GUILHERME MACALOSSI é formado em direito pela UCS e estudou jornalismo na Unisinos. É apresentador do programa Confronto, na Rádio Sonora FM, colunista do portal Lócus. Foi editor do portal Sul Connection. Escreve para jornais locais, além de já ter colaborado com textos para o Instituto Liberal do Rio de Janeiro e para o site Senso Incomum. Foi redator na agência Critério, Inteligência em Conteúdo.
1 Às vezes parece que o jornalismo já morreu e se esqueceram de enterrar; o jornalismo tem futuro?
Tem, desde que longe do palanque. Tem, desde que sem ser militante. Há um monte de jornalistas palanqueiros por aí e um número ainda maior de jornalistas militantes. Que se faça a distinção entre ambos: o jornalista palanqueiro é aquele que tem uma pauta política pré-definida, que está no meio de comunicação como esbirro de terceiros e cuja opinião é condicionada ao soldo que lhe é pago por estes; já o jornalista militante é o ativista de redação, o sujeitinho bem comportado que não está muito interessado em noticiar e em relatar fatos, mas sim em problematizar, em buscar a falsa polêmica com base nos estereótipos politicamente corretos.
É importante que jornalistas tenham opiniões e as deixem claras para o público, mas isso deve ser exercido dentro de parâmetros que não excluam a necessidade básica de prestar informação fidedigna. O jornalismo palanqueiro e o jornalismo militante arruínam essa premissa.
Um caso recente de jornalismo militante que pode ser trazido como exemplo para o leitor é da entrevista que o apresentador Danilo Gentili deu para um jornalista da Folha de S.Paulo. O repórter da Folha não entrevistou Danilo para falar do filme, mas para submeter a obra ao escrutínio crítico das minorias organizadas das quais ele se imaginava um porta-voz. Não houve uma única pergunta referente ao roteiro ou ao processo de produção, só provocações sobre o conteúdo social que a obra deveria ter. Que raio de jornalismo é esse? Com razão, o sujeito acabou demitido. Veja só: até para os padrões da Folha ele foi longe demais. Na época, lembro-me de ter escrito que não devíamos nos preocupar com o tal repórter, pois ele teria um futuro glorioso em algum Catraca Livre da vida.
2 Você tem um pé no mundo antediluviano do rádio e outro no universo dos blogs e das redes sociais: como percebe a relação de forças entre o mainstream e o alternativo?
Há uma guerra aberta entre essas duas vertentes de jornalismo. O mainstream aposta no amassamento dos veículos menores como forma de continuar seus predomínio no mundo das notícias e da informação. Para isso, tenta categorizar toda mídia alternativa como duvidosa, pouco confiável e falaciosa. Ainda que muitos veículos pequenos sejam de fato duvidosos, pouco confiáveis e falaciosos, há um excelente trabalho sendo prestado por novos portais de informações e blogs. Dia desses, Gilberto Dimenstein, do já mencionado Catraca Livre, resolveu montar uma lista de sites que divulgariam “fake news” e participariam de uma rede conspiratória que teria o MBL (Movimento Brasil Livre) como órgão diretor. A coisa não fazia o menor sentido e muitos profissionais sérios que atuam em vários dos sites listados acabaram sendo expostos sem razão, apenas porque Dimenstein não suporta a linha editorial que seguem.
Da mesma maneira, é errado o jornalismo alternativo considerar o mainstream como puramente interesseiro e enganoso. O sonho de todo jornalista alternativo é ser jornalista mainstream. O sujeito que, lá do site onde é lido apenas por sua mãe e sua tia, e às vezes nem mesmo pela tia, critica um colunista da Folha de S.Paulo, do Estadão ou da própria Gazeta do Povo, adoraria ter espaço em um desses veículos.
A relação correta e saudável entre o jornalismo mainstream e o jornalismo alternativo se dá com a verificação honesta das informações que ambos apresentam, sabendo separar o que presta e o que não presta. Um deve fiscalizar o outro, mas sempre com responsabilidade.
3 No ecossistema das “fake news” há o Tiozão do Caps Lock e o Maconheiro da FFLCH; um pede coturno, outro pede THC: jornalista bom tem de contrariar todo mundo?
O jornalista tem é que apresentar os fatos, independente do leitor gostar ou não. Se não gostar, fazer o quê? A realidade nem sempre se apresenta da maneira como queremos.
É importante também não se pautar pela mobilização artificial das redes sociais, que virou território de ninguém. Observe qualquer área de comentários de qualquer veículo que tenha versão on-line: é um festival sem fim de boçalidade, de ignorância e de agressividade. Raras são as considerações válidas sobre os termos que estão sendo discutidos. E essa gente, é importante ressaltar, é apenas parte dos leitores, não são todos eles.
A cobertura da operação Lava Jato, por exemplo, me parece completamente orientada para agradar parcela do público que quer punição a qualquer custo. O moralismo inconsequente virou a norma de redação. E ai de quem defender o que está escrito na Constituição. Se uma norma, artigo ou inciso é utilizada para evidenciar uma falha no processo investigativo ou no julgamento, o sujeito já se torna alvo de toda sorte de ataques. Vira um verdadeiro criminoso, um defensor da impunidade, um Judas a ser malhado em praça pública.
4 Quando o Lula fala em “regulamentar a mídia” ele quer dizer o que, mesmo?
Quer é estrangular a liberdade de expressão, como fizeram seus companheiros ditadores na América Latina. O PT só gostava da imprensa quando ela ajudava a fustigar os governos a que o partido se opunha. Depois de servir ao seus propósitos acabou vista como obstáculo no projeto de perpetuação no poder, mesmo que a mídia jamais tenha feito a Lula ou a Dilma qualquer tipo de oposição.
O Brasil vive a pior crise econômica de sua história e a falta de credibilidade nas instituições impera, mas o grande projeto de Lula e do PT é botar um garrote nos meios de comunicação. Isso é revelador de suas prioridades: os interesses partidários se sobrepõem aos interesses da nação.
Qual brasileiro acha que a regulamentação da mídia é prioritária e imprescindível? Isso é pauta das esquerdas, interessadas em anular qualquer tipo de oposição que enxerguem. E a mídia, mesmo sem ser oposição, assim é vista.
Qual é o sentido de regulamentar a mídia que não o de controlar o que é divulgado? No Brasil, tudo já é muito regulamentado. Acho que nossos veículos de comunicação precisam de concorrência, isso sim. E não são caudilhos socialistas que podem propiciar isso, apenas o livre mercado.
A televisão e a radiodifusão são controladas pelo Estado. Para ter uma rádio ou uma TV é preciso de autorização governamental. É claro que isso possibilita a concentração de informação e a troca de favores entre os agentes governamentais e aqueles que ambicionam possuir tais veículos. Aliás, não é incomum que rádios e TVs acabem nas mãos dos próprios políticos. Há senadores e deputados proprietários de verdadeiros impérios de comunicação regional.
Há mídia já está regulamentada. Ela precisa é se ver livre do Estado para prosperar ainda mais.
5 Há quem acredite que todo mundo é comprado, comprometido, cooptado; não existe jornalismo sério na grande imprensa. Como vê isso? Em tempo: você se considera jornalista mainstream ou alternativo?
Isso é coisa de recalcado. É óbvio e patente que há muitos incompetentes e depravados intelectuais no mainstream, mas o jornalismo alternativo não é muito melhor na média.
Esta Gazeta do Povo é parte integrante do mainstream. Faz jornalismo da mais alta qualidade. Da mesma maneira, poderia escrever páginas e páginas com profissionais do mainstream que são sérios e fazem seu trabalho. E isso vale para os que estão em veículos menores. Não se pode sair por aí equalizando todo mundo.
Como qualquer jornalista, ambiciono o mainstream. Ainda não me considero um porque não estou empregado em um veículo de comunicação de larga escala. Se eventualmente estiver, não duvido que alguém levante dúvidas sobre como consegui o espaço.
6 Costumo dizer que imprensa é que nem filha puta: a gente pode não gostar muito do que ela faz, mas tem de defender assim mesmo. Disserte sobre.
A imprensa como universo de divulgação de opinião, instrumento de veiculação de informação e espaço reflexivo deve ser sempre defendida, independentemente da qualidade das empresas que a compõem. É importante dissociar a imprensa em seu caráter geral dos órgãos de mídia em particular, e dos jornalistas. Os órgãos de mídia e os jornalistas, assim como os políticos e os árbitros de futebol, devem estar sob constante vigilância e crítica.