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Na última semana, o governo federal tornou institucional a classificação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) como um “golpe”.| Foto: Nelson Almeida/AFP

Golpe é, por definição, todo ato ao arrepio da lei que visa à deposição de um governo legitimamente eleito. Foi o que se viu dia 8 de janeiro, quando uma súcia de bárbaros depredou a sede dos três poderes buscando estimular uma ação direta das Forças Armadas para tomar o controle do país. Pretendiam a abolição violenta do Estado Democrático de Direito e a anulação do processo eleitoral.  O impeachment de Dilma Rousseff, por outro lado, foi um movimento político com a participação da sociedade civil pacificamente organizada, de partidos políticos, do Tribunal de Contas da União e das duas casas do Congresso Nacional, tudo sob o rito e presidência do Supremo Tribunal Federal com o reconhecimento da comunidade internacional. Reduzir isso a um ato golpista, como fez Lula na Argentina, é um ataque às instituições que ele diz respeitar.

As falas do presidente da República não param de pé, eivadas de incoerências que estão. A começar pelo fato de ter um vice-presidente que apoiou o que ele chama de golpe. Em meados de janeiro, num encontro da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Alckmin dividiu mesa com Michel Temer. Não o chamou de “golpista”, e sim de “presidente”, inclusive elogiando a reforma do ensino médio aprovada durante o seu governo.

Lula exporta para o cenário externo uma narrativa política do PT. Como consequência, banaliza a palavra golpe e enxovalha uma decisão democrática.

Quando entrevistei Lula na Rádio Bandeirantes, perguntei ao então pré-candidato sobre o posicionamento de seu companheiro de chapa. Lula mentiu negando que Alckmin tenha apoiado o afastamento de Dilma. Os fatos mostram o contrário. Na época governador de São Paulo, Alckmin defendeu a medida argumentando que “o PSDB agiu corretamente votando favoravelmente ao impeachment”. Seria Alckmin um golpista ou simpatizante de golpistas?

A mesma pergunta é válida para o ministro Luís Roberto Barroso, que estabeleceu o rito legal a ser seguido pelo Congresso Nacional. E também para Ricardo Lewandowski, que ocupava a presidência do Supremo Tribunal Federal. Foi ele quem presidiu os trabalhos durante a fase final de julgamento do processo contra a ex-presidente. Por dedução da fala de Lula, ambos seriam golpistas.

Durante a eleição, Lula se aproximou de próceres políticos do impeachment de Dilma Rousseff. Dentre eles Renan Calheiros e Eunício Oliveira, ambos defensores da medida na época. Cabe perguntar: o presidente da República fez aliança política com golpistas?

Se Dilma foi deposta ilegalmente, então o governante que a sucedeu foi ilegítimo, assim como ilegítimos seriam todos os seus atos, inclusive o de indicar Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal. Moraes, que hoje é celebrado por parte da esquerda, foi prestigiado por Lula quando tomou posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Lula trata a deposição constitucional de Dilma como golpe mas reconhece os atos de Michel Temer. A incoerência tem método.

Lula exporta para o cenário externo uma narrativa política do PT. Como consequência, banaliza a palavra golpe e enxovalha uma decisão democrática que teve a participação inclusive de muitos de seus atuais aliados. Mas, para ele, pouco importa se a acusação tem lógica ou não ou quais são seus efeitos colaterais. Pretendem é impor uma verdade oficial na qual seu partido é a suprema vítima. É o terraplanismo institucional.

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