Só um ingênuo ou um desavisado pode imaginar que o fim do mandato de Arthur Lira como presidente da Câmara dos Deputados representa o fim de sua influência política junto a seus pares ou nos círculos de poder em Brasília. Ele continuará dando as cartas, mesmo que na “planície”, para ficar com a expressão de José Dirceu. Seu sucessor, o deputado Hugo Motta, foi escolhido também para mantê-lo no centro decisório como uma eminência parda. Essa força toda apenas enfatiza o legado que deixa. E ele não é virtuoso.
Ao contrário do que o senso comum da análise política pode apontar, Lira não fortaleceu a Câmara dos Deputados. Lira fortaleceu, isso sim, o Centrão, que se adonou de vez do Legislativo, contribuindo para a desmoralização do Congresso e da legítima atividade parlamentar. O que se constituiu a partir de seu primeiro mandato foi a sindicalização das bancadas. Os deputados e senadores viraram categorias, mas com o poder de transformar as leis em seu próprio benefício, a despeito dos interesses da sociedade.
Lira desconstruiu em definitivo o presidencialismo, fortaleceu o corporativismo e constituiu, via orçamento secreto, uma verdadeira fábrica de votos. Não surpreende, portanto, que sua aprovação seja tão alta entre os deputados
A recente votação do pacote fiscal do governo Lula enfatiza essa condição. O projeto só foi examinado após a liberação de bilhões em emendas parlamentares. Um achaque flagrante, resultante do controle orçamentário que hoje se encontra sobre a mesa diretora da Câmara.
Em junho de 2023, escrevi na Gazeta do Povo que, na última década, “o eixo de poder se deslocou para o Legislativo”. Tal processo se deu de forma paulatina, principalmente a partir do impeachment de Dilma Rousseff. Foi no governo de Jair Bolsonaro, entretanto, que esse processo se agudizou. “Na prática, Lira agencia os interesses dos deputados, numa relação terceirizada com o Executivo. As bancadas se reportam a ele, e não aos ministros ou ao próprio presidente da República”, apontei.
Com Lira no comando da Câmara, as chamadas emendas de relator deixaram de servir estruturalmente para reparar o Orçamento e passaram a executar diretamente uma expressiva parte dele. Hoje, dos 200 bilhões do orçamento considerados livres, os parlamentares controlam 50 bilhões. É uma proporção que só existe no Brasil. Na prática, o Congresso Nacional virou um Executivo paralelo, só que sem o ônus de governar. A ele compete apenas distribuir, impositivamente, o quinhão de verbas a que cada deputado tem direito, quase sempre com objetivos eleitorais. Um levantamento feito pela Globo News aponta que nos 100 municípios brasileiros mais beneficiados com “emendas pix”, o percentual de reeleição de prefeitos chegou a 93%.
Lira desconstruiu em definitivo o presidencialismo, fortaleceu o corporativismo e constituiu, via orçamento secreto, uma verdadeira fábrica de votos. Não surpreende, portanto, que sua aprovação seja tão alta entre os deputados. Segundo uma pesquisa do Ranking dos Políticos, seu mandato na Câmara é tido como ótimo ou bom para 78.9% dos parlamentares. E em seu último dia no posto, foi elogiado por bolsonaristas, centritas e lulistas. Nelson Rodrigues dizia que “toda unanimidade é burra”. Esta, entretanto, é bem esperta, e fez muito mal ao Brasil.
Congresso prepara reação à decisão de Dino que suspendeu pagamento de emendas parlamentares
O presente do Conanda aos abortistas
Governo publica indulto natalino sem perdão aos presos do 8/1 e por abuso de autoridade
Após operação da PF, União Brasil deixa para 2025 decisão sobre liderança do partido na Câmara
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS