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Ainda tem gente que acha que ser “de direita” quer dizer alguma coisa. Será? Bem, se sua ideia é que “direita” seja uma forma de identificação política (eventualmente virtuosa), talvez seja necessário tirar algumas dúvidas decorrentes de um conceito tão vago. Seguem sugestões para você redigir o seu verbete “de direita” e recitá-lo sempre que for usar essa palavra - na esquina, no trabalho ou na internet -, caso não queira ser mal interpretado:
1. A sua “direita” é a do Malafaia, a do Bolsonaro ou a do Marçal?
2. A sua “direita” é a mesma da Joice?
3. A sua “direita” é a mesma do AI-5? Não? Ah, você é um democrata e não defende medidas autoritárias? Mas é que em muitos livros, registros históricos e em boa parte do imaginário brasileiro o AI-5 é associado com a “direita”. Melhor você explicar isso ao seu interlocutor, ok?
4. Na segunda metade do século passado, um regime considerado “de direita” no Brasil instituiu a censura. Você, que se diz “de direita”, é a favor da censura? Caso não seja, é bom esclarecer, ok?
5. A sua “direita” é a do Weintraub, do Santos Cruz e do Ernesto Araújo? Faz também essa distinção por favor. Todos esses supracitados - entre muitos outros “direitistas” - meteram o malho no governo Bolsonaro (ao qual tinham servido) e o seu interlocutor tem o direito de saber de que lado fica a sua “direita” em relação a um governo considerado, por essa mesma conceituação, “de direita”.
6. Sabe aquele regime desagradável da Alemanha na Segunda Guerra Mundial? (Desagradável é uma homenagem ao grande líder brasileiro que trata de forma carinhosa a ditadura venezuelana). Pois é, o regime desagradável com o qual o Adolfo tentou botar o mundo debaixo do seu chicote também é associado em boa parte da literatura política à “direita”. Não! - dirá você. Aquilo era uma variação do socialismo! Adolfo era um esquerdista! etc. Desculpe, mas independentemente da sua vontade, e não obstante todos os esclarecimentos filosóficos que você possa trazer, boa parte do senso comum identifica aquele regime desagradável da Alemanha com a “direita”. Então seria de bom tom você, um democrata virtuoso, esclarecer isso também quando se disser “de direita”, ok?
7. Ser “de direita”, no seu caso, significa alguma forma de compromisso religioso? Qual? Desculpe, mas muita gente faz essa associação automática. Se para você não tem nada a ver uma coisa com a outra, é bom incluir esse esclarecimento no seu verbete.
8. Ser “de direita” é ser “conservador”? O que é “conservador”? É conservar hábitos do passado e rejeitar a evolução dos costumes? Não é nada disso? Desculpe novamente, mas para muita gente, muita mesmo, “conservador” quer dizer exatamente isso. Será que dá pra você explicar? Quem sabe você pode andar com uma bula no bolso, ou com uma mensagem estampada na sua camisa, ou talvez tatuar um QR code? É super prático. Aí ninguém fica na dúvida do que significa “direita conservadora”.
9. A “direita conservadora” é contra os gays? Se não for, bota por favor esse esclarecimento também na sua bula acessível pelo QR code tatuado no seu antebraço. Não deixe essa dúvida no ar.
10. Tem algum problema pra você chamar liberdade de liberdade, honestidade de honestidade, corrupção de corrupção, democracia de democracia, censura de censura, abuso de poder de abuso de poder, ética de ética e mentira de mentira? Se não tiver, talvez você nem precise tatuar o QR code.
Conteúdo editado por: Aline Menezes