Em menos de dois meses, o governo conseguiu transformar sua primeira prioridade em uma fábrica de ruídos. A reforma da Previdência foi apresentada como a peça fundamental do programa econômico da equipe do ministro Paulo Guedes. A reforma é crucial para o equilíbrio fiscal e vai beneficiar a União, estados e municípios. Por isso, chama a atenção a sequência de desencontros, erros estratégicos e atrasos no debate sobre o tema – problemas que já começam a fazer a turma do mercado financeiro perder o otimismo das primeiras semanas de governo.
Separei sete pontos que, quando vistos em conjunto, fazem acender o sinal amarelo sobre a real capacidade do governo Jair Bolsonaro de fazer uma reforma da dimensão necessária.
1. Entrevistas de Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro deu entrevistas após eleito nas quais falou sobre a Previdência. Ele parecia avesso a uma idade mínima de 65 anos, já presente na reforma em tramitação no Congresso (para homens, na versão aprovada em comissão). Bolsonaro também disse que o maior problema está na aposentadoria de servidores públicos, algo impreciso, já que o déficit é maior no INSS e é ali que está o risco fiscal de médio e longo prazo. Como muitos membros do governo dizem que é o presidente quem vai bater o martelo sobre a versão de reforma que será enviada ao Congresso, fica a dúvida sobre o real tamanho da economia que será feita.
2. A minuta controversa
Nesta semana, vazou uma minuta da reforma da Previdência. Como não houve negativa da equipe econômica, pode-se entender que o texto trazia o que realmente se discute no governo. Há ali problemas de redação e pontos que já incorporam ajustes feitos no projeto do governo Michel Temer, como um tempo mínimo de contribuição de 20 anos, em vez de 25 como tentado pela equipe anterior. Estão na minuta pontos polêmicos que conflitam com o que o presidente Bolsonaro disse em entrevistas, em especial sobre a idade mínima, que seria de 65 anos para homens e mulheres na minuta vazada. Outro ponto que poderia dificultar a aprovação dessa versão é a obrigação para que estados, municípios e a União zerem o passivo atuarial de seus sistemas próprios para servidores. É uma conta bilionária que ninguém quer assumir.
O mais grave é que a minuta foi colocada em banho maria pelo ministro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que afirmou ser o texto apenas uma das possibilidades em avaliação pelo presidente. Levando em conta o que disse Bolsonaro sobre o assunto, parece haver um conflito não resolvido entre os times de Paulo Guedes e o Palácio do Planalto.
3. As simulações de Paulo Guedes
O ministro da Economia, Paulo Guedes, falou que quer provocar uma economia grande com a reforma da Previdência. O número mágico que ele tem usado é de R$ 1 trilhão em dez anos, que seria maior do que os R$ 800 bilhões da reforma original de Temer e o dobro do que permitira o texto aprovado em comissão no Congresso. Mas o próprio ministro diz que trabalha também com um cenário de R$ 1 trilhão em 15 anos. A diferença é grande, cai de R$ 100 bilhões por ano para R$ 66 bilhões por ano. Pela minuta vazada na última semana, não está claro como se chegaria a R$ 1 trilhão em uma década, já que ela tem vários pontos menos rigorosos do que o texto original de Temer. O tempo mínimo de contribuição e a idade mínima para a aposentadoria rural são dois deles.
Existem outras propostas de reforma da Previdência apresentadas ao governo, como a feita pelo economista Paulo Tafner. Ela previa economia de R$ 1,2 trilhão, mas trazia a desvinculação dos benefícios do salário mínimo já a partir da aprovação do projeto. O piso passaria a ser 70% do mínimo. A minuta vazada fazia menção a uma desvinculação do BPC, mas não está claro se haveria economia, já que o benefício poderia ser pedido parcialmente a partir dos 55 anos.
4. O contrabando trabalhista
Membros do Congresso já começaram a sinalizar ao governo que será mais difícil aprovar a reforma se realmente forem embutidas no projeto mudanças nas leis trabalhistas. O ministro Paulo Guedes disse que gostaria de aproveitar a oportunidade para aprovar sua ideia da carteira de trabalho verde-amarela, para jovens. Com ela, eles poderiam escolher não estarem submetidos às leis trabalhistas, podendo inclusive recorrer à Justiça comum em caso de reclamatória. Nesta quinta-feira (7), uma reportagem de O Globo informou que a equipe econômica trabalha com uma versão aumentada da proposta exposta por Guedes e que incluiria até direitos trabalhistas previstos na Constituição, como férias e décimo terceiro.
Do ponto de vista fiscal, embutir temas trabalhistas na reforma da Previdência é apenas ruído. O importante para a reforma funcionar é mudar as regras de acesso a benefícios (idade mínima, regra de transição, fim de acúmulo de benefícios etc.) e melhorar a receita (alíquota maior para servidores, exigência de tempo maior de contribuição). A flexibilização trabalhista teria efeito indireto via formalização do emprego, algo que costuma demorar e pode não ocorrer se houver judicialização das mudanças.
5. Militares dentro e fora
O governo tem dado declarações conflitantes sobre os militares estarem ou não na reforma que será levada ao Congresso. Parecia haver um acordo para sua situação ser avaliada na sequência, com a elevação da idade mínima para eles irem para a reserva e uma maior alíquota da contribuição. Causou desconforto o fato de a minuta vazada englobar também os militares, que estariam na prática entrando em um sistema previdenciário. Esse conflito pode atrasar a elaboração e a tramitação do projeto.
6. Congresso no escuro
Até parlamentares do PSL, partido do presidente Bolsonaro, já reclamam da falta de informações sobre a reforma da Previdência. O ministro Paulo Guedes conversou com governadores e lideranças do Congresso, mas sem uma proposta validada por Bolsonaro. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (Dem), disse ser possível aprovar o texto até maio, mas isso parece improvável se não for aproveitado o projeto já votado em comissão. Há várias dúvidas se essa estratégia será seguida pelo governo, já que Guedes parece inclinado a colocar outros temas no projeto, como a carteira de trabalho verde-amarela, o que pode atrasar a tramitação em alguns meses.
7. Pacote anticrime
Enquanto não tem um projeto para a Previdência, o governo decidiu enviar ao Congresso o pacote anticrime do ministro da Justiça Sergio Moro. Embora seja um tema distante da Previdência, pode se tornar uma prioridade de articulação do governo, dividindo a atenção com o tema previdenciário. Não é um problema grande, mas há uma questão simbólica: Moro foi ao Congresso com um projeto pronto, enquanto Paulo Guedes circula ideias antes de chegar aos parlamentares.
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