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Guido Orgis

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Como Guedes transformou precatórios em meteoros

Ministro da Economia, Paulo Guedes: meteoro é a metáfora da vez. (Foto: Edu Andrade/Ascom/ME)

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Desde que começou a tratar publicamente do aumento no volume de precatórios a serem pagos em 2022, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem usado a linguagem figurada. A conta seriam na verdade meteoros que caíram de repente. Para salvar o país de um fenômeno imprevisível e inevitável, é preciso pedir socorro.

Precatórios são talvez parecidos com meteoros (a comparação mais correta seria com asteroides, mas esse é um detalhe). São conhecidos, observáveis e têm uma probabilidade de se chocarem com a Terra. Astrônomos acompanham asteroides que podem colidir daqui 100 anos.

Quero dizer com isso que não há surpresa na conta de precatórios. Governos, assim como empresas, precisam acompanhar com lupa as ações judiciais nas quais há risco de perda. Elas devem ser relatadas em balanços (no caso de empresas) ou na lei orçamentária (para governos). Alguém perdeu um grande asteroide de vista e agora está pedindo ajuda.

A metáfora deveria parar aqui. Mas Guedes continua com sua figura de linguagem, como se pagar os precatórios fosse o mesmo que deixar a Terra ser destruída. E, para completar, o ministro insinuou que alguns meteoros coincidentemente beneficiam estados governados pela oposição. Ele se refere a precatórios do Fundef, ressarcimento que está em discussão na Justiça desde o fim dos anos 90 e sobre os quais existe até página na internet dedicada pelo Tribunal de Contas da União. Não há novidade nenhuma em ter de pagar essa conta, que é uma dívida com todos os estados.

O jogo de palavras importa porque está bastante difícil de entender o que a equipe econômica quer como solução. O governo encaminhou para o Congresso um projeto de lei orçamentária que prevê o pagamento total de precatórios, como diz a lei. Mas isso tem um custo alto em ano eleitoral, especialmente porque a persistência da inflação corroeu a folga que o governo enxergava para aumentar gastos.

Colocar os R$ 89 bilhões no orçamento do ano que vem significa que o Congresso terá de cortar emendas (o projeto do governo já foi sem as famigeradas emendas de relator), não poderá conceder reajustes salariais, nem aumentar gastos com o Bolsa Família - a não ser que consiga cortar outros gastos discricionários.

Enquanto mandava esse projeto de orçamento, o governo encaminhou ao Congresso outra ideia, que vai na pior direção possível. A PEC dos Precatórios prevê um parcelamento obrigatório que tem dois problemas. É ao mesmo tempo um calote (afinal, não é um parcelamento negociado, como seria possível pela legislação já existente) e uma bola de neve, quase como pendurar as contas no cartão de crédito.

A alternativa a essa ideia é tirar os precatórios do teto de gastos. Essa opção, que pode ser incluída na tramitação da PEC no Congresso, pode ocorrer de maneiras diferentes. Uma é tirar completamente os precatórios do teto, refazendo a conta do limite de gastos desde 2016. Outra é deixar sob o teto só o gasto anterior corrigido pela inflação e pagar a diferença por fora. As duas têm efeitos bastante semelhantes, que é desvincular os precatórios dos gastos obrigatórios.

Na prática, isso criaria um grande incentivo para que o no longo prazo o governo veja vantagens em judicializar (ainda mais) questões relacionadas a gastos obrigatórios ou a receitas. Hipoteticamente, o governo poderia não pagar uma conta, esperar perder na Justiça e pagá-la fora do teto como precatório. Se for necessário escolher uma das duas opções, ainda é melhor que o teto seja calculado com parte dos precatórios para não se perder o vínculo orçamentário.

Uma outra saída seria considerar os precatórios do Fundef como uma conta fora do teto. Há precedente para isso, já que o repasse extraordinário do Fundeb aprovado no ano passado pelo Congresso será fora do teto. A vantagem aqui é que o volume de recursos pagos por fora é menor e restrito a uma única fonte de discussão judicial.

Guedes tem reforçado a retórica do meteoro para tirar um aval do STF para uma dessas manobras. O incômodo do presidente da corte, ministro Luiz Fux, já é público. Ele, por sua vez, cobra uma solução do Congresso.

Entre analistas, já é certo que o teto de gastos virará 2022 com mais esse furo. Resta saber qual vai ser o tamanho do estrago e por quanto tempo ele vai durar - o que é muito difícil de saber a partir das metáforas do ministro. A regra do teto, na prática, se tornou rígida demais para um país onde os políticos cuidam muito mal do orçamento. Continuamos gastando mal, investindo cada vez menos e ainda estamos muito longe de recuperar o grau de investimento.

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