Pablo Marçal foi ao debate do SBT disposto a lamber as feridas que ele mesmo se infligiu. Resolveu se “comportar” depois de constatar a rejeição crescente nas pesquisas e os indicadores de intenção de voto em queda. Sua estratégia de tumultuar, agredir e provocar sistematicamente seus adversários o fez conquistar rapidamente o eleitorado antiestablishment, mas também o isolou no radicalismo. É por isso que quando veio a cadeirada, não foi tomado como vítima. Pelo contrário. Ainda que repudiando a violência, muitos até se questionaram se não fariam o mesmo que Datena diante do que ex-coach dizia.
Vítima é quem não escolhe uma situação negativa. Marçal, pela própria postura, ajudou a materializar a agressão. Antes do tucano lhe desferir o golpe, o chamou de “arregão”, disse que “não é homem” e ainda o instigou com um “vai”. Alguém poderá dizer que ao político cabe o “sangue frio”, e que isso “faz parte do jogo”. É o mesmo que legitimar tal comportamento e tomar como aceitável o que não é.
O debate eleitoral não pode ser um picadeiro para que arrivistas tumultuem ou busquem inviabilizar a discussão democrática
Ao longo de debates anteriores, Marçal farejava sangue, buscando o concorrente que pudesse lhe dar o frame definitivo. Ficou no quase com Guilherme Boulos. Mas, quando finalmente conseguiu o que queria, já havia passado tanto do ponto que o meme resultante se voltou contra ele.
Após a cadeirada, já dentro da ambulância que o levou ao hospital para fazer avaliação médica, tentou mostrar que estava em estado grave. O vídeo tremido mostrava a movimentação frenética dos enfermeiros e Marçal recebendo oxigênio. Como se corresse risco de vida. Chegou até a se comparar com Donald Trump e Jair Bolsonaro, ambos vítimas de atentados. Não convenceu.
A pergunta é se alguém se convencerá ou ficará cativado com o que ele definiu no SBT como “sua melhor versão”. Isolado pelos adversários, tentou se reapresentar. “As pessoas querem saber a sua pior versão e a sua melhor. A minha pior eu já mostrei nos debates. A partir de agora você vai ver alguém que tem postura de governante”, disse de forma acanhada. Ao tentar ser mais “propositivo”, só conseguiu enfileirar platitudes e propostas rasteiras. Talvez não haja uma “melhor versão” de Pablo Marçal. Talvez o que haja seja outra versão, também ruim, mas por outros motivos.
Tipos como Marçal tendem a se tornar cada vez mais comuns na era da política disruptiva. É por isso que os veículos de comunicação precisam refletir sobre seu papel no debate público em períodos eleitorais. Marçal só se “comportou” pela circunstância política que se tornou adversa. Mantida a “pior versão”, poderia facilmente ter achincalhado o debate, como conseguiu nos encontros promovidos pelo Estadão, TV Cultura e Rede TV!
Na Rede TV!, por exemplo, o ex-coach entrou disposto a não cumprir qualquer regra acordada previamente. Transformou o primeiro bloco numa sucessão de direitos de resposta que resultaram numa gritaria generalizada. Não havia obrigatoriedade para que estivesse ali. É bem verdade, sua participação está vinculada também a busca de audiência. É aí que cabe uma necessária reavaliação desse espaço.
O debate eleitoral não pode ser um picadeiro para que arrivistas tumultuem ou busquem inviabilizar a discussão democrática. Tampouco as emissoras devem aguardar até o momento em que os candidatos escolham se comportar. As regras precisam ser endurecidas e a moderação precisa ser mais ativa. Ou se age preventivamente ou, pela omissão, se estará contribuindo para o achincalhe da eleição.
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