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“Não dá para tratar os evangélicos como uma categoria religiosa; tem que tratar como uma categoria social.” (Gleisi Hoffmann)
Há pouco mais de uma semana foi ao ar uma entrevista da deputada federal Gleisi Hoffmann, presidente do Partido dos Trabalhadores, ao programa Dando a Real com Demori, do jornalista Leandro Demori, da TV Brasil. O programa, que com poucas exceções contempla basicamente os diferentes quadros da esquerda, se chama “dando a real”, mas poderia bem se chamar “discutindo a relação”. Demori até mesmo convida o PT ao divã!
Ironias à parte, a entrevista é esclarecedora e bastante ampla, a ponto de nos levar do céu ao inferno.
O encanto de Gleisi Hoffmann
A entrevista começa com um breve papo biográfico, no qual Gleisi conta um pouco de sua transição do interesse pela vida religiosa à militância política de esquerda, expressando de forma límpida o papel central que a Igreja Católica teve nessa transição; por um lado, com o exemplo de caridade e preocupação social, uma inspiração originalmente de caráter moral, e em seguida com o incentivo – dos jesuítas, especificamente – para o envolvimento com os movimentos estudantis de esquerda da época, “a juventude do PCdoB, a juventude do PT”, no finzinho da ditadura. Então, “eu me encantei, porque eu disse assim: olha, dá pra gente lutar, quer dizer, a luta é mais do que só ajudar diretamente, é mudar as estruturas, ter outro projeto de país, de desenvolvimento, onde as pessoas sejam incluídas”. Nesse contexto ela aprenderá que, além da solidariedade cristã, seria preciso um compromisso socialista com a transformação estrutural. Para Gleisi, isso significou inicialmente o PCdoB, e depois, o PT, em 1989.
Foi a igreja, ou um setor da Igreja Católica, quem lançou sobre Gleisi Hoffmann o “encantamento” com uma visão de que a solidariedade cristã andaria de braços com a visão revolucionária da esquerda
Depois o assunto se move para a liderança de Gleisi no período do impeachment de Dilma, insistentemente descrito por ela como um “golpe” que, segundo ela, foi “provado”, e a tentativa de enterrar o PT no período. A narrativa, dentro do esperado, é a de que o partido foi injustiçado e a Lava Jato não passou de um estratagema político; uma orquestração teria sido feita pelas elites para tirar o PT do poder, e isso teria aberto o espaço para a extrema direita.
Diante da pergunta do entrevistador sobre o risco de dissolução do partido, com a Lava Jato, Gleisi apresentou uma resposta honesta: diante do afastamento de apoiadores, sua posição foi a campanha “Lula Livre”, porque Lula seria um “símbolo muito forte”, e demoraria muito tempo para termos outro Lula. Essa seria a “bandeira principal nossa que realmente traduzia o que era o nosso projeto político”. Devo dizer que a deputada foi perspicaz; reconheceu que a volta de Lula seria a única tábua de salvação disponível para o partido.
Ao mesmo tempo, é evidente que o desespero destruiu a capacidade autocrítica do petismo; eles teriam de crer na mentira da sua própria inocência para seguir adiante. Não vejo como, com tal viés de confirmação, a esquerda lulopetista poderia manter sua integridade intelectual e moral. Mesmo a exposição de um viés político na Lava Jato jamais seria, per se, argumento suficiente contra o volume de provas que a operação reuniu contra o PT. No mínimo teríamos dois lados culpados pela crise democrática; representar o PT como mera vítima das elites é inconcebível.
O que sustenta essa fé? Eu diria que foi... um encanto, nos termos da presidente do PT. Foi a igreja, ou um setor da Igreja Católica, quem lançou sobre Gleisi Hoffmann o “encantamento” com uma visão de que a solidariedade cristã andaria de braços com a visão revolucionária da esquerda. Esse encantamento está provavelmente por trás de boa parte da dissonância cognitiva do petismo em relação à realidade brasileira de hoje.
Antipetismo
Depois dessa introdução, ali pelos 9 minutos da entrevista, Demori se adianta para o seu assunto principal: o que fazer com o crescimento do antipetismo. No segundo bloco do programa, a discussão passa a uma miscelânea menos interessante sobre Lava Jato e Vaza Jato, relação do governo com o Congresso, mobilização popular e Haddad. Havendo eu mesmo passado de eleitor a antipetista há uns 18 anos (em outubro de 2006, para ser preciso), fiquei particularmente interessado no primeiro bloco, que vamos explorar aqui.
Pois bem: Demori diz que buscou pesquisas a respeito das raízes do antipetismo, e menciona um estudo, divulgado pela Folha de S.Paulo em 2022 e inédito, à época, no qual teria se mostrado que o antipetismo nasce e cresce simultaneamente com o petismo, em três fases: na primeira, do antipetismo “raiz”, a motivação era a saudade da ditadura e a recusa à “baderna” (greves e manifestações de rua); com a Lava Jato emergiu o antipetismo centrado no discurso anticorrupção, e atualmente o foco seriam “temas que crescem principalmente dentro das igrejas evangélicas, que são os temas do aborto, do casamento de pessoas do mesmo sexo”, que se tornaram mais importantes do que os temas mais antigos. E pergunta: “faz sentido esse estudo para você?”
Gleisi Hoffmann responde com uma narrativa conhecida: o PT foi desde o princípio um partido interessado na inclusão, mas que tem uma postura de partido de massa, diferente de outros partidos de esquerda; e “sempre teve uma oposição, porque a classe dominante, a elite, não queria que existisse um partido assim”. E esse partido inclui o sindicalismo, a força de organizações de esquerda mais antigas, e “também vem da classe média, vem também da intelectualidade, ou seja, é um partido que tem a diversidade, tem uma bagagem teórica importante”... “igreja” – interpela Demori – “igreja, exatamente” – continua Gleisi –, “mas tem uma militância prática”, uma base nos movimentos sociais. Essa seria a riqueza do PT: se entendi bem, é um movimento que lança seus tentáculos por toda a sociedade civil, para constituir sua base e alcançar a hegemonia. Trata-se de um partido cultural, e não apenas um partido estritamente político, focado na “institucionalidade”, como Gleisi descreve os outros.
É curiosa essa admissão a partir do petismo, de que eles realmente foram pegos com as calças na mão diante do discurso da nova direita, que deixou a mera defesa de privilégios de elite e assumiu contornos mais claros de uma ética de valores e de iniciativa individual
E esse partido deseja incluir todo mundo. Isso é o que incomodou, segundo ela: não fazer apenas a pauta da elite, mas a pauta da inclusão de todos, de colocar o Estado a serviço de todos, “colocar todo mundo pra dentro”, investir no que interessa ao povo. Daí viria o sucesso do PT, que só sai do poder quando sofre um golpe da direita que, por sua vez, abre o espaço para a extrema direita:
“Daí a extrema direita veio, com discurso populista e com discurso popular, mas baseado muito nos valores, no empreendedorismo, no ataque ao Estado, por fator diferente do que a elite e do que a burguesia sempre fez. Aí polarizou a sociedade, e ainda nos acusam de polarização. Então sempre vai haver essa parcela, ligada à elite, ligada à direita, que vai ser contra o PT.”
É curiosa essa admissão a partir do petismo, de que eles realmente foram pegos com as calças na mão diante do discurso da nova direita, que deixou a mera defesa de privilégios de elite e assumiu contornos mais claros de uma ética de valores e de iniciativa individual (o amálgama liberal-conservador), contra o estatismo. Petistas como Gleisi Hoffmann não conseguem ver aí uma agenda positiva, de empoderamento da sociedade civil, mas a mera negativa insensível contra a solidariedade e a inclusão social. Como os petistas desde sempre acreditam que o Estado deve ocupar esse “vácuo” e que ele é seu, por direito, a condição pós-materialista (ou quase) brasileira cobrou seu preço: o brasileiro ordinário ainda está na etapa “burguesa”, aparentemente.
Ainda mais intrigante é a visão do petismo como um grande projeto cultural, mais do que um mero partido institucional; uma combinação de forças de vários campos, liderada por uma intelectualidade de classe média e com uma essência moral extraída do fruto católico romano, mas sem compromissos com o conjunto da ética cristã. É assim que esse projeto pode se pensar como a verdadeira representação do Brasil e o herdeiro do nosso processo civilizatório; essa é a sua autorrepresentação, e isso talvez explique por que o petismo engendrou um antipetismo tão visceral, que cresce cada vez mais. Inclino-me a pensar no lulopetismo como uma espécie de seita paracristã, com pretensões universalistas e hegemônicas, e que usa a “laicidade” do Estado como escudo para proteger seu próprio núcleo: uma religiosidade secular.
A luta de classes
Voltando ao tema do antipetismo: Demori colocou no foco da sua pergunta os evangélicos, de forma específica, e as pautas de costumes que vêm sendo defendidas pelas igrejas. Em resposta, a deputada afirma que as igrejas retomaram o velho caminho das fake news antipetistas, que atribuem ao partido o plano de fechar igrejas e de perseguir pastores. O PT, por seu turno, jamais interferiu na liberdade religiosa dos evangélicos, e seu único pacto fora com o povo. “E esse debate infelizmente vai continuar porque é uma disputa de luta de classes.”
Aqui encontramos um tema recorrente na narrativa lulopetista e da esquerda, em geral; que a oposição ao PT, incluindo todo o aparelho de fake news, é basicamente um efeito da luta de classes – a reação da direita e da elite contra o grande esforço histórico de inclusão social do PT. Até esse ponto da entrevista Gleisi Hoffmann introduzira duas vezes essa ideia.
Eu não diria que o petismo seja hipócrita a esse respeito; essa parece ser de fato a sua autorrepresentação, em parte porque essa era a sua intenção declarada, herdeira da solidariedade cristã desde a sua fundação. Isso não valida o método da luta de classes, evidentemente, mas revela, em primeiro lugar, um autêntico duplipensar. Como um partido comprometido com a luta de classes, mesmo que não na forma violenta do marxismo ortodoxo, pode eximir-se de culpa diante da polarização política? Como pode ocupar diversas instâncias da vida social e política nacional, expulsando o contraditório, e alegar inocência?
Não há nada de mais aqui; se o método do partido é a luta de classes em um modelo de socialismo democrático e ocupação da sociedade civil, e se o seu plano é obter a hegemonia cultural, a polarização simplesmente resulta dos sucessos de seu próprio método político, e não de “fake news”. Antonio Risério é apenas um dos intelectuais que vêm apontando esse fato: o bolsonarismo militante é uma imagem espelhada do petismo militante; aprendeu com ele a longa guerra cultural petista, guerra essa muito bem documentada.
Como um partido comprometido com a luta de classes, mesmo que não na forma violenta do marxismo ortodoxo, pode eximir-se de culpa diante da polarização política?
Mas retornarei ao tema da guerra de classes depois de comentar fala de Gleisi Hoffmann sobre os evangélicos. Aqui, meus amigos, chegamos ao inferno.
O inferno de Gleisi Hoffmann
Leandro Demori retoma a questão das fake news e insiste no ponto da relação entre evangélicos e antipetismo. Segundo o estudo citado por ele, algumas denominações e pastores ligados à política partidária seriam as fontes da versão atual do antipetismo.
E então, perto dos 17 minutos, chegamos a um ponto crucial da entrevista. Talvez sugestionado pela própria fala inicial da deputada, o jornalista invoca a experiência anterior na igreja e na pastoral, que originalmente a lançou em direção à vida política, esperando alguma sabedoria religiosa ou prática:
“É... e pela sua experiência também que vem através da pastoral, e aí entra também na política através disso, como quebrar esse... porque parece que tem um encanto ali, né, virou assim, um monolito essa história.”
E assim retorna a metáfora notável, agora para descrever a situação do campo evangélico: “parece que tem um encanto ali”. Demori pisou realmente em alguma coisa. Há, sim, um encanto; ou melhor: dois encantos dominam o embate político nacional hoje: o “encanto” cristão, na origem espiritual da seita petista, e o “encanto” cristão do ethos evangélico popular. O quanto cada lado realmente representa o cristianismo é uma história mais complexa; mas podemos dizer, de saída, que esses encantamentos estão por trás da forte polarização contemporânea.
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Mas passemos à resposta da presidente do PT, na íntegra (mas com alguns negritos meus):
“Temos que mostrar para o povo evangélico os projetos e programas que nós fazemos, para que serve o Estado brasileiro. Não dá para tratar os evangélicos como uma categoria religiosa; tem que tratar como uma categoria social. E diz ‘ó, esse governo aqui, que o governo do presidente Lula, é o governo que dá acesso a renda, é o governo que dá acesso à saúde, é o governo que fez a Farmácia Popular, é o governo que está reabilitando o Fies, é o governo que está fazendo os institutos federais, é o governo que está dando oportunidade para o seu filho estudar, crescer, trabalhar’. Não é porque você é evangélico ou deixa de ser evangélico, é porque esse é o papel do Estado brasileiro. E não é um governo que está disputando valores.
Onde é que o PT implantou o aborto, onde é que o governo implantou casamento homossexual, os banheiros unissex, onde é que estão? A gente tem que combater a mentira, porque como às vezes as pessoas têm dificuldade de acesso à informação, o que o pastor diz passa a ser verdade, e o pastor muitas vezes mente. Aliás, pecado, né. Esse vai pro inferno mesmo, né, porque um pastor usar o púlpito, falar em nome de Deus e mentir, né, quem é o pai da mentira? É o diabo. Então vai pro inferno mesmo, que é o lugar dele. Então você não pode usar da boa fé das pessoas para fazer isso. Nós temos que respeitar a fé das pessoas, a religiosidade, seja qual for a religião, o Estado brasileiro não pode entrar na direção disso, é errado, é? Já fez no passado e a gente sabe onde é que acabou. Então não pode entrar para nenhuma religião. Então eu acho que nós temos que fazer uma disputa mais forte junto a essa população mostrando os avanços que nós fazemos que atingem essas famílias, que a maioria dessas famílias são de trabalhadores, trabalhadoras, não de gente rica, é de gente que labuta, e que precisa do Estado brasileiro.”
Não negarei em nenhum momento que muitos pastores espalham fake news por aí, e não apenas em assuntos de política e governo. Eu insistiria que boa parte deles deveria ser perdoada, por não saber o que está fazendo; são pessoas que, como muitos petistas, são vitimados por variados vieses intragrupais e não foram educados para lidar com as armadilhas informacionais e cognitivas da internet.
É evidente, no entanto, a grave acusação da deputada e presidente do PT, Gleisi Hoffmann: a de que “o pastor” usa o fato de que as pessoas têm dificuldade de acesso à informação e “muitas vezes mente”. De forma imprudente e generalizante, a deputada sugere que eles exploram a boa fé do povo e mentem, representando mal o PT, e que, por isso, “vão para o inferno”. Considerando o crescimento do antipetismo evangélico, a ponto de se tornar um fenômeno de massa, é evidente que Gleisi Hoffmann não se refere a uns poucos pastores, ou a pastores específicos, mas a pastores em número suficiente para alimentar o antipetismo, segundo a pergunta do próprio Demori.
De forma imprudente e generalizante, Gleisi sugere que pastores exploram a boa fé do povo e mentem, representando mal o PT, e que, por isso, “vão para o inferno”
Em outros termos: a presidente do PT acusa a liderança evangélica de ser responsável por fazer aumentar o antipetismo, através da pregação de mentiras, do púlpito. Trata-se de uma atitude altamente perigosa, a de colocar o povo contra os seus líderes religiosos, como se eles não estivessem organicamente relacionados, e disputar o povo. Praticamente uma guerra santa. Jornalistas, intelectuais e juristas importantes vêm se manifestando imprudentemente nessa direção, como foi o caso de Gilmar Mendes há poucos dias.
Gleisi pode fazer as acusações que quiser, mas deverá bancar o que diz; não apenas demonstrar que foram os púlpitos os responsáveis pelo antipetismo, mas que o petismo não seria inocente de todas as culpas que lhe são atribuídas e, especialmente, as suas culpas no campo que é, reconhecidamente, o maior responsável pelo antipetismo evangélico: as pautas de costumes.
Aqui, sim, eu sou obrigado a acusar: hipocrisia! Porque, como a própria Gleisi Hoffmann admite e celebra, o PT não é apenas um partido institucional, mas um movimento cultural amplo, representando a intelectualidade, a classe média e, com uma pitada maior de honestidade, um grande naco da elite cultural nacional, a partir das universidades, do jornalismo e da indústria cultural. E todos sabem que as agendas rejeitadas pelos evangélicos são promovidas pelo organismo cultural do lulopetismo onde quer que ele se instale, em cooperação com outros partidos e movimentos de esquerda. E, dentre todos os exemplos dessa ocupação espiritual, o mais evidente, é claro, se vê na atual composição do STF, com a maioria esmagadora dos ministros escolhida por presidentes petistas e operando em seu favor.
Gleisi não pode falar em um partido com ampla base em movimentos sociais e setores da sociedade (o que eles usam para passar suas agendas no Congresso Nacional e no Judiciário) para em seguida inocentar o governo federal e Lula. É como o caso do abortismo: o governo não faz “nada” (mentira também; todos vimos o recente episódio no Ministério da Saúde), mas empodera toda a sua base na sociedade civil e nos níveis municipal, estadual e federal, inclusive com dinheiro de emendas parlamentares, para fazer exatamente isso.
Concedo; não há ameaça petista à liberdade religiosa, historicamente. Mas há, sim, uma ameaça potencial no campo da esquerda, de modo mais geral, que se espraia através de operadores do direito radicalizados, pelo jornalismo e pelas opiniões de intelectuais, e que discutimos na semana passada nessa coluna. Mas no campo dos costumes, especificamente, as alegações da deputada Gleisi são inacreditáveis. Ao dizer que este “não é um governo que está disputando valores”, a deputada quer eximi-lo de suas conexões com o identitarismo, evidentes no Ministério da Educação, no Ministério da Saúde e, especialmente, no Ministério dos Direitos Humanos? Será que o governo Lula abriu espaço para visões conservadoras sobre família, saúde da mulher e direitos humanos em qualquer dessas instâncias? A hipocrisia é realmente assombrosa.
Não é admissível que o partido pretenda incluir todos os brasileiros, mas se recuse a tratar os evangélicos como uma categoria religiosa, como se sua fé evangélica fosse para eles um traço acidental – especialmente considerando que sua fé afeta o seu voto. Isso é exatamente o que não é mais possível fazer, o que é politicamente impensável no Brasil contemporâneo. Gleisi Hoffmann imagina nada menos que o apagamento político do evangelismo nacional. É inacreditavelmente inacreditável.
Leandro Demori citou o trabalho de três pesquisadores: David Samuels (Universidade de Minnesota), Fernando Mello (Universidade da Califórnia) e Cesar Zuco (FGV). No fim do ano passado esses mesmos três publicaram juntos o artigo “Partisan Stereotyping and Polarization in Brazil” (“Estereotipificação partidária e polarização no Brasil”), no qual argumentam que tanto os petistas quanto os antipetistas têm representações estereotipadas, tanto de si mesmos, quanto do grupo oposto. Ou seja, os petistas veem a si mesmos e aos outros de modo distorcido. A surpresa é que a esquerda pensava que estereotipar era coisa de reacionário; no entanto, “estereotipar não é meramente uma província de brasileiros direitistas. Pelo contrário, ambos os lados estereotipam tanto a si mesmos quanto a seus rivais”.
Penso que aqui está o encanto de Gleisi Hoffmann e do PT em geral: eles acreditam que são o partido do povo brasileiro, lutando a guerra de classes contra a elite nacional. Mas na verdade há tempos eles são a elite nacional. Uma nova guerra de classes foi instalada, entre dois grupos sob encantamentos opostos, mas a esquerda recusa-se a admiti-la. É por isso que o povo evangélico, que poderia ser o seu céu, tornou-se o seu inferno.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos