Ao contrário do que difunde por aí, Jair Bolsonaro tem sim responsabilidade pelas políticas públicas de combate à pandemia de coronavírus. O presidente e seus acólitos nas redes sociais tentam colar a narrativa de o que Supremo Tribunal Federal tirou as atribuições da União delegando tudo aos Estados e Municípios. Bolsonaro chegou a publicar em seu Twitter que “O STF determinou que as ações diretas em relação ao covid-19 são de responsabilidade de estados e municípios”.
Bolsonaro usa uma fake news para poder lavar as mãos e fazer descarado proselitismo político ao atribuir aos governadores e prefeitos a culpa tanto pelas dezenas de milhares de mortos quanto pela crise econômica. O que ele deseja é não ser cobrado por nada e ficar com o papel de mero repassador de recursos, o que seria uma posição confortável, principalmente diante da maior crise sanitária e social da história do país.
O que o STF decidiu, entretanto, é bastante diferente. Estabeleceu a competência concorrente entre os entes federados. Ou seja, a possibilidade de que União, Estados e Municípios tenham autonomia no desenvolvimento de estratégias de ação e políticas públicas, cada qual em sua esfera de competência, preservando o equilíbrio entre eles. De forma nenhuma isso significa que o Governo Federal esteja eximido do dever de agir.
O posicionamento da Corte diz respeito a duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) (as de número 6341 e 6343) e uma Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) (a de número 672).
Na decisão sobre a ADPF 672, o ministro Alexandre de Moraes estabeleceu que ”nos termos do artigo 24, XII, o texto constitucional prevê competência concorrente entre União e Estados/Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da saúde”, e arremata que “o exercício da competência concorrente dos governos estaduais e distrital e suplementar dos governos municipais, cada qual no exercício de suas atribuições e no âmbito de seus respectivos territórios, para a adoção ou manutenção de medidas restritivas legalmente permitidas durante a pandemia (...) independente de superveniência de ato federal em sentido contrário, sem prejuízo da competência geral da União para estabelecer medidas restritivas em todo o território nacional, caso entenda necessário”.
Vamos deixar bem claro? “Sem prejuízo da competência geral da União”. Portanto, a decisão ressalta as atribuições dos Estados e Municípios, mas não dispensa o Governo Federal de atuar contra a pandemia.
Já são dois meses sem Ministro da Saúde. O General Eduardo Pazzuelo, que ocupa a função em caráter interino, conduz a pasta sem ter a menor ideia do que fazer. É mais um interventor do que um Ministro propriamente dito. Ele foi colocado ali para cumprir os caprichos negacionistas do Presidente da República, que, mesmo contaminado pelo coronavírus, continua tratando a pandemia com aviltante menoscabo. Como se não bastasse, passou a usar o tratamento da doença que o acomete para fazer propaganda de um remédio que não tem eficácia comprovada. Ele virou, portanto, uma cobaia pública a serviço do obscurantismo.
Nesta semana, matéria publicada no jornal "O Estado de São Paulo" mostrou que o Brasil alcançou apenas 20% da capacidade de testes para covid prevista. A razão para esse baixo número é que o Ministério da Saúde distribui kits incompletos aos Estados. Com isso, dos 4,4 milhões de testes PCR, somente 1,2 milhão foi feito. Isso por falta do insumo de extração do RNA do vírus. Péssimo para um ministério que tem no titular um especialista na área da logística.
Bolsonaro faz imenso esforço para se afastar de qualquer responsabilidade porque a atuação de seu governo no enfrentamento da pandemia é calamitosa. Trocas no ministério, protocolo de uso de medicação farsesco, tentativa de escamoteamento de informações, boicote ao uso de máscara e promoção contínua de aglomerações. Esses atos vão se somando na medida que avançamos para atingir mais de 100 mil mortos. Um número que ficará como chaga indelével para as gerações futuras lamentarem.