Na última semana, ficou claro que a briga para ir ao segundo turno ficou mais difícil para os três candidatos que foram ultrapassados pelo petista Fernando Haddad (PT). De acordo com as últimas pesquisas, Ciro Gomes (PDT) estaria um pouco à frente de Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede), a ponto de ser apontado por alguns como a “terceira via” possível nessas eleições. É um erro de interpretação sobre o que o pedetista propõe para o país: ele é apenas um desvio para se voltar ao populismo estatista da década passada, como também propõe o PT.
A expressão “terceira via” tem uma conotação política forte. Surgiu no fim dos anos 90, quando o sociólogo britânico Anthony Giddens tentou teorizar uma nova ideologia para a esquerda representada por figuras como Tony Blair, no Reino Unido, Bill Clinton, nos EUA, e Gerhard Schröder, na Alemanha. A terceira via abandonava sua base sindical e a luta de classes para abraçar um pedaço do liberalismo econômico como forma de manter pautas de esquerda. Com o tempo, desaguou no distanciamento da esquerda europeia de suas bases, a perda do poder para a direita e o ressurgimento de alas socialistas tanto no Partido Democrata americano quanto no Trabalhista inglês. No Brasil, a terceira via era representada pelo governo Fernando Henrique Cardoso, o sociólogo que pediu para que esquecessem o que ele escreveu.
Ciro Gomes não é nenhuma das duas possibilidades de terceira via. Ele não é o social-democrata que fez as pazes com o mercado e a globalização, nem a alternativa menos pior diante de Jair Bolsonaro (PSL) e Haddad. As características de seus discursos e de seu plano de governo são as seguintes: estatismo vários tons acima do que temos hoje no país, populismo anti-mercado e agressividade contra os oponentes. Para ele, chamar alguém de nazista, fascista e filho da puta é o mínimo necessário para demonstrar que está do lado do povo.
O plano de governo do PDT tem pérolas do estatismo ultrapassado. Ressalto as mais interessantes: retomar os campos de petróleo vendidos ao exterior (como se tivessem sido levados embora por multinacionais do mal), controle do câmbio para desvalorizar o real, recriar o fundo soberano (miragem do governo petista que secou por falta de dinheiro), taxar a herança dos ricos para poder dar desconto no imposto das empresas, acabar com o teto de gastos, uso dos bancos públicos para reduzir juros, a renegociação de 60 milhões de dívidas de pessoas físicas pela Caixa e Banco do Brasil, impedir a joint venture entre Embraer e Boeing, fortalecimento da Unasul e um capítulo só de antiamericanismo. “O Brasil precisa ganhar independência dos Estados Unidos em tecnologias de comunicação e defesa. Para ser parceiro, não pode ser protetorado”, diz o programa de Ciro.
Apesar de tudo isso, Ciro não é a esquerda tradicional, de base sindical ou trabalhista, e já transitou por governos do PMDB, PSDB e PT. Tem ar da velha política e, para muita gente, basta como sinal de que na prática ele não fará tudo o que diz – uma grande vantagem competitiva no atual cenário político. Depois de eleito, ele ignoraria a promessa de rever a reforma trabalhista? Faria um ajuste fiscal de verdade ou ficaria preso à ilusão de que dá para fazer isso só reduzindo benefícios fiscais e tributando heranças (mais impostos)?
Vista de perto, a candidatura de Ciro Gomes não tem o que oferecer como uma terceira via. Ela não traz solução para o gasto sempre crescente com o funcionalismo, nem uma proposta clara para o déficit da Previdência – que sutilmente ignora com a ideia de separar os gastos assistenciais das aposentadorias em si, um pleito antigo do PT e de outros contra a reforma. Suas promessas juntam o “novo desenvolvimentismo” de Dilma Rousseff, o nacionalismo fracassado dos anos 70 e um reformismo tímido. É pouco para se diferenciar do PT como plataforma política. E pouco para se diferenciar de Bolsonaro como hábito de se fazer política.