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– Você é do gabinete do ódio?
– Sou. E você?
– Gabinete do amor.
– Ah, que sorte.
– Pois é. Por que você não vem pra cá?
– Ué, me convida que eu vou.
– Você tem experiência?
– De amor?
– É.
– Não. Só de ódio.
– Ah, então não dá. Que pena.
– É. Imaginei.
– Mas tenta uma formação, tem uns cursos bons por aí.
– Se eu conseguir um certificado, será que consigo entrar no gabinete do amor como estagiário?
– Depende. Você vai ter que passar por um processo seletivo.
– É muito difícil?
– Vão te fazer umas perguntas sobre fake news. Se você der as respostas certas, tá dentro.
– Show. Vou começar a estudar.
– E joga fora tudo que você aprendeu no gabinete do ódio. Nada vai servir pra cá.
– Isso é que me deixa tenso. Será que eu vou conseguir uma mudança tão radical?
– Tudo é bom senso. Se você tiver bom senso, a transformação vem naturalmente.
– Quero muito isso. Será que você pode ir me dando umas dicas?
– Que dicas?
– Do que eu respondo no processo seletivo.
– Sobre fake news?
– É. Só uma ideia geral.
– Bom: em primeiro lugar, você precisa ser capaz de checar fatos.
– Aí é que o bicho pega. Não entendo nada disso.
– Não é difícil. Um bom começo é você ir separando as fontes confiáveis.
– Pode dar um exemplo?
– Ah, tem vários. O STF, por exemplo.
– Como assim?
– Não é uma bíblia, mas é um bom guia. Se o Alexandre de Moraes, por exemplo, disser que o Dias Toffoli não é o amigo do amigo do meu pai, é porque não é.
– Seu pai?
– Não, querido. O pai do Marcelo Odebrecht.
– Ah, tá. No caso, então, fake news seria dizer que o Toffoli era conhecido na Odebrecht como amigo do Lula.
– Exatamente.
– Se eu responder isso, consigo vaga no gabinete do amor?
– Não só isso. O processo seletivo é rigoroso.
– Pode dar outro exemplo de fonte confiável?
– Não posso falar muito. Mas vou te deixar alguns nomes-chave.
– Obrigado.
– Pensa sempre em Rodrigo Maia, Randolfe, Molon, Wyllys, Ciro Gomes...
– Como referência de fake news?
– Não. De verdade.
– Ah, tá. É que no gabinete do ódio é tudo ao contrário.
– Claro. O ódio é o contrário do amor.
– Isso. Eu devia ter deduzido.
– Não se preocupe. Você vai recuperar capacidade de dedução quando parar de odiar.
– Sério?
– Científico. Segundo a OMS e o Instituto Butantã, cerca de 90% dos...
– Espera. Já estou com informação demais. Vou começar a me confundir.
– Tudo bem, eu entendo. Aqui no gabinete do amor você vai conseguir armazenar muito mais.
– Na nuvem?
– Nas nuvens.
– Que lindo. Então você acha mesmo que tenho chance?
– Não sei. Precisaria fazer um teste pra verificar o seu potencial.
– Tudo bem, pode fazer.
– Ok. Me responde o seguinte: o que há em comum entre o impeachment da Dilma e a eleição do Bolsonaro?
– Foi golpe.
– Perfeito! Como você captou com tanta exatidão?
– Segui a lógica. É tudo ao contrário do que eu achava, né?
– Exato. Você tem chance. Só faltou uma coisa.
– O quê?
– A pronúncia. O certo é gópi.
– Ok. Também faltou te dizer uma coisa.
– O quê?
– Enfia esse gópi no...
– Êpa! Calma aí! Tá pensando que isso aqui é gabinete do ódio?
– Não. Isso foi uma declaração de amor.