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Tudo o que envolve um presidente da República será sempre questão de Estado, ainda que subsista a dimensão individual de sua vida. E é por isso que qualquer situação sobre sua condição de saúde gera especulação. Mas mesmo isso deveria ser abordado com decoro, consideração e algum nível de empatia. O espírito do tempo, entretanto, é outro. A necropolítica, que foi erigida e cultivada durante a pandemia, pariu a desumanização do outro como um método de destruição daqueles considerados antagônicos.
Quando Hélio Schwartsman escreveu um texto na Folha de São Paulo afirmando objetivamente que torcia para que Jair Bolsonaro morresse de Coronavírus, apontei em minha coluna na Gazeta do Povo para os perigos do consequencialismo e descrevi o que já considerava na época como o sem precedentes “nível de vulgarização moral e banalização da vida em nosso país”. A realidade não mudou.
Quem fica atrás de um computador calculando quanto ganharia com a desgraça ou a danação alheia, seja de Lula ou de qualquer outro, não passa de um mercador da morte
Agora tivemos a hipotética morte de Lula precificada por franjas no mercado. De tal forma que uma operação a que foi submetido no crânio teve o efeito de derrubar o dólar. Mas não porque certos agentes financeiros torciam por sua recuperação. Ao contrário.
Zelosos que são com as contas públicas, talvez achem que a perda de uma vida até valha a pena, desde que a inflação fique no centro da meta do Banco Central. Mas isso, por óbvio, não tem nada a ver com fiscalismo. Não passa de ideologia e ódio patológico.
Achar o governo medíocre ou Lula incapaz, considerar que o país caminha para o abismo, julgar suas políticas públicas e visão de mundo ineficazes ou mesmo prejudiciais é muito diferente de desejar o pior para o ser humano - a morte. E é exatamente essa linha de corte moral objetiva que vem sendo sistematicamente violada no Brasil.
Ainda que o capitalismo tome o egoísmo como virtude, é um sistema assentado em valores. Ou Adam Smith, seu pai intelectual, não teria escrito a Teoria dos Sentimentos Morais antes ainda do que a A Riqueza das Nações. Quem fica atrás de um computador calculando quanto ganharia com a desgraça ou a danação alheia, seja de Lula ou de qualquer outro, não passa de um mercador da morte.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos