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— Documento.
— Pois não.
— Não pode entrar.
— Por quê?
— Esse documento não serve.
— Como não? Sou eu aqui, não tá vendo?
— Está incompleto.
— Falta o quê?
— O seu cartão.
— Cartão de crédito?
— Não. De saúde.
— Minha saúde está ótima.
— Isso é o que você está dizendo.
— Sim, estou dizendo a verdade.
— Assim você vai me criar problema.
— Por dizer a verdade?
— Não. Por não querer se identificar.
— Já me identifiquei!
— Já falei que não serve.
— E agora?
— Sinto muito.
—O que você sente?
— Eu disse que sinto muito. Lamento.
— Mas eu estou perguntando o que você está sentindo.
— Não é da sua conta.
— É sim. Deixa eu ver a sua temperatura.
— Tira a mão de mim.
— Só quero ver se você está bem de saúde.
— Quem tem que ver isso sou eu.
— Te achei um pouco quente.
— Quem tem que provar que está bem é você.
— Só provo se você provar também.
— Vou chamar a segurança.
— Está inseguro?
— Não. Estou cumprindo a minha função de manter esse ambiente seguro.
— Seguro contra mim?
— Contra o vírus.
— O que te garante?
— O cartão que você não me mostrou.
— Esse cartão não garante nada.
— Garante, sim. Está na lei.
— A lei é ilegal.
— Isso você pode discutir com a Justiça.
— Já discuti e já ganhei, mas o Supremo cassou.
— Então assunto encerrado.
— O Supremo não encerra nada.
— Não? O que está acima dele?
— Duas coisas.
— Quais?
— A sua estupidez e a sua covardia.
— Vou chamar a segurança.
— É o que todo covarde faz.
— Presta atenção: eu estou aqui cumprindo uma regra de cidadania e você está querendo descumprir essa regra. Além disso está me ofendendo. Então eu estou te avisando pela última vez que…
— Eu estou te avisando pela última vez que você não está protegendo cidadania nenhuma. Você é um robô exigindo um passaporte de rebanho vip.
— Cala a boca.
— Ah, finalmente você foi sincero. Posso te fazer um desafio?
— Não.
— Mas vou fazer assim mesmo: se eu provar que a minha imunidade está mais alta que a sua você troca de lugar comigo?
— Segurança!
— Isso. Chama a segurança pra te dar os anticorpos que você não tem.
— Eu estou imunizado.
— Não. Você está vacinado. E a vacina que você tomou, qualquer uma, não te impede de se infectar, nem de transmitir.
— Negacionista.
— E você não virou jacaré. Virou papagaio.
— Segurança!!
— Seu principal argumento científico até agora foi chamar a segurança.
— Não tenho que argumentar nada.
— Claro que não. Todo mundo sabe que ciência se faz com porrada.
— Some daqui.
— Vou sumir. Não tenho nada pra fazer aqui. Só vim te mostrar quem você é.

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