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Não faz uma semana, a Polícia Federal batia à porta do general Mauro Cesar Lourena Cid, do advogado Frederico Wassef e de outros supostos partícipes no esquema de desvio de joias que teria como finalidade enriquecer ilicitamente Jair Bolsonaro. Os fatos novos se avolumaram rapidamente. Em sua última edição, a revista Veja trás a informação de que Mauro Cid pretende confessar seus crimes, apontando o ex-presidente como mandante e beneficiário último.
Vem uma delação premiada pela frente? É uma pergunta perfeitamente cabível. Cid, é sabido, tornou-se personagem de uma penca de escândalos para além desse em que relógios das marcas Rolex e Patek Philippe eram literalmente “passados no cobre”, para ficar com a expressão popular. Ele foi em cana por outra razão: acusado de fraudar o sistema de registro de vacinação do Ministério da Saúde. De lá veio a apreensão de seu celular e o restante é história.
Quando o renomado jurista Cezar Roberto Bitencourt assumiu sua defesa, ficou claro que a estratégia de Cid mudaria radicalmente. O próprio advogado deu a letra quando, em entrevista para a jornalista Camila Bomfim, afirmou que “Na verdade, ele é um militar, mas ele é um assessor. Assessor cumpre ordens do chefe. Assessor militar com muito mais razão. O civil pode até se desviar, mas o militar tem por formação essa obediência hierárquica. Então, alguém mandou, alguém determinou. Ele é só o assessor. Assessor faz o quê? Assessora, cumpre ordens”. As palavras fazem sentido.
Quem era o chefe de Cid? A quem ele assessorava? Quem lhe dava ordens? As perguntas de Bitencourt são, por óbvio, meramente retóricas, e é muito fácil deduzir qual é a resposta comum a todas elas. “O dinheiro era do Bolsonaro”, disse o advogado para a Veja, em referência aos valores obtidos com a venda dos objetos.
Concomitantemente ao agravamento do caso das joias, as coisas também se complicaram para Bolsonaro na CPMI do 8 de janeiro. Curiosamente, uma investigação que ele e seus apoiadores desejavam e defenderam ardorosamente. Imaginavam que, no seu curso, se daria o fim do governo Lula.
Na sessão de quinta-feira (17), o hacker Walter Delgatti Neto envolveu diretamente o ex-presidente numa suposta trama golpista. Dentre suas acusações está a de que lhe foi pedido para que criasse um código-fonte fake de maneira a mostrar que era possível trocar votos na urna eletrônica. Também afirmou que o ex-presidente lhe prometeu indulto, e que mandaria prender o juiz que o prendesse. Segundo o Delgatti Neto “eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes”, e que “ele (Bolsonaro) precisava que eu assumisse a autoria desse grampo”.
Ainda que gravíssimas, as falas do hacker ainda carecem de robusta comprovação. Antes de comparecer à CPMI, ele prestou depoimento na Polícia Federal, e esta sexta-feira (18) deverá retornar para uma nova oitiva. O que se sabe até aqui, e isso nem Bolsonaro nega, é que Delgatti Neto e ele efetivamente se encontraram.
Os aliados de Bolsonaro especialmente o senador Sergio Moro, se esforçaram em destacar o currículo de processos criminais que o hacker enfrenta. É evidente que não se trata de um sujeito probo e de reputação ilibada, e exatamente por isso sua relevância como testemunha. A estratégia de desmoraliza-lo, entretanto, apenas escancarou que tipo de gente era recebida para tratar com o presidente da República.
As duas situações caminham em paralelo e em ritmo acelerado de agravamento. No caso das joias, com uma possível delação de Mauro Cid no horizonte de curto prazo. Já na CPMI, todo um conjunto de acusações novas a partir do depoimento do hacker, o que pode levar também a novas linhas investigativas. Os últimos dias foram ruidosos e tonitruantes para Bolsonaro e seu entorno, que vão vendo as margens se estreitando por todos os lados numa tempestade perfeita. Ao fundo, o que se ouve não são os trovões, mas o badalar incessante de um pêndulo exclamando tic-tac, tic-tac, tic-tac.