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No topo, há grandes simplificações. Um líder consagrado só precisa ter certeza daquilo que é melhor fazer, ou, pelo menos, decidir por uma das possibilidades. São imensas as lealdades centradas no número um. Quando ele tropeça, tem de ser escorado. Quando comete erros, eles devem ser encobertos. Quando dorme, não deve ser injustificadamente perturbado. E quando não presta, deve ser abatido a pauladas. (sir Winston Churchill)
A desordem brasileira não é fácil de interpretar. Ela não vem de uma fonte única; se parece com aqueles chuveiros jecas que mandam água em todas as direções. Mas com lama no lugar de água.
Num primeiro momento a oposição manifestou grande e compreensível preocupação com a possibilidade, diante da pandemia, de um lockdown geral, com decretação de estado de defesa ou de sítio, emulando a resposta radical chinesa. Cochichava-se aqui e ali sobre um novo “golpe”. Mas essas suspeitas não encontraram eco em uma realidade feita de inação e de negacionismo promovidos pela Presidência-núcleo. A Disneylândia presidencial deixou exasperada parte significativa da imprensa e de outros setores do governo.
E com isso começaram a pulular as notícias sobre medidas drásticas às vezes excessivas, às vezes inconstitucionais, tomadas por prefeituras, câmaras municipais e mesmo estados, envolvendo suspensão de liberdades civis fundamentais. Direitos como o de ir e vir, as liberdades de culto e de associação, a propriedade privada, a liberdade de expressão e de imprensa e o acesso à informação sofreram graves ameaças simbólicas ou reais nos últimos dias. Surpreendentemente, emergiu um autoritarismo muito mais disseminado.
Registre-se que, diante desses excessos autoritários, que justificadamente preocuparam a Presidência da República, a oposição de esquerda não moveu nenhuma palha – o que está de acordo com a sua peculiar concepção de “democracia”.
A pandemia autoritária
Mas vamos aos casos de autoritarismo. São muitos, e coligimos aqui alguns dos mais representativos para reforçar nosso argumento, começando com o sutil governador do estado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel. O homem ameaçou prender pessoas que desrespeitem o isolamento social. A Justiça do Piauí estabeleceu a suspensão de aglomerações de pessoas, com multa de até R$ 5 mil. O prefeito de Niterói, Rodrigo Neves (PDT), ameaçou bloquear os acessos à cidade. Mesmo se considerarmos acertada a decisão do ministro do STF Marco Aurélio Mello de reconhecer aos estados e municípios o direito de restringir a locomoção (e que o governo federal tentara concentrar em si), é evidente que tais ações dificultam a coordenação nacional das ações de combate à pandemia.
Ademais, o louvável objetivo da redução da circulação de pessoas tem sido promovido por diversos agentes públicos de modo inconstitucional, visto que prefeitos e governadores não têm poderes para simplesmente suspender o direito de ir e vir dos cidadãos brasileiros. Essas preocupantes violações motivaram, em 29 de março, um editorial da Gazeta do Povo intitulado “Os bloqueios contra o coronavírus e o direito de ir e vir”.
O governo de Pernambuco recolheu material hospitalar de loja sem pagamento. O governo de Alagoas foi acusado de “autorizar saques” a lojas e distribuidoras de produtos hospitalares. O governo do Ceará exigiu entrega imediata de medicamentos e insumos necessários ao combate da doença por todos os fabricantes, distribuidores e varejistas, listando 30 empresas. Em São Paulo houve confisco de máscaras da 3M para profissionais da saúde por ordem do governo do estado. Em Cotia (SP) o vice-prefeito, com um bando de guardas municipais, invadiu a Magnamed e confiscou 35 respiradores hospitalares. A Justiça obrigou a prefeitura a devolver tudo. Em São Roque (SP) sete respiradores foram retirados de hospital particular pela prefeitura. Já no dia 24 o secretário nacional do Consumidor, Luciano Timm, alertou para o risco de uma crise de abastecimento, causada por violações do próprio poder público contra as liberdades econômicas.
Diante de excessos autoritários, que justificadamente preocuparam a Presidência da República, a oposição de esquerda não moveu nenhuma palha
Coroando os esforços “democráticos” dessas autoridades, O PSol levantou uma ação no STF visando estatizar os leitos de UTI em hospitais privados, os quais compõem metade dos leitos existentes no país. Mas o direito à propriedade privada não pode ser suspenso, sem mais, sob um argumento que, levado às últimas consequências, aboliria todo o sistema de saúde privada. Não vivemos em um país socialista, e a Constituição não prevê mudança de regime em situação de pandemia.
Em Recife, a prefeitura adotou tecnologia de geolocalização para acompanhar em tempo real o deslocamento de da população. Ela agora rastreia o celular de 800 mil pessoas, para checar a obediência geral à recomendação de isolamento social. O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, anunciou acordo de cooperação com operadoras de telecom para monitoramento de padrões e aglomeração urbana. Presume-se que tais dados sejam cedidos de forma anonimizada, mas o aumento da vigilância estatal deve ser acompanhado com igual vigilância pela sociedade civil. A estratégia é boa e não implica autoritarismo per se, mas muita coisa pode emergir de uma zona cinzenta como essa, considerando as estripulias que autoridades municipais e estaduais vêm cometendo.
Entre absurdos que chegaram a mim, de forma anedótica, estariam casos como o de síndicos de prédios proibindo entrada de pessoas, e de um inteligentíssimo prefeito que destruiu as vias de acesso à cidade com uma escavadeira.
No campo da liberdade religiosa e de culto, é fato bem conhecido a tentativa de fechar templos religiosos, começando com a proibição de missas no Santuário Nacional de Aparecida em 14 de março, seguida por diversos decretos estaduais e municipais. A justiça de São Paulo, atendendo ao Ministério Público (sempre ele), proibiu a realização de missas e cultos em qualquer número (inviabilizando, por conseguinte, até mesmo transmissões on-line) e estabeleceu multa de R$ 10 mil. A liminar acabou derrubada pelo TJ de São Paulo. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou suspensão dos cultos da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, em resposta a uma questionável relutância do líder da igreja em cooperar com o esforço da sociedade. No Ceará um pastor foi preso por promover culto na quarentena; e em Poços de Caldas (MG), até mesmo uma missa anglicana on-line com apenas cinco participantes foi interrompida por agentes públicos.
Relatos semelhantes levaram a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure) a estabelecer o Observatório Anajure das Liberdades Civis, em parceria com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, como foi reportado aqui na Gazeta. Segundo a ministra Damares Alves, na live de lançamento da iniciativa, “o Observatório será um instrumento da Anajure para ajudar o Congresso e o Ministério dos Direitos Humanos a pensar bem neste momento. Será um braço nesse momento para nós”.
Uma das piores manifestações de ingerência do poder público foi a decisão do juiz federal Márcio Santoro da Rocha, da 1.ª Vara Federal de Duque de Caxias (RJ), suspendendo o decreto presidencial que incluía igrejas e casas lotéricas como serviços essenciais a serem preservados durante a quarentena, sob a justificativa de que estimularia a aglomeração e circulação de pessoas. Não posso negar o acerto de suas preocupações; mas tem um juiz o poder de colocar embaraços ao culto religioso, violando diretamente o artigo 19 da Constituição Federal?
Art.
19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
Inciso I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes
relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração
de interesse público;
Segundo destacamos, em outros momentos, e foi muito bem colocado por parecer do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), a liberdade de culto não pode ser embaraçada, e cultos não podem ser suspensos a não ser pela decretação de estado de defesa ou estado de sítio, segundo previsto nos artigos 136 e 139 da Constituição Federal.
Não vivemos em um país socialista, e a Constituição não prevê mudança de regime em situação de pandemia.
O advogado-geral da União, André Mendonça, pediu a suspensão da decisão, observando que as lotéricas são necessárias, inclusive, para o pagamento de contas e acesso ao Bolsa Família pela população carente. A decisão foi derrubada pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 2.ª região, Reis Friede, em termo que merece leitura atenta. Nele o procurador repreende duramente o magistrado federal por seu ato de intromissão em campo de autoridade de outrem, de modo que citaremos alguns dos melhores trechos:
Por certo, a sociedade brasileira vivencia um momento atípico, presenciando, inclusive, a decretação de calamidade pública pelo Congresso Nacional, em 20 de março do corrente ano, através do Decreto-Legislativo 6/2020. Porém, não se pode aproveitar o momento de pandemia mundial e calamidade pública para se permitir a perpetração de afrontas à Constituição da República e ao consagrado Princípio da Separação dos Poderes
Pelo contrário, o momento exige, por parte dos aplicadores do Direito, sobretudo dos juízes, muito equilíbrio, serenidade e prudência no combate ao inimigo comum (...)
Assim, sem grande dificuldade percebe-se que o magistrado de primeira instância usurpou competência constitucionalmente entregue para os poderes Legislativo, através do Congresso Nacional, e Executivo, através da Presidência da República e da Prefeitura de Duque de Caxias, violando frontalmente a Constituição da República e a harmoniosa relação que deve existir entre os poderes.
Essa usurpação de função dos Poderes Legislativo e Executivo, por si só, configura grave lesão à ordem jurídica apta a autorizar o deferimento deste pedido de suspensão. (...)
Sendo assim, descabe ao Poder Judiciário se intrometer em considerações de ordem política, uma vez que seu compromisso é exclusivamente com a técnica, com a correta interpretação das leis, sejam substantivas ou processuais, e com o respeito à Lei Maior.
O fato notável, quanto à decisão original do juiz Santoro, é o de que ela não apenas punha em risco o cordão de proteção à liberdade de religião e culto corretamente traçado pela Presidência, como também exorbitou a autoridade do Judiciário sobre os poderes Legislativo e Judiciário. A absurdidade foi realmente impressionante.
Nossa lista de violações efetivas e de excessos questionáveis poderia ser estendida em muitas páginas. Em todos os casos em vista, o livre trânsito, o direito à propriedade e a liberdade econômica, e o direito à liberdade de culto foram diretamente ameaçados por autoridades públicas, sob justificativas bastante plausíveis. Mas pode o pânico ou a urgência justificar o cometimento de violações constitucionais?
Não quero me deter, no entanto, na discussão sobre o nosso sistema constitucional. Há um fundo do poço, aqui, e esse fundo não se encontra na discussão jurídica. A questão é a autoridade, e sua função no mundo moderno. Como observei em meu último artigo nessa coluna, a desordem dos poderes que hoje tão conscientemente sofremos, no Brasil, é um problema mais profundo e com origens morais e espirituais. E a pandemia autoritária que desenhamos acima é uma moeda com dois lados: anomia e autoritarismo. Um caos constituído de pequenos autoritarismos.
Anomia e autoritarismo
Estou ciente de que, segundo a leitura dos processos históricos preferida em nossos ambientes acadêmicos, o autoritarismo seria um fenômeno fundamentalmente histórico e, portanto, passível de desconstrução, ao longo do processo civilizatório. Não acredito, no entanto, em um primado da história ou da cultura sobre a biologia e sobre a sociologia. Penso que a história é uma dimensão da realidade temporal, e não a ciência total da vida humana. E com isso em mente, estou entre os que veem o fenômeno da autoridade como um elemento estruturante da própria história.
Pense analogicamente nas estruturas de autoridade e ordem de uma civilização como um subsistema biológico; como o nosso sistema nervoso, que se espalha por todo o organismo e perpassa órgãos com as mais variadas funções. Seguindo com a metáfora corpórea, sugiro que temos mais do que um problema em órgãos localizados como a “economia” ou o “Executivo”, neste momento. Parece-me que o subsistema social da autoridade desceu um degrau a mais em degradação.
O autoritarismo, ou a “tirania”, nos termos de Blaise Pascal (1623-1662), é a inflamação em nossos sistemas de autoridade. Em Pascal, é a obsessão que emerge entre uma companhia de competentes por estender seus domínios em todas as direções, como se essa competência fosse fundadora de todas as outras. Como quando os fortes querem ser honrados pela sabedoria, ou os sábios pela beleza, ou os belos pela força. Na política, em especial, isso ocorre quando a força é usada contra a sabedoria ou contra a beleza. Como quando certo presidente minimiza a gravidade de uma doença, por exemplo.
Mas as fontes infernais das quais emerge o autoritarismo são morais. Ou melhor, imorais. A desordem e a fraqueza do tecido social criam as condições para o excesso autoritário, não apenas porque sugerem ao tirano a possibilidade de sucesso, mas porque dispõem as pessoas a aceitar a tirania em nome da ordem. A melhor proteção contra a “ordem” autoritária é a boa ordem. Mas, para mantê-la, é necessário manter a casa limpa e impedir que a liberdade se degenere em anomia. A desordem não pode imperar e, quando impera, é “João Batista” da tirania.
A pandemia autoritária que desenhamos acima é uma moeda com dois lados: anomia e autoritarismo. Um caos constituído de pequenos autoritarismos
Tendo em vista a história brasileira recente, podemos ler a ascensão neoconservadora como uma resposta a um estado anterior de desordem social evidenciado nas áreas dos “costumes” (da moralidade social, para sermos exatos), da administração pública, por conta da corrupção, da deseducação da juventude e da segurança pública. Nesse sentido, foi claramente um movimento de reação, não ao “progresso civilizatório” (como os bárbaros lulopetistas querem nos fazer crer), mas à pura e simples anomia social.
Mas a fuga desesperada para o colo dos revolucionários de direita, representados pela seita de Olavo de Carvalho e pelo decadente núcleo ideológico ligado à Presidência, concretizou tendências autoritárias desde sempre latentes na sociedade brasileira. Essas tendências patológicas não se manifestaram com toda a força a não ser diante de uma clara baixa de resistência social. O enfraquecimento do tecido social deu-se antes, durante a longa marcha lulopetista rumo à hegemonia. Mas o vírus do autoritarismo é o principal problema no atual momento histórico. É o nosso risco mais imediato.
Em The Great Evangelical Disaster (1984), o teólogo norte-americano e fundador da comunidade L’Abri, Francis A. Schaeffer (1912-1984), traçou as origens da crise de autoridade na incompreensão prévia da liberdade. Comentando uma edição especial da revista Time sobre o tema, ele observa:
“Aqui o problema dos anos 1920 a 1980 é apropriadamente expresso. É a tentativa de obter liberdade absoluta – de ser totalmente autônomo de quaisquer limites intrínsecos (...). Nesse ensaio a Time mostra isso que é realmente central, o problema de forma e liberdade. É um problema que cada cultura desde o princípio da história precisou confrontar. O problema é como se segue: se não já um equilíbrio apropriado entre forma e liberdade, a sociedade se moverá em direção a um de dois extremos. A liberdade, sem o equilíbrio apropriado da forma, levará ao caos e à ruptura total da sociedade. A forma, sem o equilíbrio apropriado da liberdade, levará ao autoritarismo, e à destruição da liberdade pessoal e social. Mas note o seguinte: nenhuma sociedade pode existir em estado de caos. E sempre que o caos reinou por um breve tempo, deu à luz a imposição do controle arbitrário.”
O corruptor número 1 da autoridade
Não quero sugerir, de modo algum, que o autoritarismo seja o resultado necessário e inescapável de um processo de anomia social. Os excessos bolsonaristas não são uma inevitabilidade, nem mera reação orgânica automática e amoral a um estímulo social, mas uma resposta fraca e degenerada às demandas históricas.
O fato, para todos evidente, de que a Presidência assumiu atitude negacionista e irresponsável para com o país diante de um perigo de grande monta à nação brasileira foi o que estimulou, mais do que qualquer coisa, as medidas desproporcionais e até inconstitucionais de alguns agentes públicos desesperados, e de outros evidentemente oportunistas, como o PSol e alguns governadores, em particular.
Considere-se a “ira justa” do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, do DEM. O antigo aliado de Bolsonaro acusou o discurso do presidente como “totalmente irresponsável”, deixou claro que o presidente da República abandonou a postura de governante e estadista, tentando lavar as próprias mãos e culpar outros pela vindoura crise econômica, e que não respeitará orientações da Presidência no tocante ao enfrentamento da pandemia.
O vírus do autoritarismo é o principal problema no atual momento histórico. É o nosso risco mais imediato
A maior responsabilidade de um líder, em momento de crise, reside na construção de uma grande aliança nacional para enfrentar o desafio premente e, quanto maior a periculosidade da ameaça, tanto maiores devem ser os esforços envidados para a expansão do círculo de cooperação. Toda a atitude conspiracionista e divisiva lançou o país em uma absolutamente indesejável comoção política, quando todas as energias deveriam ser voltadas para a construção de soluções coletivas. E até mesmo a possibilidade de enfraquecer a extrema-esquerda deveria ser obtida pela sedução dos moderados, e não por sua radicalização.
A Presidência e o núcleo ideológico não perderam tempo, no entanto, desautorizando a imprensa, desautorizando a ciência, desautorizando agências internacionais de saúde, desautorizando infectologistas e epidemiologistas, desautorizando o Imperial College Covid-19 Response Team, desautorizando Luiz Henrique Mandetta, seu próprio ministro da Saúde, desautorizando governadores, prefeitos e políticos em geral; desautorizando, desautorizando e desautorizando.
Tudo com a sempre fiel ajuda do extenso corpo de vassalos virtuais, prontos a espalhar fake news, a exagerar e distorcer observações críticas válidas ou não (tanto faz, o que importa é a narrativa) sobre a evidência científica e, mais recentemente, para destacar que a culpa é dos chineses. Ora, ninguém duvida da culpa do Partido Comunista Chinês, e pouca gente acredita nos seus números. Mas Xi Jinping não é o presidente do Brasil, e não está nas mãos dele a manutenção ou relaxamento da quarentena. Os chineses podem ter dirigido bêbados, mas quem está no volante do fusca-Brasil é Jair Messias Bolsonaro, e nossos pneus estão carecas.
Essa terrível combinação de inação e omissão, no tocante à necessidade nacional de palavras de união e esperança, combinada à implacável desautorização de tantas forças sociais e políticas do país, está eviscerando a ordem social, tanto quanto o fazem as famigeradas “políticas de identidade”. Ela foi a causa primordial do caos que começou a se generalizar, um caos feito, curiosamente, de uma longa série de pequenos autoritarismos.
A jornada de uma autoridade que não cumpre seus fins terminará em caos e tirania
Sou novamente obrigado a observar que a Presidência da República do Brasil está prosseguindo na jornada de sucesso do lulopetismo de destruir os subsistemas de ordem e autoridade da civilização brasileira – assunto de que já tratei na Gazeta. Ainda que mantenha, corretamente, ênfases urgentes em seu discurso moral, ela ocupa suas melhores energias na destruição do que resta de capital social e moral da nação. De certo modo, constrói tão bem o caos que parte da esquerda aparentemente tirou férias e assiste à tragédia comendo pipoca.
Não importa se produzindo o caos ou endurecendo o controle social, a jornada de uma autoridade que não cumpre seus fins terminará em caos e tirania. Bons líderes constroem a autoridade ao redor do bem comum, e fazem notar que o poder pode ser uma bênção, como disse Churchill certa vez. Na linguagem teológica judaico-cristã, isso se chama “a glória de Deus”.
Mas não há glória de Deus sem respeito aos homens feitos à sua imagem. É muito bom que a Presidência convoque o povo para jejuns e orações nesse momento, desde que eles sejam acompanhados de arrependimento em suas práticas políticas. Do contrário, se tornarão em outra blasfêmia. Pois o atual curso de ação faz parecer aos jovens que o poder não é uma bênção, mas uma maldição, e abre o caminho para o autoritarismo. Diante disso, retomo a epígrafe do presente artigo: no topo, há grandes simplificações. E a última delas já perto de se aplicar ao governo Bolsonaro.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos