| Foto: André Borges / EFE
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É evidente que nunca houve qualquer disposição do regime bolivariano de criar margem para deixar o poder pelo voto. O Acordo de Barbados, costurado pelo Brasil para viabilizar uma eleição séria no país, foi o sonho de uma noite de verão. Uma idealização deformada pela ideologia de quem ainda se nega a constatar que a Venezuela é, desde Hugo Chávez, uma ditadura. O texto foi rasgado quando a candidatura de Marina Corina Machado foi tornada ilegal por decisão do Conselho Nacional Eleitoral, um mero órgão do aparato bolivariano. Nicolás Maduro aproveitou a oportunidade concedida pela diplomacia brasileira para aprofundar o simulacro de democracia que usa para mascarar a opressão.

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Em um artigo anterior na Gazeta do Povo, escrevi que era errada a “percepção de que Maduro está isolado” no mundo. Isso porque “conta com o reconhecimento do eixo das autocracias, liderado pela China e pela Rússia”. É o que lhe basta. O efeito imediato dessa condição é o apequenamento do Brasil em sua condição de líder regional. Isso porque a continuidade do regime bolivariano agora independe da postura do Itamaraty, que, é verdade, ainda não reconheceu o resultado anunciado por Maduro, mas tampouco se posicionou de maneira mais firme em conjunto a outros países como Argentina, Chile e Uruguai. Com isso, o Brasil viu diminuir sua influência, ao passo que potências estrangeiras aumentaram.

A postura pusilânime de validar a votação mediante a divulgação das tais atas eleitorais virou o monotema aborrecido das manifestações de Lula e de seu assessor Celso Amorim. Uma condição que os próprios líderes bolivarianos já trataram de menosprezar e escarnecer. É uma possibilidade que ninguém mais leva minimamente à sério.

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A própria justiça da Venezuela, o braço togado do regime, já tratou de impor sigilo aos documentos. O que levou o presidente do Congresso Venezuelano até mesmo a ironizar a Amorim. “É importante dizer que a sentença do TSJ não é apenas na Venezuela, onde está a jurisdição superior da sala eleitoral, mas também no Brasil – ouviu, senhor Celso Amorim”, disse o bolivariano Jorge Rodríguez, presidente da Assembleia Nacional.

Os lacaios de Maduro criaram um breu informativo e, até o momento, não apresentaram uma única evidência auditável de que de fato venceu

Nesta sexta-feira (30), em entrevista para uma rádio da Paraíba, Lula voltou a tratar do tema Venezuela. “Eu não aceito nem a vitória dele e nem da oposição. Eu acho que tem um negócio, a oposição fala que ganhou, ele fala que ganhou, mas você não tem prova”, disse. É falso que ambos os lados apenas se anunciem vencedores sem apresentar nenhuma evidência. Desde a noite da eleição, a oposição apresentou milhares de atas digitalizadas. Estas foram submetidas ao escrutínio público internacional e foram tidas como verdadeiras por pesquisadores de diversos países, inclusive do Brasil. Bem diferente do que o regime bolivariano fez. Os lacaios de Maduro criaram um breu informativo e, até o momento, não apresentaram uma única evidência auditável de que de fato venceu. O que o mantém no poder não são as atas, mas os militares.

Segundo o jornal The Washington Post, 120 crianças e adolescentes foram presos nos últimos dias pelas forças de segurança da ditadura chavista. A ONG Foro Penal, que presta assistência jurídica gratuita para perseguidos políticos afirmou que ninguém teve acesso a advogado particular. A repressão tem aumentado diariamente desde o último dia 28 de julho, quando Maduro se intitulou vencedor da eleição. Na entrevista para rádio Paraibana, Lula disse que tem a consciência política de que tentou “ajudar muito, mas muito e muito”. Ajudou, pela covardia, a conceder o que Maduro mais desejava: tempo para fechar o cerco aos seus opositores e permanecer no poder.