Se há uma certeza comprovada por meio de pesquisas públicas e levantamentos dos mais variados institutos é de que a maior parte da população não concorda nem deseja a alteração da lei do aborto no Brasil. Isso porque, apesar das críticas da esquerda e de grupos progressistas, a legislação sempre foi razoável. Não proíbe de todo, mas regulamenta, estabelecendo casos em que o procedimento pode ser realizado: risco morte da mãe, anencefalia do feto e estupro. Mas isso pode mudar, e com uma velocidade muito acima do razoável para um tema tão sensível.
A Câmara dos Deputados acelerou a tramitação de um projeto de lei que visa equiparar a interrupção da gravidez após a 22ª semana ao crime de homicídio. O texto é de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante e teve regime de urgência aprovado no afogadilho, com Arthur Lira usando a votação simbólica para tratorar qualquer debate possível. Deve achar que preside o parlamento iraniano. Os deputados nem sabiam direito o que estava sendo aprovado. Quando alguns se deram conta, a coisa já estava resolvida. Com isso, o projeto vai direto para o Plenário.
O Legislativo é o poder a quem compete debater a lei do aborto, disso não há dúvida, mas não é exatamente isso o que está sendo feito até aqui
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que defende que o aborto continue sendo considerado crime, teve de vir a público para colocar a bola ao centro. Defendeu que se deve legislar com cautela. “Uma matéria dessa natureza jamais, por exemplo, iria direto ao Plenário do Senado Federal. Ela deve ser submetida às comissões próprias”, disse em coletiva de imprensa. Fato é que o grosso das reações foi negativo, o que obrigou até mesmo Lira a recuar e admitir que “não há hipótese de o projeto avançar nesses casos previstos em lei”, falou para o portal G1.
O Legislativo é o poder a quem compete debater a lei do aborto, disso não há dúvida, mas não é exatamente isso o que está sendo feito até aqui. O avanço da matéria na forma do atropelo se dá como estratégia política para pressionar o governo Lula, e também dos deputados do centrão responderem o Supremo Tribunal Federal, que incorretamente judicializou o tema. No exterior, Lula desconversou. Nas redes sociais, o deputado Sóstenes desafiou o presidente a tratar do assunto.
É um jogo essencialmente político. E de ganha-ganha. Se for aprovado, o centrão avança na pauta de costumes, impondo a esquerda uma enorme derrota em um tema que lhe é caro. Se não for, o discurso político do grupo também reforça pela necessidade de combater “abortistas”, ainda que a oposição a esse projeto em especifico também venha de pessoas que são necessariamente contra a liberação do aborto.
Fica evidente que o objetivo maior não é tanto preservar a vida dos nascituros inocentes, mas ampliar o desgaste dos demais poderes, principalmente o Executivo.
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