As revelações do portal Metrópoles sobre o teor dos posicionamentos do coronel Ricardo Sant'Anna, indicado pelo Ministério da Defesa para integrar a Comissão de Fiscalização das Eleições, dão dimensão ao grau de contaminação ideológica a que setores das Forças Armadas estão submetidas. Em suas redes sociais, o oficial da ativa fazia proselitismo político, atacava candidatos (inclusive de forma pessoal), e, o mais grave de tudo, difundia informações falsas sobre o sistema de votação o qual ele tinha, como membro do órgão, a atribuição de zelar.
Dentre suas postagens, agora devidamente apagadas, o coronel compartilhou um vídeo em que se comparava o voto eletrônico com a compra de um bilhete de loteria. Só isso já deveria lhe valer a demissão da chefia da Divisão de Sistemas de Segurança e Cibernética da Informação do Exército. Não estamos a falar de qualquer tiozão de internet, mas de alguém formado no Instituto Militar de Engenharia.
No passado recente, Eduardo Pazuello, na época um general da ativa, não teve receio de subir num trio elétrico para fazer discurso eleitoral ao lado de Bolsonaro.
Já nessa segunda-feira (8), os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes encaminharam ofício ao Ministério da Defesa informando a pasta do afastamento do coronel de suas funções no Tribunal Superior Eleitoral. No documento, apontam que “conquanto partidos e agentes políticos tenham o direito de atuar como fiscais, a posição de avaliador da conformidade de sistemas e equipamentos não deve ser ocupada por aqueles que negam prima facie o sistema eleitoral brasileiro e circula desinformação a seu respeito”.
Um fiscal isento não pode se comportar como agente de desinformação. O Ministério da Defesa tentou se justificar informando que “já no fim de semana passado o Exército havia decidido selecionar um novo integrante para a equipe em substituição ao atual”. É de se perguntar se a pasta tinha conhecimento do teor das postagens do indivíduo quando o indiciou.
Militares têm limitações legais ao direito de externar opiniões. Não são, afinal, cidadãos comuns. O decreto 4.346, de 2002, estabelece quais condutas são passíveis de punição. O artigo 57 do Anexo I veta a possibilidade de manifestação político-partidária. O referido coronel infringiu descaradamente o dispositivo ao se comportar como um militante qualquer. Deveria ser punido também por indisciplina e transgressão do regulamento de suas funções. O problema é que o precedente não é positivo.
No passado recente, Eduardo Pazuello, na época um general da ativa, não teve receio de subir num trio elétrico para fazer discurso eleitoral ao lado de Bolsonaro. Ao invés de aplicar uma punição proporcional, o Alto Comando resolveu fazer vista grossa. Foi a pior sinalização possível para a tropa.
Sob o comando do também general da ativa Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, o Ministério da Defesa virou um triste esbirro do conspiracionismo e esteio de ideias aberrantes. Um verdadeiro quartel da desinformação sobre as eleições. Foi o titular da pasta quem, em uma sessão no Senado Federal, veio com a proposta atabalhoada e ilegal de fazer uma espécie de “votação alternativa”, como forma de auditar as urnas. Ignorava a votação paralela, que já existe, e a inviolabilidade do voto secreto.
A participação das Forças Armadas em cargos e funções civis começa a cobrar o seu preço. A conduta de tipos como o coronel Ricardo Sant'Anna mostra que não será nada barato.
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