A delação premiada de Mauro Cid não é mais o único testemunho direto de um membro do círculo íntimo de poder a relatar a tramoia golpista que se desenhava no Palácio do Planalto no curso de 2022. O depoimento do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro abriu uma verdadeira caixa de Pandora, na medida em que outros que personagens relevantes citados por ele passaram a corroborá-lo, inclusive das próprias Forças Armadas. As declarações mais relevantes e graves são as do general Freire Gomes, ninguém menos do que o então comandante do Exército.
Em sua coluna em O Globo, Bela Megale trás detalhes do que disse o militar para a Polícia Federal em depoimento extenso que levou cerca de 7 horas. Segundo a jornalista, Freire Gomes, que foi citado na delação de Cid, afirmou que Bolsonaro apresentou ao menos três versões diferentes de minutas com ações que poderiam levar a uma ruptura da ordem democrática. A insistência em discutir o assunto e tomar uma medida extrema, levou o general a advertir o então presidente com uma possível ordem de prisão.
Fica cada vez mais evidente, com os detalhes revelados no aprofundamento das investigações, que a tal minuta não era um documento banal entregue fortuitamente.
Na manifestação do dia 25 de fevereiro, Bolsonaro admitiu a existência da minuta. “Agora o golpe é porque tem uma minuta de um decreto de Estado de Defesa. Golpe usando a Constituição? Tenham santa paciência”, disse para os apoiadores. Ainda que ele tenha buscado relativizá-la como um ato legítimo da Presidência, sua a defesa foi a campo para tentar contornar o que poderia agravar sua situação na Justiça. “Declaração do presidente foi em cima da minuta que ele só teve conhecimento em outubro de 2023. Não reforça em nada a investigação, porque foi a primeira minuta que ele viu. Não tinha visto antes”, declarou seu advogado para a Folha de São Paulo. Tanto da delação de Cid quanto o depoimento do general Freire Gomes contradizem essa versão.
Os defensores da tese dos “atos preparatórios” acham que tudo isso não passou de abstração. Que um presidente pode sair a reunir generais para estudar o que fazer com as instituições, confabular meios para depor integrantes de outros poderes e até prendê-los, usar ardis jurídicos de forma a legitimar sua permanência no poder ou anular na canetada o resultado da eleição.
Ainda que o Estado de Defesa, a Garantia da Lei e da Ordem e o Estado de Sítio sejam institutos jurídicos, todos têm regras de aplicação. A existência deles prevista na Constituição não é salvo-conduto para o uso indevido. A minuta identificada na casa de Torres era uma excrescência legal que colocava o Poder Judiciário sob as ordens dos militares.
Fica cada vez mais evidente, com os detalhes revelados no aprofundamento das investigações, que a tal minuta não era um documento banal entregue fortuitamente e separado para o descarte, como alegou a defesa do ex-ministro da Justiça. Sua materialização foi elaborada minuciosamente, inclusive em reuniões com a presença de membros da alta cúpula das Forças Armadas. Só não foi editado por falta de apoio da Aeronáutica e, mais importante, do Exército. Mas não faltou gente a buscar, por todos os meios, uma forma de viabilizá-lo na prática. É a palavra do general.
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