uma questão de vida e morte para centenas de milhões de pessoas. Preços crescentes de alimentos devido ao clima afetam desproporcionalmente populações de baixa renda, algumas das quais têm que usar mais de 60% de sua renda para comprar alimentos.
Prefeitos e prefeitas têm liderado apelos pela urgência das ações climáticas, para proteger a saúde, prosperidade e bem-estar de seus cidadãos. As cidades são responsáveis por 70% das emissões globais de gases de efeito estufa, mas também são os locais onde os impactos climáticos são mais sentidos. E cada vez está mais claro que é impossível lidar com as mudanças climáticas sem lidar com a desigualdade e vice-versa.
Em primeiro lugar, as reduções que podem ser realizadas de maneira mas eficiente e imediata são aquelas focadas nos maiores poluidores. 10% da população contribui com mais de 50% das emissões globais. Em segundo lugar, as metas ambiciosas colocadas no Acordo de Paris não serão totalmente eficazes se não levarem em conta a inclusão. Políticas climáticas devem ser acessíveis e bem comunicadas. Se uma cidade coloca como meta aumentar as viagens em transporte público como uma forma de reduzir as emissões do setor de transporte, os ônibus e trens devem ser seguros, baratos e acessíveis para todos os cidadãos. A Cidade do México aumentou significativamente as viagens de bicicleta focando especificamente em ações de marketing e da infraestrutura de ciclovias para mulheres.
Em terceiro lugar, as cidades que investem em desenvolvimento de baixo-carbono aumentarão o nível de qualidade de vida mais rápido e de maneira mais economicamente sustentável do que aquelas que se ativerem a modelos de combustíveis fósseis. Isto se dá porque ações climáticas podem produzir uma série de benefícios, incluindo melhorias de saúde, melhor qualidade do ar e mais oportunidades de emprego. Na China por exemplo, medidas para melhorar a qualidade do ar aumentaram a expectativa de vida em 20 meses. De acordo com o Just Transition Centre, quase 10 milhões de pessoas ao redor do mundo estão empregadas no setor de energias renováveis, das quais quase dois terços estão na Ásia.
As metas do Acordo de Paris apresentam uma oportunidade única para criar uma sociedade urbana mais inclusiva, com novas proteções para grupos historicamente marginalizados. De acordo com a Agência Internacional de Energia, o número de pessoas sem acesso à eletricidade deve diminuir mais de 30% até 2030 e a vasta maioria destes novos consumidores nem sequer utilizarão combustíveis fósseis, utilizando diretamente energias renováveis.
Para garantir que as ações climáticas sejam inclusivas e efetivas para toda a sociedade, as ações climáticas devem incluir a participação das comunidades durante o processo de planejamento e implementação, conceitos de justiça e acessibilidade no desenho das políticas e de serviços e também garantir que os benefícios das ações climáticas sejam distribuídos da forma mais equitativa possível. A construção de cidades mais justas é parte essencial da solução para o desafio das mudanças climáticas.
*Ilan Cuperstein é formado em Relações Internacionais pela PUC-Rio, e Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela London School of Economics. Trabalhou na COPPE/UFRJ por 4 anos como assessor internacional e como representante da instituição em Beijing no Centro Brasil China de Mudanças Climáticas por 3 anos. Trabalha desde 2015 na C40 Cities Climate Leadership Group, onde atualmente é vice-diretor regional para a América Latina, responsável pelo engajamento com as 12 cidades membro da região em diversos programas relacionados a mudanças climáticas no âmbito municipal. O C40 é parceiro do Instituto GRPCOM no blog Giro Sustentável.
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