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Guilherme Macalossi

Guilherme Macalossi

Oriente Médio

A Síria trocou um carniceiro por outros

Rebeldes rasgam retrato do ditador da Síria, Bashar al-Assad, em Aleppo, tomada na semana passada (Foto: KARAM AL-MASRI/EFE/EPA)

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É possível comemorar enfaticamente a queda de um carniceiro como Bashar al-Assad sem ficar empolgado com o futuro da Síria. Tido como “ilustrado” e “polido”, Assad não era diferente de seus pares rústicos no Oriente Médio. Segundo organizações como a Syrian Network for Human Rights, Open Society Justice Initiative e a Syrian Archive, seu regime não apenas tinha matéria prima para produzir armamentos proibidos como os usou reiteradamente ao longo dos anos, inclusive para massacrar inimigos e a própria população. Responsável direto por centenas de milhares de mortes, Assad dificilmente responderá pelos crimes que cometeu contra a humanidade. Ao contrário, desfrutará de aposentadoria forçada em território russo com expensas pagas por Vladimir Putin.

O sufrágio universal e a liberdade individual não são franquias de fast food, mas sim parte de uma cultura que precisa ser assimilada pela sociedade em seu próprio cotidiano para produzir instituições e regras que as sustentem. Seu aprimoramento é resultante de uma construção geracional permanente. A malfadada “Primavera Árabe”, que prometia uma nova era no Oriente Médio, promoveu apenas mais desordem e outros tipos de ditaduras. O Egito e a Líbia de ontem são a Síria de hoje.

Os milicianos que chegaram ao poder têm histórico de ligações com o terrorismo internacional e são tão carniceiros quanto Assad. Abu Mohammed al-Jolani, fundador do grupo Al-Nusra e possível novo líder da Síria, foi integrante da Al Qaeda e do Estado Islâmico

E aqui cabe uma autocrítica do Ocidente, que costuma colocar o “fim da história” na frente dos bois, imaginando que regimes totalitários podem ser miraculosamente substituídos por democracias liberais em qualquer parte do mundo. Os norte-americanos pagaram um preço monumental em vidas e dinheiro nas experiências fracassadas que tentaram cultivar no Iraque e no Afeganistão.

Os milicianos que chegaram ao poder têm histórico de ligações com o terrorismo internacional e são tão carniceiros quanto Assad. Abu Mohammed al-Jolani, fundador do grupo Al-Nusra e possível novo líder da Síria, foi integrante da Al Qaeda e do Estado Islâmico. Chegou a ser preso pelos Estados Unidos em 2006. Até hoje há uma recompensa de 10 milhões de dólares oferecida pelo governo americano por informações que o levem a ser capturado. Nos últimos anos, entretanto, ele tem buscado suavizar sua imagem e de seu grupo. Mas é improvável que tenha se tornado um “moderado”. Só cativa os incautos.

Logo após a queda e fuga de Assad e da tomada de Damasco pelas forças insurgentes sírias, Israel fez operações militares no pais. Segundo o ministro das Relações Exteriores israelense, Gideon Saar, os ataques tiveram como alvo locais em que se concentrariam armas químicas, foguetes de longo alcance e outros tipos de arsenais, de forma a “prevenir um cenário semelhante ao ataque de 7 de outubro pela Síria”, disse em entrevista para a CNN. Uma iniciativa muito semelhante ao ataque ordenado por Winston Churchill à frota da marinha francesa quando estava sob o risco de cair em domínio nazista durante a Segunda Guerra Mundial.

Putin e o regime iraniano perderam com a queda de Assad, mas ninguém pode reivindicar uma vitória ou um cenário favorável na Síria depois dele. A história mostra que não há razão para o otimismo, e o ataque preventivo israelense que o país continuará sendo fator de instabilidade num Oriente Médio cada vez mais conflituoso, cheio de ditadores e terroristas.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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