O enfrentamento à maior recessão global desde a Grande Depressão está levando os bancos centrais de todo o mundo a anunciarem ações enormes de suporte ao mercado. O Banco Central no Brasil destoa um pouco e tem adotado uma linha mais contida.
No início de abril, o ex-presidente do Banco Central e ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles disse em uma entrevista que é hora de o BC brasileiro "imprimir dinheiro". A expressão é mais simbólica do que literal e indica um pedido de mais ousadia na gestão da política monetária, defendida também por outros economistas.
O BC brasileiro escolheu uma estratégia de grande precaução. Na última reunião do Copom, a taxa básica de juros caiu 0,5 ponto percentual, para 3,75% ao ano. A autoridade monetária brasileira também relaxou algumas regras de crédito e liberou mais uma parte do depósito compulsório para melhorar o fluxo de recurso no sistema financeiro. Vários BCs foram bem mais ousados.
A escolha por "imprimir dinheiro" significaria um aumento sensível na base monetária, ou seja, no volume de moeda disponível no mercado. Há vários caminhos para isso - redução dos juros básicos, por exemplo. Mas o que vários economistas pedem é mais do que isso: a compra direta de ativos pelo BC para colocar dinheiro no mercado.
Esse mecanismo será possível com o Orçamento de Guerra, que está em tramitação no Congresso e tem chances de aprovação já na próxima semana. A nova lei daria ao BC autonomia para fazer essa aquisição de ativos. Seria possível um programa do tipo "quantitative easing", ou relaxamento quantitativo, no qual a autoridade monetária entra na ponta compradora do mercado de títulos para fazer as taxas de juros de longo prazo caírem.
O mercado já está antecipando esse movimento. No início de março, os juros longos subiram bastante com a expectativa de piora no quadro fiscal. Com a perspectiva crescente de uma recessão relativamente longa, espera-se que o BC siga cortando os juros e, se aprovado o Orçamento de Guerra, passe a "imprimir dinheiro".
É pouco provável que o BC lance um programa grandes como os existentes nos EUA, Reino Unido, Europa e Japão. Essas economias emitem moedas "fortes" (vistas como reserva de valor) e, por isso, têm mais facilidade de usar a injeção direta de recursos na economia. No Reino Unido, fala-se inclusive no financiamento direto dos gastos extras do governo durante a crise.
Ao mostrar prudência na última redução de juros, o BC demonstrou que está medindo bem as fragilidades da economia brasileira. Zerar os juros de curto prazo, por exemplo, pode levar a um aumento dos juros mais longos se o mercado entender que a inflação vai sair de controle. Aqui, a autoridade monetária ainda convive com outros dois problemas: a dívida é emitida em uma moeda com grande flutuação (o que pode levar a uma desvalorização acentuada do real em um movimento errado do BC), e os problemas estruturais das contas públicas estão longe de serem resolvidos.
As projeções que começam a aparecer para a economia brasileira dão argumentos aos economistas que pedem a impressão de mais dinheiro. Muita gente, incluindo o FMI, fala em contração do PIB de mais de 5% neste ano. E há pouco espaço para a inflação subir em meio a uma depressão global que, inclusive, derrubou os preços das commodities.
O mais provável, no entanto, é que o BC aguarde uma nova rodada de cortes da Selic para tomar uma decisão sobre recompra de títulos públicos. A aquisição de títulos seria útil para permitir o crescimento do endividamento a um custo menor ao longo do ano - Roberto Campos Neto, presidente do BC, declarou que um programa desse tipo é possível, mas sem aumento da base monetária, apenas com a troca de títulos longos por outros mais curtos.
Mais polêmica, a compra de papéis privados pelo BC só seria uma arma em caso de uma crise financeira severa, que deixe bancos sem condições de buscar liquidez vendendo ativos desvalorizados. Se chegarmos a esse ponto em algum momento da crise, a inflação será o menor dos problemas.
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