O Brasil não precisa de comentaristas políticos. Carecemos de críticos literários e hermeneutas, filólogos e linguistas, que trabalhem em regime integral, alternem turnos, labutem aos domingos e feriados. Precisamos de gente equipada com os mais avançados instrumentos intelectuais para dar conta das declarações do presidente e de alguns de seus ministros. Ernesto Araújo anda quieto; Abraham Weintraub já entreguei a Deus.
Porque, vejam bem, o nosso Excelentíssimo nunca diz o que diz. A depender da repercussão geral de seus pronunciamentos, tanto os mais formais quanto os muito espontâneos, ele confirma o que disse, desconfirma o que disse, finge que não disse o que disse ou jura ter dito o que nunca dissera.
Tudo pode ser, tudo pode não ser, ou nem uma coisa nem outra, ou as duas coisas juntas. Eu acreditava que, depois das metáforas futebolísticas do Lula, o estado da arte em matéria de dizer nada-com-nada tivesse sido atingido com Dilma Rousseff. Fomos surpreendidos novamente.
A floresta Amazônica arde? Mentira, não arde. Isso são desinformações da imprensa que só quer prejudicar a imagem do país. “Mas presidente, alguma coisa tem queimado lá pros lados onde moram os paraíbas!” Pois se tem alguma coisa queimando lá, então a culpa é das ongs. Ou não tem nada, nem a culpa é minha; ou tem alguma coisa, e a culpa é dos outros.
Essa é, em linhas gerais, a rotina. Um presidente que fala diretamente ao povo, com o povo, através do povo, sem as mediações aborrecidas da imprensa – que é sempre excessiva, como sabemos, e costuma atrapalhar. Mesmo assim, ele não se faz entender.
Eu compreendo, com sorte, metade dos discursos presidenciais. O que também não é problema, porque não há nada a ser compreendido: tudo tem de ser interpretado a favor dos seus propósitos e das suas intenções, dos seus humores e das suas implicâncias, das suas projeções e dos seus revisionismos, que nunca se sabe quais são, de onde vêm, aonde vão.