Como todo mundo sabe – embora a maioria não tenha se dado conta –, o fingimento está na moda.
O Facebook finge combater fake news exterminando quem não reza pela cartilha politicamente correta. A Copa do Mundo foi marcada pelo teatro canastrão de Neymar – e apesar da reação geral à pantomima do menino-lobo, a final da Copa consagrou a manha: o gol inaugural da França saiu de uma falta simulada pelo manhoso Griezmann.
O juiz não haveria de estragar esse grand finale da Era Fake.
A apoteose do fingimento ficaria bem no Sambódromo carioca, mas acabou acontecendo perto dali, nos Arcos da Lapa – doravante conhecidos como Arcos da Apoteose: o Festival Lula Livre reuniu uma suposta elite cultural em defesa do maior farsante do Ocidente (não se sabe se no Oriente existe algum à altura, mas sejamos modestos).
O malandro-otário que está preso por roubar o povo fingindo defendê-lo foi defendido por essa suposta elite que finge defender esse mesmo povo, fingindo não ver que ele foi esfolado pelo seu ladrão de estimação. É ou não é apoteótico?
A ofensiva moralizante do Facebook tem um teor de honestidade intelectual muito próximo ao do ato cívico-cínico da Lapa. Os critérios de eliminação sumária de perfis e ideias (Stálin era uma criança de playground) foram cuidadosamente montados em alinhamento com a turma do jornalismo tarja preta que está até hoje gemendo à boca pequena contra o impeachment de Dilma Rousseff, a presidenta mulher.
Você se sente realmente seguro imaginando essa militância bem maquiada, que pergunta “cadê as provas” do maior assalto já perpetrado e esfregado na cara do país pela Lava Jato, trabalhando para te proteger de notícias falsas. Eles são chancelados por essa imprensa que adotou açougueiro bandido como denunciante de corrupção, então você já sabe que de fake news eles entendem.
Como diria Neymar Jr (quase tão perseguido quanto o filho do Brasil e a enteada): pode deitar e rolar, parça.
Deite e role, mas não se esqueça: grite e chore. A consagração do fingimento na Copa da Rússia mostrou que a reação mundial à comédia do sofrimento do menino Ney era fogo de palha. O menino Mbappé, craque francês e aluno aplicado do colega de PSG, fez as mesmíssimas manhas e malcriações – e saiu ileso, porque ficou com a taça.
Honra ao mérito e à fraude vencedora.
A seleção francesa (em parceria com a inglesa) trouxe para a Copa 2018 a técnica inédita e sofisticada da substituição incompreendida. Vamos explicar, porque vale a pena: o time que está ganhando anuncia uma substituição, o quarto árbitro indica o número do jogador a ser substituído, e este simplesmente finge que não vê.
Não é genial?
E finge para sempre, vagando a esmo por uma região remota do gramado, com o olhar perdido em direção ao céu ou ao chão, até que o juiz percorra uma longa distância até o pobre alienado para levar-lhe pessoalmente a informação cruel. Revejam as interpretações magistrais do francês Matuidi e do inglês Dele Alli.
Focados demoradamente pela câmera da FIFA, ambos têm a expressão vazia e desvitalizada, parecendo apartados do mundo, qual um Neymar sem Instagram. O momento do choque de realidade é terrível. Avisados pelo juiz da trágica notícia (depois de cutucados para notar o interlocutor e sair do transe), passam a uma feição de incompreensão, como se estivessem sendo convocados para montar um arranjo floral na mansão de Putin.
Eu? Você disse: eu? Como assim, eu?
O tempo vai passando, com milhões e milhões de testemunhas do truque em completo silêncio. Ninguém viu, ninguém protestou, ninguém nem estranhou. A humanidade do século 21é reverente ao grande fingidor.
Aí o desavisado fake, agora resignado, passa a cumprimentar um a um seus companheiros de time, acrescentando à velha técnica de sair lentamente de campo saudações em 360 graus às arquibancadas – ritual já devidamente assimilado e replicado nas partidas do Campeonato Brasileiro.
As grandes invenções se espalham rápido.
É por isso que você pode soltar uma frase politicamente correta e virar herói instantâneo do Facebook sendo a criatura mais egoísta do mundo. Vá com fé, ninguém vai notar! O fingimento está na moda, seu bobo. Perca esse pudor e declare agora, para delírio da cracolândia digital, que você não tolera o racismo. Fim de papo – você está dentro!
Não seja estúpido de criticar o maniqueísmo dos debates atuais, que marginaliza quem não repete tiradas humanitárias de pára-choque de caminhão. O escritor Luciano Trigo foi fazer isso no livro “Guerra de narrativas” (Editora Globo) e foi banido da Flip – festa que consagrou a campanha Lula Livro, a mais importante celebração intelectual da ignorância e do crime já vista por aqui.
Onde o Luciano estava com a cabeça para escrever sobre o controle do imaginário? Vai acabar banido também do Fakebook e enviado à Nicarágua para aprender o que é a verdadeira verdade.
Aliás, depois do sucesso nos Arcos da Apoteose, a segunda edição do Festival Fake in Rio bem que poderia ser em Manágua. Lisboa tá muito parada.