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Lula e a crônica de uma queda anunciada

Lula foi preso e muito em breve será solto. É provável que um grande acordo esteja sendo tramado neste momento, ou em algum momento nos próximos meses, o que não seria de surpreender. Esperamos por isso, quase conformados. Entretanto, comemorar sua prisão por alguns instantes é compreensível e é legítimo.

Há trinta anos ele embaralha, corta e distribui as cartas na política nacional. Sob sua barba, em dois mandatos, um esquema de corrupção de proporções nunca vistas nasceu, alastrou-se e se consolidou. Enquanto as contas públicas sangravam ele andava de lá pra cá com a petulância de um faraó.

A cúpula do PT caiu e ele se manteve firme. Para sobreviver, cortaram na carne e a carne não era sua. Sua arrogância cresceu. Indicou sua sucessora, de incompetência exemplar, a corrupção se ramificou ainda mais, as contas explodiram, a economia encolheu e o país virou um puxadinho do Partido dos Trabalhadores, dos partidos que a ele se uniram e das empreiteiras.

Nem por um momento, nem por um segundo, Lula recuou. Ao contrário: dobrou a aposta. Como se a consciência moral de homem público lhe faltasse ou lhe fosse desconhecida. Mesmo investigado, julgado e condenado, fez pouco caso do sistema judiciário, da impaciência popular e da imprensa.

Intoxicado pelo poder, envenenado pela própria língua, bêbado de si mesmo, Lula já se comparou a Jesus Cristo, a Gandhi, a Mandela e a Martin Luther King; já disse admirar a “força” de Hitler e garantiu ao Papa ser livre de pecado; fez ameaças, concedeu perdão, jurou calar a imprensa, invocou o diabo, exigiu que lhe beijassem os pés, incitou a violência, pregou a paz. Algoz e vítima, carrasco e mártir – a um só tempo.

O regozijo com sua prisão não é a delícia da vingança, a “banalidade do mal”, o sacrifício do bode expiatório. O regozijo com sua prisão é apenas uma espécie de desabafo, de relaxamento dos músculos da paciência, de euforia provocada pelo cansaço extremo. Homens públicos deveriam se portar com a magnanimidade que se espera deles – principalmente quando erram, ou quando sob seu governo se erra. São, em tese, servidores. São, em tese, representantes do povo.

Mas Lula nunca se viu como homem público. Nunca se quis assim. Lula sempre foi o homem privado, de interesses privados, de acordos privados, que usou e abusou da credulidade pública em seu próprio benefício. Ele só representa a si mesmo há trinta anos, e “democracia” é o nome que ele sempre deu para os arranjos em que sua vontade prevalece. Lula esculpiu, com a matéria-prima de um gigantesco e gorduroso ego, sua própria Bastilha. Porém se esqueceu de que, cedo ou tarde, a história dá voltas – e toda Bastilha cai.

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