O governo está negociando com o Congresso um jeito de baixar os preços dos combustíveis. O que se divulgou até agora da ideia, em resumo, é uma PEC zerando o PIS/Cofins do diesel e da gasolina, sem precisar lidar com a exigência de compensação pela redução da arrecadação presente na Lei de Responsabilidade Fiscal.
O tamanho da conta é de R$ 57 bilhões a serem pagos por todos os contribuintes na forma de dívida pública. Talvez esse detalhe não tenha ficado muito claro. A estratégia para baixar o imposto é usar uma folga na meta de déficit primário presente no orçamento - a lei permite que o déficit seja de até R$ 170 bilhões, e as projeções no momento indicam que o número deverá ficar entre R$ 90 bilhões e pouco mais de R$ 100 bilhões.
O déficit primário, em termos simplificados, é a dívida nova que o governo deve emitir para pagar suas contas. Ela se soma à rolagem das dívidas antigas (principal mais juros). Se temos superávit, a dívida cai. Não necessariamente o Brasil precisa perseguir um superávit primário, mas sim uma dívida que pareça sustentável e sobre um alicerce fiscal robusto.
É isso que elevaria a nota de crédito do Brasil para um nível de "investment grade", importante para reduzir os prêmios de risco, ou, na prática, diminuir os juros e permitir mais investimentos no país. A cada respiro fiscal, no entanto, temos visto um novo destino para a política fiscal que não vai na direção da recuperação do grau de investimento.
Assim, uma primeira resposta sobre a redução dos impostos sobre combustíveis é que o contexto fiscal, embora muito melhor do que em anos anteriores, faz com que o cenário de grau de investimento e juros estruturalmente mais baixos fique mais longe se a ideia avançar.
Provavelmente, o mundo político não dê a mínima para o grau de investimento. O raciocínio em Brasília pode estar na linha "de que adianta isso, se as pessoas não conseguem colocar gasolina no tanque?". E essa é a raiz de um segundo argumento contra a medida: ela é feita sobre um cálculo político de curto prazo e não sobre o que de fato vai melhorar a vida das pessoas no longo prazo.
Afinal, o que é melhor: pagar uns centavos a menos no litro da gasolina ou ver a renda per capita crescendo de novo em um ritmo minimamente decente para que a vida das pessoas melhore? O populismo vota no primeiro.
Há um terceiro argumento a respeito do imposto escolhido. Mesmo que o orçamento estivesse com sobra e reduzir impostos não fosse fruto de um cálculo político míope, talvez a redução do PIS/Cofins de combustíveis não fosse a melhor alternativa.
Para começar, os combustíveis já estão em um regime tributário especial, com a cobrança feita por valor e não percentual. Por isso, a elevação dos preços dos combustíveis não foi acompanhada por um aumento nos impostos federais. Já há, portanto, um benefício que não é desfrutado por outros setores.
A principal vantagem desse modelo de tributação é que o imposto não exacerba movimentos de mercado. A cobrança do ICMS estadual sobre combustíveis tem sido criticada por não seguir esse sistema e é possível que ela seja incluída na PEC que será enviada ao Congresso.
Mas há desvantagens. Uma delas é uma distorção do princípio de justiça tributária. O impacto do repasse de custos ao consumidor é menor para quem é beneficiado por um regime como esse. Muitas indústrias não têm a mesma sorte. Além disso, a transmissão do sinal de preços ao consumidor é mais lenta do que em setores com impostos calculados com a aplicação da alíquota sobre o preço final.
Além desse aspecto que já beneficia o consumidor de combustíveis, é preciso levar em conta que o espaço fiscal poderia permitir a redução de outros impostos com efeitos mais positivo para a economia. Uma redução uniforme, por exemplo, da alíquota de PIS/Cofins dentro de uma reforma tributária aliviaria a carga de impostos para todos sem distorcer as escolhas dos consumidores.
Alguém ainda pode argumentar que, pelo menos, a inflação vai ficar mais controlada com a decisão. É uma meia-verdade. De fato, os preços captados pelo IPCA podem arrefecer com a medida, mas o governo está acrescentando demanda via emissão de dívida enquanto o Banco Central eleva os juros para controlar os preços. É um movimento contraditório e não funciona no longo prazo como meio para reduzir a inflação. Se fosse assim, a receita para controlar a inflação seria baixar impostos e não aumentar os juros.
O preço dos combustíveis é um dos mais importantes na economia e por isso mesmo ele é alvo constante de uma gestão direta. Desta vez, no lugar da Petrobras, o Tesouro foi chamado a ajudar. Não é exatamente o tipo de ideia que vai ajudar o Brasil a sair do atoleiro de baixo crescimento e baixa produtividade.
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