No mesmo dia em que se repercutia a morte do filósofo Olavo de Carvalho, o governo também montou um evento para anunciar a carta-convite do conselho da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para que o Brasil inicie o processo de adesão formal ao grupo. A cerimônia contou com a presença do ministro das Relações Exteriores, Carlos França; do ministro da Economia, Paulo Guedes; e do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, que se sentou ao centro. A posição deste último serve para mostrar quem de fato manda no pedaço. O centrão, que foi saco de pancada do bolsonarismo em 2018, é o esteio no qual se firma a esperança de reeleição do atual presidente. A reorganização das forças políticas que estão no poder levou à subserviência dos militares e a marginalização do olavismo.
Integrante de partidos fisiológicos ao longo de três décadas como parlamentar do baixo-clero, Bolsonaro jamais foi aluno ou discípulo de Olavo de Carvalho. Com alguma amplitude, o escritor influenciou os filhos do presidente, mas não ele, senão por opiniões genéricas publicadas em artigos ou vídeos que viralizaram no Youtube. É improvável que um capitão reformado avesso à leitura tenha ido até a última página de “O mínimo que você precisa ser para não ser um idiota”, quanto mais terminado a primeira de “Aristóteles em nova perspectiva”. Olavo sabia disso, e, nos últimos meses de vida, desgostoso com o governo, chegou a dizer que havia sido usado na campanha eleitoral como “poster boy” por Bolsonaro.
Em seu discurso da vitória, Bolsonaro deixou uma das obras de Olavo de Carvalho em cima da mesa em que falava. Era uma sinalização para a militância. Com isso pretendia indicar que os ensinamentos ali presentes norteariam sua conduta como líder político. No princípio, alguns alunos e seguidores do escritor foram indicados a cargos importantes, mas foram perdendo espaço, principalmente após o início da pandemia. Hoje, os que sobraram, não ocupam mais do que posições periféricas, longe do centro de poder decisório.
Sim, Olavo de Carvalho foi o grande engenheiro da nova direita no Brasil. É difícil encontrar algum integrante dela que não tenha sido influenciado direta ou indiretamente por seus escritos e pensamentos. Ele reabilitou uma corrente de pensamento natimorta com suas aulas, produção bibliográfica e as colunas que tinha nos grandes jornais brasileiros. Ao contrário de outros intelectuais da direita, como Paulo Francis, José Guilherme Merquior e Roberto Campos, Olavo tinha um objetivo: furar o que chamava de hegemonia cultural de esquerda. E nisso foi muito bem sucedido.
O que ele não imaginava é que, no processo, acabaria sendo assimilado pelo movimento político surgido indiretamente a partir das ideias que pôs para circular. Bolsonaro se aproximou do olavismo de maneira a ter uma chancela intelectual e arregimentar apoiadores que lhe dessem sustentação no debate público. E isso se deu principalmente a partir do momento em que começou a calcular um projeto presidencial. É claro, entretanto, que a vitória de Bolsonaro em 2018 se deu também por outros fatores. Ele acabou se tornando catalizador da insatisfação generalizada do país, que não suportava mais o lulopetismo e sua indústria corruptiva. Eleito, tratou de hegemonizar a direita, que passou a ir a seu reboque, ainda que muitas vezes contrariada.
Olavo de Carvalho foi enterrado na última quarta-feira numa cerimônia discreta na Virgínia. Em gesto simbólico, Bolsonaro decretou um dia de luto oficial. Agora o presidente segue seu caminho, em busca de mais um mandato. A influencia efetiva dos olavistas enlutados será mínima, para não dizer desprezível. As condições postas para 2022 são muito diferentes das de 2018, afinal. O sucesso do Auxílio Brasil valerá muito mais do que o combate ideológico ao Foro de São Paulo. "O mínimo" foi parar nalguma estante empoeirada, sendo substituído na mesa por um porta-retrato com Valdemar da Costa Neto. Na "guerra pela eternidade", para fazer referência ao livro de Benjamin Teitelbaum, Bolsonaro já mostrou que sua alma é do centrão.
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