O assassinato da vereadora carioca Marielle Franco ocorreu dois dias antes de a intervenção no Rio de Janeiro completar um mês. Embora o motivo da morte não esteja claro, suas consequências apareceram ainda na noite de quarta-feira (14). O crime assustou o governo porque sua repercussão vai arranhar a intervenção. Ele também fez surgir uma onda de interpretações ideológicas que beiram o absurdo.
O governo federal agiu rápido após a notícia do assassinato de Marielle. O interventor, general Braga Netto, foi acionado e a Polícia Federal também foi colocada à disposição da investigação. A repercussão do crime, que tem características de uma execução, pode atingir em cheio a intervenção – que, embora apoiada pela maioria da população, não convenceu muita gente no meio político, militar e da academia.
A intervenção está completando um mês e tem mais nove pela frente. Ainda não ficou claro como ela atuará para que seus efeitos se prolonguem no longo prazo. O histórico recente de outras operações militares em segurança pública mostram que a tendência geralmente é de retorno a algo muito parecido ao estado anterior. No caso do Rio de Janeiro, isso significa a existência de áreas dominadas pelo tráfico e por milícias, com suas populações em muitos casos ameaçadas até por membros das forças policiais.
É cedo para dizer que a intervenção terá o mesmo fim de operações anteriores, mas o crime de quarta-feira é um sinal da dificuldade em se combater a criminalidade. É preciso tempo, recursos, investigação, celeridade no Judiciário e uma reconstrução do sistema penitenciário, uma cadeia de fatores que as Forças Armadas não dominam sozinhas.
Além de assustar o governo federal, a morte de Marielle fez surgir uma onda de opiniões absurdas que vão aos extremos de culpar a própria vítima ou de culpar a operação militar. A vereadora não inventou os criminosos que denunciava. A tese de que ela morreu por defender os direitos humanos, por ter “passado a mão na cabeça dos bandidos”, como muita gente vem expressando nas redes sociais, é no fim a ideia sórdida de que ela mereceu ser assassinada. Isso faz dela vítima pela segunda vez.
Ao mesmo tempo, outra tese avessa à razão que não deve prosperar é a de que a culpa de sua morte é da operação militar em curso no Rio. A intervenção pode não ser a solução para os problemas de segurança do Rio e a atuação das Forças Armadas deve ser observada pela sociedade. Mas a presença de militares nas ruas também não inventou os criminosos denunciados por Marielle. O crime provavelmente teria ocorrido da mesma forma na ausência das tropas. A operação apenas torna sua repercussão maior.