O presidente Jair Bolsonaro foi ao Congresso levar a proposta de reforma da Previdência preparada por sua equipe econômica e aproveitou para dizer que mudou de ideia, após ter votado contra todas as reformas que já passaram pela casa. Agora, está do outro lado do balcão e precisa convencer os congressistas daquilo que ele até outro dia combatia. Faltam votos para aprovar o projeto, assim como falta convicção ao recém-convertido.
Bolsonaro começou seu governo com uma base de apoio insuficiente e instável no Congresso. Calcula-se que tem em sua base cerca de 240 deputados, mas esse é um número volátil, que ainda será colocado à prova. Para a reforma da Previdência, a margem é ainda pior. Fala-se em 200 votos. Talvez um pouco mais com algumas mudanças no texto. No Senado, o cenário é semelhante.
Desde o dia em que o projeto foi apresentado, começaram as apostas para acertar quais são os bodes na sala previdenciária. Em outras palavras, os analistas e economistas querem adivinhar quais trechos do projeto estão ali só para satisfazer o Congresso na hora de cortar tópicos espinhosos. A reforma teria de perder uns quilos antes de ser palatável aos deputados e senadores.
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Há alguns candidatos a bode. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse em entrevista ao Valor nesta segunda que a inclusão do benefício de prestação continuada (BPC) na reforma contamina o debate. A proposta do governo é fazer com que o BPC para idosos seja concedido em fases, partindo de R$ 400 aos 60 anos e subindo para um salário mínimo aos 70 anos. Hoje, ele é concedido aos 65 anos e vale um salário.
Outro ponto que ganhou a plaquinha de bode está nas aposentadorias rurais. Hoje, basta a comprovação de trabalho no campo para um idoso (55 anos para mulheres e 60 para homens) conseguir a aposentadoria de um salário mínimo. A reforma quer estipular a idade de 60 anos para ambos os sexos e instituir a contribuição obrigatória por no mínimo 20 anos.
Por alguma razão que precisa ser melhor explicada, a equipe econômica incluiu duas alterações no FGTS dentro do texto da reforma. Uma delas é a extinção da contribuição para o fundo de aposentados que continuam a trabalhar. Além disso, as empresas não teriam de pagar a multa de 40% do FGTS para quem for demitido após a aposentadoria. São alterações com impactos fora do sistema previdenciário.
Quem conhece o poder dos lobbies em Brasília sabe que a maior oposição ao projeto virá do funcionalismo público. A equipe do ministro Paulo Guedes não economizou: estipulou uma idade mínima maior, com transição mais curta e contribuição maior para o funcionalismo que tem direito a se aposentar com benefícios acima do teto do INSS. É justo, mas bem mais do que previa a proposta do governo Temer, que sofreu muita resistência.
É normal que projetos desse porte sofram mudanças no Congresso, mas o governo teve de assumir o risco de elas saírem do seu controle. Como a base de apoio é estreita diante da necessidade para se aprovar uma PEC, as concessões não são só esperadas. Elas são uma certeza. Bolsonaro não teve força política suficiente para construir durante a transição uma relação com o Congresso que fosse menos incerta.
Em parte, esse cenário é culpa do presidente, que quis manter Onyx Lorenzoni na Casa Civil e não soube lidar com a crise que levou à demissão de Gustavo Bebianno. E, em parte, é reflexo de Bolsonaro ter mantido o veto a nomeações dos partidos em boa parte do governo. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, já declarou que a aprovação da Previdência seria mais fácil com a distribuição de cargos nos estados para indicados de senadores e deputados. Talvez ocorra isso mesmo, via o banco de talentos que o governo quer criar.
De tudo que está na reforma, o menos necessário é a alteração no FGTS. Não traz economia para o INSS e torna para as empresas mais barato empregar aposentados do que trabalhadores mais jovens. Valeria deixar o assunto para um projeto à parte, se Guedes fizer questão de discutir o tema.
A mexida no BPC traz no fundo a questão dos incentivos para a contribuição ao INSS. Se a idade mínima for a mesma exigida para a aposentadoria, é possível que muita gente prefira não contribuir contando com o BPC como benefício para a velhice. O Congresso pode escolher deixar essa possibilidade aberta, o que não vai contribuir para um ajuste do tamanho que o país precisa.
No caso da aposentadoria rural, é preciso levar em conta que ela é a maior causa isolada do déficit. Por isso, é natural que se busque aumentar a receita, começando pelo agronegócio que tem funcionários contratados e pode recolher ao INSS e pelos agricultores que têm renda suficiente para contribuir.
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