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Gustavo Nogy

Gustavo Nogy

Entrevista com Alexandre Schwartsman

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Alexandre Schwartsman formou-se em Administração pela Fundação Getúlio Vargas. Mestre em Economia pela Universidade de São Paulo e doutor em Economia pela Universidade da Califórnia em Berkeley. Foi diretor de assuntos internacionais do Banco Central e economista-chefe dos bancos ABN Amro e Santander. Hoje, lidera a consultoria econômica Schwartsman & Associados.

1 Por um momento, esqueçamos da crise provocada pelo coronavírus. A condução da política econômica até aqui lhe parecia boa, ruim, aquém ou além das expectavas (que foram altas) criadas durante a campanha?

Há altos e baixos. A reforma da previdência certamente foi um ponto alto, mas a incapacidade de estabelecer as prioridades em seguida custou muito caro, ainda mais agora. Em que pese a relativa rapidez de envio das PECs fiscais (emergência, pacto federativo e fundos), não houve nenhum esforço concreto de facilitar sua aprovação, algo na linha “já fizemos nossa parte, agora façam a sua”. Funcionou no caso da previdenciária, onde o debate vinha desde 2016, mas certamente não foi o caso agora.

Não conseguiram formular uma reforma tributária e ainda atrapalharam o processo que o Congresso vinha conduzindo e, no caso da administrativa, ficou para a “próxima quinta-feira”.

É bem verdade que o crescimento do PIB no ano passado subestima, em alguma medida, a recuperação: depois do primeiro trimestre, quando a economia ficou parada, o produto aumentou ao ritmo de pouco mais de 2% ao ano (2,2%), ainda longe de espetacular e muito ancorado na expansão do consumo. Em conjunto com o juro mais baixo isso sinalizava a possiblidade concreta de crescimento superior a 2% em 2020 (antes da crise, óbvio!), mas ainda pouco.

O que me ficou claro ao longo do caminho foi a falta de preparo do ministro. Sabíamos que afirmações sobre “zerar o déficit em um ano”, “privatizar R$ 1 trilhão” não faziam sentido; o surpreendente é que ele parecia de fato acreditar nestas estórias...

Do ponto de vista de reformas micro também se falou muito e pouco se fez.

2 A vocação para o conflito político dá o tom do primeiro ano, assim entendo, e isso tem atrapalhado a agenda de reformas. Depois da Previdência, quais seriam os próximos e decisivos passos para que o Brasil retomasse, em condições normais, o crescimento mais do que medíocre dos últimos anos?

A prioridade zero teria que ser a PEC emergencial, que dotaria estados (e o governo federal) de condições para controlar gastos obrigatórios. Obviamente, em retrospecto, não ajudaria em nada a atual situação (nada parece capaz de ajudar), mas indicaria uma trajetória mais saudável do gasto nos próximos anos, mais espaço para o investimento público, que, diga-se, foi sacrificado nos últimos anos, mas não no altar do “teto de gastos” e sim no dispêndio com o funcionalismo.

3 A oposição parece desnorteada e, como se refletisse o governo que ela tanto abomina, carece de propostas e racionalidade, e tende a desabar no populismo irresponsável à esquerda, para quem mais gasto público e descontrole fiscal continuam em pauta. Alguém, entre os que não estão no governo, propõe alternativas inteligentes?

Sim, os suspeitos de sempre. O Armínio, o Carlinhos Góes, o Pedro Nery. Uma mistura de rede de proteção social agora (para o período de paralisia), forte expansão do crédito, juro mais baixo (zero, se for necessário).

4 Desgraça pouca é bobagem, temos uma histórica pandemia com a qual lidar. Do ponto de vista econômico, paralisar o país por quatro, cinco meses, produzirá efeitos devastadores. Mas a opção está longe de ser das mais populares. Perguntaria Lenin: “Que fazer?” Vale exercício de achismo.

Se vale o “achismo”, perdemos há semanas qualquer alternativa que não seja o lockdown para evitar que a pandemia sobrepuje nossa capacidade de tratamento (aliás, podemos ter perdido esta alternativa também). Também não acho que haja uma troca entre preservar a economia e preservar a saúde. Se escolhermos preservar a economia os efeitos da pandemia poderão nos forçar a um lockdown ainda mais severo à frente (como dizia Churchill, entre a guerra e a desonra escolheram a desonra e terão a guerra).

Agora é partir para o lockdown, desenhar programas de apoio a desempregados (formais e informais), programas agressivos de créditos a empresas para ajudar a aguentar os meses à frente. Custo fiscal desconhecido, mas certamente elevado, ou seja, a dívida – que rodava a 80% do PIB – pode ir buscar algo acima de 90%, ou mesmo perto de 100%. Quando sairmos da crise, a questão fiscal se agravará.

5 As medidas econômicas que Paulo Guedes e sua equipe tomaram são boas para o momento?

Insuficientes. Antecipação de gasto para aposentados e (via abono) trabalhadores formais não focam no principal problema. Quanto ao auxílio para os informais e conta própria me parece pouco. Agora é guerra: vamos usar a munição que temos e descobrir lá na frente como pagar a conta.

6 Por fim: essa crise deixará como lição que o caminho viável é mesmo uma espécie de radicalidade de centro? Ou seja: liberdade econômica, sim, porque o mundo depende da produção capitalista; mas também Estado liberal-social –, eficiente e contido – para proteger os mais frágeis e responder a urgências imprevistas como essa?

Espero que sim, mas não contaria com isso. Não sei que mundo emergirá da crise: sei que diferente, mas se melhor ou pior do que estava permanece uma incógnita. Desconfio que o sucesso relativo da China na contenção da pandemia (depois da pisada inicial na bola) vai reforçar tendências mais autoritárias (pode jogar Singapura – nem de longe tão autoritária como a China, mas não é um modelo de democracia – no bolo). Taiwan e Coreia são exemplos de democracias até agora razoavelmente bem-sucedidas, mas tenho cá minhas dúvidas se serão vistas como exemplos a seguir.

As democracias ocidentais lidaram mal com a crise, mais por incompetência, quero crer, do que por falha de desenho, mas vá explicar isso... Temo um mundo mais fechado, mais nacionalista e xenófobo e com mais concentração de poderes no topo. Não é onde gostaria de viver...

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