O que transcorreu no Palácio do Planalto nesta última segunda-feira (18) não pode ser enquadrado apenas como mais uma patuscada de Jair Bolsonaro. O que ele fez, afinal, foi converter a sede do governo em um bunker de sua guerra permanente contra o sistema eleitoral. Uma estrutura pública foi usada para que o presidente enlameasse a imagem do país ante uma plateia de dignatários e representantes de dezenas de nações. Menos, é claro, pelo conteúdo de suas supostas revelações e mais pelo papel criminoso que o mandatário protagonizou.
Diante de um telão em que se lia a palavra “brienfing”, Bolsonaro vituperou contra as urnas eletrônicas e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O apreço pela língua inglesa só não era menor que apreço pela democracia. As provas que prometeu não passavam do velho conjunto de notícias falsas já repetidas ad nauseam ao longo de seu mandato. Todas elas já devidamente respondidas e desmentidas. A única coisa inédita em seu pronunciamento foi a tentativa de criar um caso internacional.
Bolsonaro não está investido da atribuição de brincar de tanque, como se os militares lhe devessem obediência pessoal. Sua condição é institucional, e a relação de hierarquia se dá no limite da lei.
Em uma situação normal, o evento de segunda resultaria em um processo de impeachment. Mas Bolsonaro sabe que isso está descartado. Atua dessa forma porque se sente confortável politicamente para tanto. Sua ousadia é proporcional a sua blindagem. Conta com a inação do procurador-geral da República, com a cumplicidade gananciosa do presidente da Câmara dos Deputados e, talvez o mais grave de tudo, com a convicção de que pode acionar as Forças Armadas para fazer valer sua vontade.
“Será que se esqueceram que sou o chefe supremo das Forças Armadas?”, questionou. Bolsonaro não está investido da atribuição de brincar de tanque, como se os militares lhe devessem obediência pessoal. Sua condição é institucional, e a relação de hierarquia se dá no limite da lei. Para lembrar Mark Milley, as Forças Armadas servem à Constituição, e ao chefe de Estado como enquanto ente institucional. Elas não são subalternas da arruaça. Ao menos não deveriam ser.
A gravidade do ocorrido no Planalto ganha força porque novos personagens se incorporaram à trama de contestação das eleições. Destaque para o ministro Ciro Nogueira, da Casa Civil, e para o General Luis Carlos Gomes Mattos, presidente do Superior Tribunal Militar (STM). Presentes na ocasião, deixaram suas respectivas digitais na cena do crime. É a primeira vez que o centrão toma parte nessa história, e o silêncio de Arthur Lira é suficientemente revelador. Quanto ao referido militar, apenas se junta ao grupo oriundo da caserna que, liderado pelo ministro da Defesa, se tornou esteio desse conspiracionismo perigoso.
Em uma coluna anterior publicada aqui na Gazeta do Povo, escrevi que o caminho disruptivo estava sendo construído de forma “desassombrada”, e que “ninguém terá o direito de se dizer surpreso” caso cheguemos ao limite da contestação. Bolsonaro não dá margem para dúvidas, e agora dezenas de embaixadores são testemunhas de suas intenções. Ele apresentou ao mundo o ‘brienfing’ do golpe.
Julgamento do Marco Civil da Internet e PL da IA colocam inovação em tecnologia em risco
Militares acusados de suposto golpe se movem no STF para tentar escapar de Moraes e da PF
Uma inelegibilidade bastante desproporcional
Quando a nostalgia vence a lacração: a volta do “pele-vermelha” à liga do futebol americano
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS