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Guilherme Fiuza

Guilherme Fiuza

Roda-viva

Diálogo de um democrata culto diante de um dissidente do fascismo. (Foto: Pixabay)

Um democrata culto diante de um dissidente do fascismo:

– Parabéns pela sua coragem.

– De quê?

– Bem... De ir ao coração do obscurantismo, testemunhar a gestação do ovo da serpente e romper com essa estrutura de dominação suprainstitucional que se insinua sobre a democracia.

– Ah, isso é mermo.

– Como foi que você teve esse despertar?

– Parceiro, na real, meu despertador tá quebrado. Num me atrasei pra vir aqui porque o meu cachorro me deu uma lambida na cara bem na hora. Me amarro no meu cachorro.

– Poxa, que bacana. Admiro muito quem respeita os animais.

– Quem falou de respeito, animal? Meu cachorro é meu amigo.

– Ah, claro. Sim, amizade, respeito... São aspectos de um mesmo conjunto de valores. Isso me lembra um postulado, acho que foi Heidegger...

– Dobermann.

– Hein?

– A raça do cachorro é Dobermann.

– Ah, sim. Excelente raça!

– Meio traíra.

– Bem, depende de cada um...

– Tá chamando meu cachorro de traíra, parceiro?!

– Não! Claro que não. Foi você quem disse que...

– Eu disse que a parada da trairagem é uma parada dessa raça. Mas o meu não é.

– Que bom. Confiança é tudo! Por falar nisso, voltando... Quando foi que você perdeu a confiança nos seus ex-aliados? Foi no momento em que você descobriu que eles eram fascistas?

– Sei lá, parceiro. Eu vi a galera detonando os cara, e detonar é uma parada que eu curto.

– Entendi... E eles respeitaram a sua decisão soberana de ruptura democrática ou nessa hora se revelaram desleais e mostraram toda a propensão ao despotismo?

– Eu não tenho nada contra o deputismo, acho deputado uma profissão como outra qualquer.

– Desculpe, acho que não me fiz entender. Me referi a despotismo, propensão despótica, autoritária...

– Ah, isso é mermo.

– O quê?

– Isso aí que tu falou.

– O grupo político que está no poder tem propensão despótica?

– É.

– Tem neurose autoritária e quer suprimir as liberdades, interferindo de cima para baixo na autonomia do indivíduo enquanto ser social e usando o Estado como biombo para a mais hedionda tirania?

– É.

– Estou impressionado com o seu relato. Como pudemos chegar a esse ponto?

– Aí é de cada um. Eu vim de uber.

– Certo... Que bom ainda termos soberania sobre as nossas decisões de ir e vir.

– É, mas num sei se vai ficar assim não.

– Você acha que eles vão implantar uma ditadura?! Você poderia dizer quando o projeto ditatorial será implantado de fato e a grande noite cairá sobre o continente?

– Essa parada daí num tô ligado não. Falei que num vai ficar assim a parada do uber.

– Como assim?

– Parceiro, os taxista tão puto e vão meter a porrada nesses uber. Que tá barato pra c... mermo. Pra mim tá ótimo, mas se eu fosse taxista metia a porrada também.

– Sei... Entendo o seu ponto! A relativização é a beleza da democracia, não é mesmo?

– Beleza pura.

– Então concordamos! Viva o diálogo democrático! Chega de fascismo!

– Já é.

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