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por Nicolau Olivieri
Espero que não seja tarde demais para voltar a Breaking Bad: a história de Walter White, o homem inteligente, porém medíocre e frustrado, que diante da notícia de que tinha um câncer incurável – diante do abismo, da morte – abre mão do Céu (Skyler, nome de sua mulher), do Sagrado (Holly, nome de sua filha) e da Pureza (Walt Jr, seu filho) em troca de dinheiro, e com o pretexto de que queria ajudar justamente aqueles para quem mentia.
Breaking Bad é a trajetória do homem que, pelo pacto demoníaco que fez nos desertos do Novo México – o diabo parece gostar muito de desertos... – negou tudo que era sua própria realidade: família, rotina, profissão e até mesmo o carro especialmente feioso que, ora, também fazia parte da sua vida. Converteu-se à mentira. Converteu-se em Heisenberg, o mago da metanfetamina, o temido gângster que, agora, dirige um belo Chrysler.
O caminho que faz Walter White se transformar em Heisenberg é a descida degrau-a-degrau ao inferno, em cujo caminho o protagonista conheceu e destruiu demônios (Tuco, Gus Fringg), mas também enterrou anjos (Andrea, Hank).
No final, descobrimos que o nome do meio de Walter White é “Heartwell”, e ele próprio, destruído, sozinho e desfigurado, confessa aos Céus que tudo o que fez não foi para salvar sua família – foi porque ele gostava, foi porque ser o mago da metanfetamina o fazia se sentir “vivo”.
Walter Hartwell White quis enganar a morte, o câncer e a própria vida, sentindo-se vivo como Heisenberg. Mas a ninguém é dado enganar o Hades. Não há como trapacear o Absoluto.
Breaking Bad é a odisseia do homem que renega sua realidade, cujo valor e beleza ele só descobre quando destrói. Não haverá redenção para Walter Heartwell White, nem mesmo quando, no ato de heroísmo final, ele mata os últimos demônios (que ele próprio havia invocado) e salva Jesse do Inferno.
Walter White é o que qualquer um de nós pode ser – se fizer as escolhas erradas.
Nicolau Olivieri é sócio na Leal Cotrim Jansen Advogados. Membro do Instituto de Advogados Brasileiros.