Ao contrário do que dizem os bolsonaristas, Sergio Moro jamais traiu Jair Bolsonaro. Afinal de contas, foi, em boa medida, o trabalho do responsável pela 13° vara federal de Curitiba quem criou as condições para que o atual presidente chegasse ao poder. A devassa promovida pela Lava Jato no sistema político abriu caminho para que um parlamentar do baixo clero no Congresso Nacional se tornasse competitivo e conseguisse capitalizar em cima do antipetismo e da ausência de Lula na disputa. O sentimento antiestablishment que pautou a eleição de 2018 é muito mais relativo a Moro do que a Bolsonaro, que dele se revelou apenas o infiel depositário beneficiado pelas circunstâncias. É exatamente na reedição desse clima que se fia a pretensão eleitoral do nome mais importante da operação Lava Jato.
O ex-juiz que agora se faz filiado ao Podemos, legenda que se apresenta como de oposição, mas que orbita o governismo. E isso ficou patente na votação da PEC dos Precatórios, com parte considerável de seus parlamentares apoiando o texto caloteiro e fiscalmente irresponsável. Alias, importante destacar que, no evento em que Moro foi apresentado, estavam perfilados ao seu lado os senadores Eduardo Girão e Marcos do Val, destemidos defensores de Bolsonaro na CPI da Covid. Longe da toga, e do distanciamento das partes, ele terá agora de responder também pela postura e atos de seus colegas de partido.
Em seu primeiro discurso já como pré-candidato, Moro tentou ir além da pauta da corrupção. Há, afinal, dúvidas razoáveis sobre o que pensa sobre uma miríade de assuntos. Alguém que pretenda disputar o Planalto precisa ter uma ideia de país, bem como uma agenda. Terá de falar consistentemente sobre inflação, infraestrutura, relações exteriores, meio ambiente, saúde, gasto público, dentre outros. E não poderá se resumir a frases de efeito.
Da mesma forma, terá de dizer como pretende governar. Chegar ao poder é mais fácil do que exercê-lo, e o próprio Bolsonaro poderá lhe dizer algo a respeito. Como irá compor maioria para fazer passar projetos que, nos bastidores do poder, são universalmente rejeitados? Governará com quem? Sim, sabemos que pretende institucionalizar a Lava Jato. Mas de que forma? Sua experiência como Ministro da Justiça foi um desastre. Não conseguiu fazer articulação, e seus projetos fracassaram rotundamente no Congresso Nacional. Alguém poderá dizer que “fora boicotado”, mas isso seria repetir a desculpa usada reiteradamente pelo bolsonarismo como forma de justificar os problemas do atual governo. E, ademais, o suposto boicote poderia ser interpretado como rejeição no meio político no qual agora Moro quer um espaço de protagonismo.
Por ora, o que Moro tem é a esperança do simbolismo. Mas será que o que ele pretende representar é de todo positivo? O tom de sua manifestação no evento do Podemos atualiza a beligerância contra a política e a necessidade de combater o “sistema”. Já vimos isso na boca de Bolsonaro, e deu no que deu. Nas redes sociais, a reação de seus apoiadores foi passional.
Em meu Twitter, cheguei a escrever que ele não representava a 3° via, mas a 2° via do bolsonarismo. Seus apoiadores me responderam com a fúria típica dos fanáticos. Não comparava, por óbvio, os personagens, muito menos suas respectivas histórias. Não são, afinal de contas, pessoas com a mesma trajetória de vida. Mas parece inegável, e esse era meu ponto, que ambos mobilizam a mesma e perigosa ideia de salvação da pátria, de líder ungido, de homem infalível. O messianismo toga é tão deletério quanto o de farda.
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