Como deputado federal, o candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) tinha posições claras em alguns temas econômicos que estão presentes neste debate eleitoral. Foi contra várias propostas de reforma da Previdência, contra privatizações e a favor do modelo proposto pelo PT para o pré-sal (que ajudou a flexibilizar em 2016). Votou contra o fim do monopólio estatal do petróleo e das telecomunicações, e a favor de projetos que aumentaram os gastos, como a desoneração da folha e o InovarAuto.
Mas ele argumenta que mudou seu jeito de pensar no último ano, especialmente depois de ter conhecido o economista liberal Paulo Guedes. Em uma sabatina, Bolsonaro chegou a dizer que seu objetivo como presidente seria tornar o Brasil um país liberal de verdade. Assim, ele se colocou como um candidato a favor de privatizações, da reforma da Previdência e da redução dos benefícios do Estado a setores da economia.
Agora, durante a campanha, o candidato parece estar tropeçando no deputado. Declarações dadas por Bolsonaro nos últimos dias acenderam a luz a amarela em gente do mercado que acreditava que o candidato daria total apoio às propostas que Guedes vinha vendendo em palestras e entrevistas. O deputado disse três coisas que chamam a atenção.
A primeira é que a reforma da Previdência proposta por Temer não passaria no Congresso e que é preciso propor algo diferente. Subentende-se que é algo menos rigoroso do que o texto que está pronto para ser votado, que não era apoiado por Bolsonaro. O candidato não deixa claro qual seria sua proposta, mas diz que acabaria com “marajás” do setor público. Para quem acompanha de perto a questão previdenciária, soa como um escapismo. Uma reforma ainda mais branda, ou focada apenas no setor público, seria insuficiente para reverter a tendência de longo prazo de aumento do déficit previdenciário. Na verdade, gente séria, como o economista Paulo Tafner, diz que a reforma teria de ser mais forte até do que o texto original levado pela equipe de Temer em 2016.
A segunda questão se refere à Eletrobras. Bolsonaro disse em uma entrevista que não quer privatizar geradoras de energia, o que colocaria na geladeira a proposta de privatização da estatal costurado pelo governo Michel Temer – e pela qual o governo continuaria como sócio da companhia, mas sem geri-la. Ele aproveitou o tema para criticar a venda de ativos para empresas chinesas, com um tipo de argumento de arrepiar qualquer liberal: “Suponha que você tem um galinheiro no fundo da sua casa e viva dele. Quando privatiza, você não tem a garantia de comer um ovo cozido. Nós vamos deixar a energia nas mãos de terceiros?”, disse.
Sobre a Petrobras, o terceiro argumento que lembra muito o velho deputado: o “miolo” da Petrobras tem de ser preservado, enquanto a exploração de petróleo pode ser aberta para outras empresas. Aparentemente, o refino não estaria no miolo, mas o candidato passou a impressão de que estaria aberto a discutir o preço do diesel cobrado pela empresa. Segundo ele, o diesel na refinaria tem um custo de 90 centavos (e que ele não sabe se é verdade, mas achou pertinente citar na entrevista mesmo assim) e a estatal coloca 150% de margem de lucro. Conversa de ponto de ônibus.
A reação do mercado na segunda-feira, após o resultado do primeiro turno, foi de euforia, com uma queda substancial do dólar e alta da bolsa. Nesta quarta, o clima azedou. Para o mercado, tanto faz ganhar dinheiro na alta ou na baixa, só interessa acertar a tese sobre o que o próximo governo vai fazer. Aparentemente, Bolsonaro pegou os investidores no contrapé. Eles estavam acreditando no candidato sem lembrar o deputado. Afinal, qual dos dois quer governar o Brasil?