Cheiro de sangue no ar. O repúdio óbvio à ideia de descriminalização do nazismo deu lugar a uma campanha persecutória com vistas a destruir a vida daqueles que a externaram: o youtuber Monark e o deputado federal Kim Kataguiri. Durante uma das edições do Flow Podcast, ambos argumentaram que a melhor forma de combater as ideologias odiosas é “jogando luz” sobre elas. Em meu último artigo na Gazeta do Povo, apontei a inconsequência dessa estratégia, e como a história mostrava o quão perigoso isso pode ser para a sociedade livre. De modo que é possível ser severo com ambos e com a defesa que fazem da liberdade de expressão irrestrita sem cair no linchamento social, como fizeram arrivistas e oportunistas de diversos matizes políticos.
Enquanto Monark perdia patrocinadores deixando o Podcast que ajudou a fundar, Kataguiri foi alvo de uma série de pedidos de cassação do seu mandato. Nas redes sociais, Eduardo Bolsonaro escreveu que havia “protocolando ofício para a Mesa Diretora da Câmara para que o presidente Arthur Lira (PP-AL) abra processo no Conselho de Ética contra as declarações em defesa do nazismo feitas pelo deputado Kim Kataguiri”. Já o deputado Reginaldo Lopes (MG), líder do PT na Câmara, postou que “o deputado Kim Kataguiri cometeu um crime, pois, se ele é contra a criminalização do nazismo, ele é a favor da liberação. É uma tese simples. A legislação brasileira trata o nazismo como crime”.
Qual é a moral de representantes do bolsonarismo e do lulopetismo para atuarem no episódio como exemplos de combate ao antissemitismo? Seus líderes, afinal, mantiveram encontros com políticos extremistas e até objetivamente negacionistas do holocausto.
Em julho de 2021, o presidente Jair Bolsonaro, dentre outros integrantes de seu governo, se encontrou com Beatriz von Storch, neta do ministro das finanças de Adolf Hitler e ela mesmo figura central do partido “Alternativa para Alemanha”, que chegou a constar em um relatório de mais de mil páginas do Ministério do Interior pelo Departamento de Proteção à Constituição pelo suposto vínculo de muitos de seus filiados e simpatizantes com grupos de ódio político. Na época, o Instituto Brasil-Israel condenou o encontro apontando que representava “um revés nos esforços de construção de uma memória coletiva do Holocausto e uma afronta à legra e ao espírito da Constituição democrática do Brasil”.
Quanto a Lula, basta lembrar que este, quando ocupava o Planalto, recebeu no Brasil o então presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad. O notório negacionista do holocausto, inimigo de Israel e dirigente de um regime financiador do terrorismo internacional foi abraço pelo líder petista, que o chamou “bom amigo”. Sem dúvida um dos momentos mais baixos da história da diplomacia brasileira, submetida ao devaneio ideológico antiamericano.
Ainda essa semana, o extremista de esquerda Rui Costa Pimenta, que é presidente do Partido da Causa Operária, comentou o caso Monark usando uma retórica semelhante a dos nazistas nos anos de 1930. Falou em “lobby judaico”, e até que usavam o holocausto para “encobrir qualquer tipo de picaretagem”. Curiosamente, o teor asqueroso de suas declarações não suscitou maiores reações.
Não se trata, por óbvio, de relativizar a gravidade do que foi dito por Monark ou por Kataguiri, e sim dar a devida perspectiva, principalmente diante de outras situações em que foram feitos atos objetivos em favor de extremistas e antissemitas ou declarações utilizando o repertório clássico de propagação do ódio contra o judaismo. Fica claro que há inequívoca hipocrisia de canceladores, tanto à direita quanto à esquerda. Eles operam para escolher deliberadamente os alvos a serem abatidos, ignorando outros que incorreram em condutas ainda mais condenáveis. Para esses, o combate ao antissemitismo é apenas seletivo.