Meghan Markle (AFP PHOTO / Oli SCARFF)| Foto:

O noivado do príncipe Harry tem causado comoção mundo afora. Essa família real é mesmo uma brasa, mora? A comoção não se deve a ele, que é mais sem graça que banho de mangueira em dia de temporal, mas à sua noiva, a bela atriz Meghan Markle, do seriado Suits (recomendo).

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Vamos às apresentações: Meghan Markle é atriz, americana, divorciada; não bastasse, como tem uma gotinha de sangue preto, é preta (de acordo com os americanos, que são meio tarados por isso). Pois ela decidiu se aposentar e virar princesa: vai se casar com Harry; se nada der errado, se a opinião pública permitir, viverão felizes para sempre. Em tempo: ela também é (se diz) feminista.

Ninguém se casa impunemente hoje em dia. Você escolhe o cônjuge e, se for “pessoa pública”, tem de pedir em casamento também o coletivo, o agrupamento, o comício, o sindicato, a classe, o partido. Se calhar, tem de ir para a cama com os seguidores – retifico: perseguidores – das redes sociais e os colaboradores da organização.

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De um lado, há descontentamento com a escolha: ela é sexy demais, preta demais, plebeia demais, americana demais, divorciada demais. Que vergonha. De outro, há contentamento com a escolha: ela é sexy, preta, plebeia, americana, divorciada – e isso é bom demais! Como se fosse uma espécie de escolha étnica, multicultural e politicamente correta. Quase a encarnação do Zeitgeist.

Case-se com um barulho desses.

Outros (outras) ironizam o feminismo soft da atriz. Como é que se larga uma vida como a dela para viver uma vida como a dele? Meghan Markle deixou de ser mulher para ser mulherzinha. Ela pode tudo, desde que tudo esteja de acordo com a agenda mais ortodoxa; tudo é permitido, mas nem tudo convém à causa.

Feministas são mais severas que o apóstolo Paulo quando ficava todo pistola com os hereges. A mulher é livre para divorciar, não para casar; é livre para fazer carreira, não para cansar-se da carreira e fazer outra coisa; é livre para odiar os homens, não para amá-los; é livre para deixar crescer pelos, não para raspá-los. É livre para vestir azul; nunca para vestir rosa.

Esse é o beco sem saída de que fala muitas vezes a insuspeita Camille Paglia: obedecer aos desejos e anseios dos homens é ruim? Pois obedecer aos desejos e anseios de outras mulheres abstratas, coletivas, sindicalizadas e agrupadas não parece muito melhor.

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Millôr Fernandes dizia o seguinte: “Não gosto da direita porque ela é de direita, e não gosto da esquerda porque ela é de direita”. Com a devida vênia, parafraseio o mestre: não gosto do machismo porque ele é machista, e não gosto do feminismo porque ele é machista. Afinal de contas, Meghan Markle tem de ser livre até mesmo para cometer o absurdo de se casar com um príncipe. E ambos viverem felizes para sempre.