Guilherme Boulos chamou todo o país às ruas. Ninguém foi. Esse rapaz é um sucesso em fracassar. Melhor dizendo: alguns foram. Foram os que sempre vão, desde quando as caravelas de Cabral aportaram no sul da Bahia. Num país de funcionários públicos, cartórios, sindicalistas e políticos de baixa extração, qualquer greve terá seu quórum mínimo, qualquer desocupado terá seu comitê. Tudo pela causa que nunca se sabe ao certo qual é.
A convocada paralisação não paralisou de verdade nem o centro comercial de Carapicuíba. Aqui e ali os atos de cidadania já costumeiros: pneus queimados, gente no hospital, palavras de ordem, bloqueios, burrice, corre-corre, pedradas, sofismas, destruição de patrimônio público e privado, depredação de discurso público e privado. É o que os saudosos do stalinismo-como-ideia têm a oferecer como alternativa a Bolsonaro.
O fato é que o discurso lulopetista se desencaixou de vez da realidade. Enquanto aquela primeira manifestação (alegadamente “pela educação”; dia 15) foi digna de nota, a segunda (dia 30) já patinou em meio ao lodaçal de pautas exóticas e dificilmente justificáveis; esta última (dia 14) restou como tiro de misericórdia no que sugeria o nascimento de alguma oposição organizada. Assim parece. Bem-feito.
Não que o lulopetismo tenha morrido; ele sobrevive por ressentimento. E há versões genéricas, derivativas, à disposição de quem sai da aula de história e chega agora ao passado. O que parece ter enfraquecido é seu poder de encantar, de enganar, de arregimentar as massas. Eles não têm o que dizer, nem o que oferecer. Daí a vitória de Bolsonaro nas urnas, apesar de todas as opções; daí sua vitória nas ruas, apesar de todos os pesares.
O curioso é que há, sim, motivos para reclamar. Eu reclamo à beça. O que não há é quem reclame direito, lá na margem esquerda. Se, aliás, fossem espertos, ficariam quietos e deixariam que o governo tropeçasse nas próprias pernas, como faz com frequência. A oposição mais efetiva a Bolsonaro, por enquanto, tem sido a própria situação de Bolsonaro.
De fora do governo, registre-se, quem tenta debater com algum juízo é a direita liberal, democrática, afeita a hábitos civilizados e pluralistas, que preferiu não se fundir nem se confundir com a frente mais reacionária que ascendeu ao poder. É daquela direita, não da esquerda, que virá, se vier, a discussão coerente em tempos tão incoerentes.