O monopólio no mercado de refino de petróleo no Brasil é um produto da década de 50 que só agora começa a ser desmantelado. Na última semana, a Petrobras assinou um termo com o Cade pelo qual se compromete a vender oito de suas 15 refinarias. Ao se desfazer desses ativos, a estatal abre mão de ser dona de 98% do mercado de refino e dará espaço para concorrentes.
A assinatura do termo com o Cade é um avanço em um dos mercados que mais sofrem intervenção estatal no Brasil. Criada na década de 50, a Petrobras deteve o monopólio da produção de petróleo até 1997. Mesmo com a abertura de mercado, a companhia ainda é operadora de quase 90% da produção brasileira, o que demonstra a lentidão com que o mercado muda.
No refino, a estatal joga praticamente sozinha. Seu poder de mercado barra a entrada de investimentos privados e dá poder desproporcional ao governo, que pode influenciar diretamente um dos preços mais importantes da economia. Foi o que fizeram os governos do PT, que tentaram segurar a inflação deixando o preço dos combustíveis abaixo do praticado no mercado internacional.
O movimento de desestatização do refino, portanto, poderá influenciar positivamente investimentos e dará uma nova dinâmica aos preços de combustíveis, que passarão a oscilar de maneira mais "colada" ao mercado internacional. Os distribuidores passarão a ter mais opções para comprar os combustíveis, repassando possíveis ganhos de eficiência aos consumidores.
Os benefícios do fim do monopólio serão limitados pelos detalhes do processo de desinvestimento. A Petrobras escolheu a dedo quais ativos manter: ficará com as "joias da coroa", como tratam os analistas do setor de petróleo, localizadas no Sudeste. São as maiores e mais próximas aos mercados consumidores mais densos. Ali, continuará a valer um monopólio branco, já que a estatal continuará a ter um poder de mercado capaz de decidir preços.
Para as oito refinarias que serão vendidas, o Cade exigiu que não haja concentração regional. Assim, quem comprar a unidade localizada no Paraná estará automaticamente de fora do leilão de refinarias no Rio Grande do Sul. O mesmo vale para outros polos localizados em regiões próximas. No mínimo, essas refinarias vão concorrer com a própria Petrobras, seja com a produção própria ou a importação feita por sua extensa infraestrutura de terminais portuários e dutos.
A extensão dos benefícios da desestatização também depende de quem vai comprar os ativos. Um estudo do Cade publicado no ano passado ponderou que, se a compra for feita por uma grande distribuidora, por exemplo, poderá haver uma concentração de poder de mercado que pode impor barreiras à concorrência em sua área de influência. O ideal seria que as refinarias ficassem com agentes que não estão nesse mercado, como fundos de investimento.
É mais fácil de prever que o governo perde o poder de usar a Petrobras para fazer política com o preço dos derivados. Esse parece ser um ganho importante o suficiente para justificar a venda das refinarias. Seria melhor se fossem todas elas, o que quebraria totalmente o atalho entre o Palácio do Planalto e o valor cobrado nas bombas.
Na frente de investimentos, não devemos esperar a construção de novas refinarias no curto prazo. Isso porque há um excesso de capacidade de produção em nível global - segundo a International Energy Agency (IEA), até 2023 haverá um aumento de 7 milhões de barris/dia na capacidade instalada, contra um crescimento de pouco mais de 5 milhões de barris/dia na demanda.
Esse excesso de oferta já afeta o mercado brasileiro. As refinarias da Petrobras operam com 80% da capacidade, de 2,3 milhões de barris/dia. Importamos 450 mil barris/dia de derivados para fechar déficits na produção de derivados específicos (óleo diesel, por exemplo) e atender mercados onde a logística favorece a entrada de importados.
É muito provável que o investimento novo seja inicialmente na logística de importação de derivados. O aumento na capacidade de refinarias viria apenas com a segurança de que o mercado estará por fim livre da intervenção estatal em preços e com o aumento da competitividade do país. A sombra do monopólio de décadas continuará a estar nas bombas de combustíveis por algum tempo ainda.
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