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Guilherme Macalossi

Guilherme Macalossi

Controvérsia de Daniel Silveira e o limite para os aviltadores de instituições

A decisão do Supremo Tribunal Federal de condenar Daniel Silveira não coloca em risco a liberdade de expressão. A menos que a liberdade de expressão seja tomada como licença para a prática de crimes. Mas esse é um debate já vencido. A legislação, bem como decisões precedentes da própria Corte, trataram de estabelecer um limite claro. Da mesma forma, não pode a imunidade parlamentar servir para proteger deputados e senadores para além das prerrogativas concernentes aos seus respectivos mandatos. É isso ou o vale tudo, que coloca em risco a própria existência da institucionalidade.

Leia a opinião da Gazeta do Povo: o alcance da imunidade parlamentar

No vídeo que ensejou o pedido de prisão formulado pela Procuradoria-Geral da República, Daniel Silveira conjectura sobre dar uma surra no ministro Edson Fachin. “Por várias e várias vezes já te imaginei tomando uma surra. Ô? quantas vezes eu imaginei você e todos os integrantes dessa Corte. Quantas vezes eu imaginei você, na rua, levando uma surra”, disse. E ainda aproveitou para questionar: O que você vai falar? Que eu tô fomentando a violência?”. Claro que estava. Afinal, falava para sua militância. Sua manifestação servia de convite.

Sim, a “manifestação crítica aos poderes constitucionais” é uma garantia dada a qualquer cidadão. Consta no Artigo 359-T do Código Penal. Eis porque cabe questionar: Onde está, afinal, “a manifestação crítica” contida nessa fala de Daniel Silveira? Inexiste. A menos que seja manifestação crítica “jogar o ministro dentro da leixeira” e “retirar o ministro na base da porrada”.

O que ele disse não se enquadra como exercício de opinião, mas é tipificado no Artigo 359-L do Código Penal. A saber: "Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais". Ele incidiu nessa prática também quando pediu um novo AI-5, bem como a destituição dos integrantes da Corte.

Em seu voto, o único que foi pela absolvição do réu, Kássio Nunes Marques reduziu tudo o que foi dito por Daniel Silveira a meras “ilações, conjecturas inverossímeis sem eficiência e credibilidade”. Conjectura quem fez foi o ministro. As falas do deputado são cristalinas e contundentes. Incitava a violência, que poderia ser levada a cabo por qualquer radical que resolvesse por em prática o sonho do deputado.

Importa lembrar, alias, que o referido magistrado teve posição diferente quando, criticado pelo colunista Conrado Hübner, da Folha de São Paulo, acionou a Procuradoria-Geral da República para investigá-lo por supostos crimes contra a honra. No juízo enviesado de Nunes Marques, um artigo de opinião no jornal pode ser mais perigoso do que ameaças literais difundidas pelas redes sociais. 

Se o STF tivesse outra postura que não a de dar um claro limite aos aviltadores da institucionalidade e aos golpistas, criaria um precedente perigoso para a normalização de condutas que são criminosas. Todos se sentiriam a vontade a incitarem impunimente atos de violência contra integrantes do Judiciário ou de outros poderes, bem como medidas de exceção.

Em decisão calculada para aumentar o conflito com a Corte, Bolsonaro usou sua prerrogativa do indulto para tentar livrar Daniel Silveira. Como esse ato de benefício pessoal tem característica inédita, sua abrangência ainda é desconhecida. Além do potencial efeito limitado, já se apontam múltiplas inconformidades, como intempestividade e desvio de finalidade. Incontornavelmente, a questão voltará ao STF, que está preso numa armadilha política: ao mesmo tempo que precisa se posicionar sobre matéria controversa no mundo do direito, acaba dando verossimilhança ao discurso de que estaria movido para fazer oposição ao presidente.

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