Na corrida eleitoral de 2002 o então candidato Lula escreveu uma carta ao povo garantindo que não mexeria na estrutura básica que garantia a estabilidade da economia. Ele em seguida apareceu repaginado em debates e entrevistas, a ponto de virar o “Lulinha paz e amor” que se elegeu presidente. O estilo se manteve até a corda do impeachment apertar o pescoço de Dilma Rousseff e a Lava Jato chegar aos detalhes da relação entre Lula e o maior esquema de corrupção já desbaratado no Brasil.
Mesmo com Lula condenado em segunda instância e preso, o PT manteve sua inscrição como candidato na Justiça Eleitoral. Se sabemos que ele não será candidato de fato em outubro, agora também sabemos o que o partido pretende se seu substituto Fernando Haddad ganhar a eleição. O projeto do partido não tem nada de paz e amor. É, em muitos aspectos, a reafirmação do que houve de pior nos mandatos petistas, com um tempero forte de vingança.
Estão no plano o populismo da pior categoria, o reformismo às avessas e a ameaça a quem enfrentou Lula em seu caminho até a cadeia. O populismo se expressa na área econômica na promessa, por exemplo, de isentar do Imposto de Renda quem ganha até cinco salários mínimos. O PT quer revogar a reforma trabalhista e o teto de gastos, em sua investida “desreformista”. E promete diminuir os dias de férias dos juízes, o item mais inofensivo de sua pauta contra os “abusos” do Ministério Público e da Justiça.
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O resumo do projeto lulista para o país é pegar a parte mais estatista de seu segundo mandato e do período de Dilma Rousseff e reproduzi-la com mais força. O contraste com o Lula de 2002 é visível em questões como o câmbio. Na época, o PT topou até conversar com o Fundo Monetário Internacional e se comprometeu com o tripé macroeconômico, em que um dos pontos é o câmbio flutuante. O atual programa de governo promete um “câmbio competitivo”, ou seja, desvalorizado para incentivar exportações – que seriam tributadas por um novo imposto.
O texto apresentado pelo PT também fala em uma reforma bancária para baixar os juros. Os bancos públicos seriam chamados de novo para forçar o mercado a segui-los na redução de margens. E quem não topar a competição seria tributado ou penalizado por cobrar taxas altas demais. Uma intervenção impensável para o Lula de 2002, que chamou para seu Banco Central um ex-banqueiro, o hoje candidato pelo MDB Henrique Meirelles. O partido ignora completamente o fato de hoje a Caixa estar pedindo socorro ao governo porque não tem capital para cumprir os requerimentos legais, após ser usada como instrumento de concessão de crédito fácil e barato.
A proposta petista é completada pela promessa de retomada da Petrobras (sem uma linha para o fato de a empresa ter ido ao inferno com os projetos superfaturados pela gestão petista) e de outras estatais como motores do crescimento. Seriam a faísca para um salto da indústria, possivelmente os estaleiros e empreiteiras que ficaram à míngua após a Lava Jato.
Se isso não for suficiente para o crescimento da economia, o programa tem outra saída heterodoxa: usar reservas para investir em infraestrutura. Como se as reservas fossem parte do caixa do governo e não um recurso gerido de forma independente pelo Banco Central – ideia que é uma evidente contradição com a proposta de manter o câmbio desvalorizado, já que o real se fortalece quando o BC vende dólares.
O projeto petista não quer saber de uma reforma da Previdência para reduzir o déficit porque acredita que seja um problema que se pode resolver só com arrecadação.
A parte mais perturbadora do plano lulista, no entanto, está em outras áreas. O partido quer fazer uma nova Constituinte para discutir os assuntos que o novo governo decidir. Algumas dicas das intenções da revisão constitucional “democratizadora” estão espalhadas no texto: regulação dos meios de comunicação, revisão de leis “violadoras” de direitos (como a que permitiu as delações que desnudaram a corrupção na Petrobras) e uma reforma política que traga o voto em lista fechada, sonho dos caciques partidários.
O plano do PT tem muito do que o partido não conseguiu fazer quando era governo e outras coisas que foram testadas e deram na maior recessão da história do país. Está em um tom muito diferente de 2002 e mostra o momento exato do partido: longe do centro e pronto para fazer qualquer coisa por Lula.
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