A ideia de se fazer uma nova Assembleia Constituinte apareceu na campanha de Jair Bolsonaro (PSL): seu vice, o general Hamilton Mourão, defendeu em entrevista uma nova Constituição, redigida por um grupo de notáveis e depois chancelada em plebiscito. Tema que também aparece no programa de Fernando Haddad (PT), de forma um pouco menos detalhada.
A declaração de Mourão, frise-se, não foi feita no contexto de um programa de governo, como no caso do PT. Mas é uma ideia que circula em um nível elevado da campanha de Bolsonaro, fato que não pode passar despercebido (até porque o próprio candidato já falou sobre isso em entrevistas). Ele revela dois aspectos do modo de pensar do grupo bolsonarista que estão em consonância com o PT: a crença em uma nova Constituição como atalho para a concretização de uma ideia de país, e um incômodo com os resultados do processo democrático.
O programa do PT não deixa claro como funcionaria sua Constituinte. Segundo Marcio Pochmann, economista do partido que vem falando do assunto, ela seria convocada para avançar o pedaço mais polêmico da agenda petista: reformas como a do setor bancário, dos meios de comunicação e tributária. Estão no bolo temas caros à ala mais radical do partido, incomodada com o que avalia ser uma divisão “não democrática” do poder no país. Parece, na prática, uma forma de ampliar o poder do partido no poder, retirando-o de grupos que o PT entende serem antagonistas ao seu projeto e fortalecendo grupos identitários com os quais o partido aprendeu a navegar.
ANÁLISE EM VÍDEO: Mourão propõe Constituição feita por ‘notáveis’, sem povo. Bolsonaro, não
No caso da Constituinte do general Mourão, está mais claro o formato e não a temática. Seriam convocados notáveis, constitucionalistas e afins com capacidade de criar uma Constituição enxuta e funcional. Os temas, portanto, não parecem ser o centro da ideia, e sim a ciência para a redação do texto. É a expressão do tecnicismo que não quer entender as contradições e defeitos que são o custo normal de se viver em uma democracia.
O debate sobre uma Constituinte não é novo. Foi trazido à tona pelo menos uma dezena de vezes nos últimos anos como solução para os problemas complexos do país. Um exemplo foi o compromisso assumido por Dilma Rousseff em 2013 de chamar uma assembleia para colocar fim aos protestos que tomaram conta das ruas. Nada foi feito e quatro anos depois o Congresso aprovou uma reforma que tornou ainda mais difícil a renovação das forças políticas – sem nem precisar mexer na Constituição, é bom dizer.
Em 2016, para trazer um outro exemplo pertinente para as eleições, o economista Eduardo Giannetti da Fonseca, assessor da candidata Marina Silva (Rede), defendeu uma Constituinte restrita à reforma política, com pessoas eleitas apenas para esse fim e que teriam de ficar fora da vida política após a finalização do processo. O mérito da ideia era tentar isolar a reforma política de quem tem mais interesse em manipular as regras do jogo.
A Constituição brasileira tem muitos problemas. Traz regras que não precisariam ser constitucionais e engessam a gestão pública. Ao mesmo tempo, muitas dessas regras têm efeito contrário ao que se esperaria – as normas não garantem serviços públicos melhores ou uma gestão menos corrupta – e tornam a necessidade de reformas uma constante da vida nacional.
Há uma dose de lógica, portanto, em se defender o atalho da Constituinte. O perigo está em se usar essa lógica para remodelar a Constituição ao gosto do partido no poder. O bom funcionamento de uma democracia liberal é sustentado por uma combinação de expressão da vontade popular, pragmatismo dos legisladores que representam essa vontade e evolução das regras ao longo do tempo em torno de consensos. Nada disse está presente nas proposta do PT ou de Mourão.
Não é de hoje que o mundo político vive em torno de dois objetivos: enriquecimento e autopreservação. A Constituição pode até ajudar a quebrar esse vício, mas não é exatamente a maior causa do problema. A baixa eficiência da Justiça, quebrada no caso da Lava Jato, e a perpetuação de caciques em partidos sustentados pelo Estado não foram criados pelo texto constitucional, para ficar em dois exemplos.
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