A tight spot - Vallotton, Félix (OBI)| Foto:

Antônio Palocci, ex-ministro e homem forte do governo Lula, afirmou nas negociações para a delação do fim do mundo (de novo) que a campanha presidencial de Lula recebeu cerca de um milhão de dólares de Muamar Kadafi, quando vivo e ditador da Líbia. Contribuição off the record, naturalmente.

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Advogados e discípulos de Lula desqualificam o depoimento de Palocci, o que é esperado. Advogados são pagos para isso. Discípulos são fanáticos por isso. A se considerar, no entanto, a aproximação de Lula com figuras como Kadafi, não há por que duvidar de nada. Ao contrário: vindo dele eu acredito em tudo. Até na verdade.

Não que seja coisa somente de Lula: Jair Bolsonaro, fina flor do estatismo militar brasileiro, que de sonhos intranquilos acordou subitamente metamorfoseado numa barata (Nabokov garante que é besouro) liberal, teve resgatada uma entrevista de 1999, ao Estadão; nela faz elogios mais do que convictos ao então “presidente” Hugo Chávez. Muitos dirão: isso foi em 1999 e Hugo ainda não era o Chávez que viemos a conhecer. Para meu gosto, desculpinha esfarrapada. Explico.

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Primeiro porque 1999 não é exatamente outra época. Segundo porque Chávez nunca se apresentou como homem de ideias arejadas e democráticas. Terceiro porque Bolsonaro cuida de elogiar não somente o ser-em-si venezuelano, mas, and I quote, “Chávez é uma esperança para a América Latina e gostaria muito que esta filosofia chegasse ao Brasil. Acho ele ímpar. Pretendo ir à Venezuela e tentar conhecê-lo. Quero passar uma semana por lá e ver se consigo uma audiência. (…) Acho que ele vai fazer o que os militares fizeram no Brasil em 1964, com muito mais força. (…) Ele não é anticomunista e também não sou. Na verdade, não tem nada mais próximo do comunismo do que o meio militar”.

Ao Antagonista, preocupado com a repercussão negativa, explicou-se (tentou): “Ora, 90% do povo venezuelano vibrou com a eleição de Chávez, assim como o Brasil vibrou com Lula. Eu gostei de ver um coronel paraquedista no governo. Seu discurso era outro. A gente se ilude com as pessoas”. Conversa para boi e eleitor (não necessariamente nessa ordem) dormirem.

Uma pessoa pode mudar e se tornar outra coisa; pior, melhor. Mas uma filosofia é uma filosofia é uma filosofia. Se Bolsonaro gostava da, aspas, filosofia de Chávez, não há desculpas; se Bolsonaro afirma que, “na verdade, não tem nada mais próximo do comunismo do que o meio militar”, e eu concordo com o pré-candidato, não há escusas. Hugo Chávez pode ter mudado. Jair Bolsonaro não mudou.

Eu estava falando de Lula e vim parar no Bolsonaro. Coisa de gente embriagada, talvez, mas a verdade é que, falando de Lula e pegando a viela do autoritarismo, cheguei aonde cheguei. Que me perdoem a associação de ideias, mas o autoritarismo de um me levou ao outro, sabem como é.

Ainda sobre Lula, esse tipo de simpatia por Kadafi (e pelo dinheiro líbio) não consiste, sabemos, num ponto fora da curva: é a própria curva. Lula sempre morreu de amores por quem quer que matasse cobras e mostrasse paus: de Fidel Castro a Che Guevara; de Kadafi a Hitler (entrevista à Playboy em 1979; procurem).

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Ah, essas entrevistas!