Recém-lançado nos cinemas, o documentário “O presidente improvável” retrata Fernando Henrique Cardoso narrando sua história e seus oito anos de governo, incluindo as dificuldades que passou também pela oposição incessante de Lula e do PT, que, em suas palavras “votavam sistematicamente contra tudo”. O tudo a que se refere são a moeda, o conjunto de reformas do estado e mesmo os programas sociais. Em determinado momento, o grão-tucano relata seu encontro com Lula antes do lançamento do Real. Segundo o ex-mandatário, o líder petista compreendeu a ideia do plano econômico, e foi por isso que se posicionou contra. Não dá para caracterizar como moderado quem sempre colocou as ambições políticas na frente da agenda de desenvolvimento do país.

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O petismo investe no revisionismo histórico a partir da suspeição de Sergio Moro e da anulação dos casos envolvendo Lula. Usam as decisões do Supremo Tribunal Federal para negar a corrupção que aconteceu durante os mandatos presidenciais do partido. Ainda que o lavajatismo tenha debulhado o devido processo legal, inclusive levando à impunidade, o fato é que o estado foi assacado e empresas públicas instrumentalizadas para o objetivo último de converter a democracia em uma cleptocracia, para ficar com palavra usada pelo Ministro Gilmar Mendes. Ou alguém poderá dizer que Pedro Barusco e outros muitos delatores não desviaram somas incalculáveis de recursos do erário? Quem quiser constatar como essa gente lida com a institucionalidade pode ler o livro “A organização”, de Malu Gaspar. É didático.

Lula chegou ao Palácio do Planalto por uma carapaça de compostura arquitetada pelo publicitário Duda Mendonça de forma a apagar da memória nacional a imagem do sindicalista avesso a protocolos e que pregava a ruptura de contratos. Acabou funcionando, principalmente porque, do ponto de vista da conduta, o petista sempre foi um pragmático. Mas é erro confundir pragmatismo com compreensão do processo democrático. Essa suposta adesão nunca passou de instrumento para que, uma vez no poder, este fosse hegemonizado. Foi demonizando opositores e tentando se projetar como ente superior de razão da sociedade que o petismo pariu o ódio e a polarização política das quais o bolsonarismo também se alimenta para subsistir.

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Nos últimos dias, Lula tem deixado aflorar sua verve intolerante. Aquela que é mantida segregada por inúmeras camadas de propaganda. A um só tempo disparou contra a classe média, fez propaganda da liberação do aborto e instigou seus militantes para que abordassem em casa parlamentares eleitos e suas famílias. Com isso, não apenas furou a monopolização de Bolsonaro no campo das boçalidades como deu palanque para seu adversário, implodiu pontes com o eleitorado evangélico e criou um desgaste com os setores ao centro da coligação que ele busca construir com Geraldo Alckmin, político identificado com a ponderação e valores religiosos.

Líder em todas as pesquisas, o ex-presidente vinha faturando muito também por não ser cobrado e se manter em silêncio. Momentos como esses que ele protagonizou falando para convertidos serão devidamente explorados nas redes sociais. Do alto de sua arrogância, e do sentimento de muitos em seu entorno de que a disputa de 2022 já está ganha, Lula subestima o antipetismo adormecido, que pode servir como incentivador para um segmento inteiro da sociedade que não gosta de Bolsonaro, mas que pode acabar votando nele para evitar o retorno de um petista que se mostre raivoso, ameaçador, vingativo e truculento, mesmo que ele apareça falando para multidões usando relógio Piaget de R$ 80 mil.