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O julgamento de Lula foi político, como ele sempre quis

Depois de tantos amanhãs frustrados, desde o início da Operação Lava Jato, o Amanhã finalmente chegou. Lula (ainda) não foi preso, mas sua condenação foi confirmada – com acréscimo de pena – pelos três desembargadores do Tribunal Regional Federal, 4ª região, em Porto Alegre.

Se o juiz Sérgio Moro era “suspeito” e “parcial”, João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus também o são. Há juristas de renome que questionam o resultado – nada mais razoável. Direito é das ciências mais controversas que existem, e poucas vezes é possível dirimir todas as dúvidas e satisfazer todas as inteligências, como reza a cartilha.

A presunção de inocência, princípio indispensável do direito em países livres, não pressupõe que as garantias se transformem num garantismo fanático e, no limite, ingênuo. Acreditar na inocência de Lula é ingenuidade demais para quem sabe que crimes dessa natureza são, por óbvio, sofisticados o bastante para que as provas não sejam tão pornográficas como gostaríamos que fossem. Não houve um nu frontal para impressionar a audiência. O conjunto da obra – o conjunto probatório – fundamenta a condenação. Ademais, os recursos, que no Brasil são tantos, estão aí para isso: que seus advogados façam bom uso deles.

Mas há quem negue e tenha motivos e argumentos para isso. Não falo dos petistas, que estes negam a própria mãe, mas advogados e comentaristas jurídicos sérios. Faz parte do jogo e é saudável para o debate institucional. Portanto, façamos o seguinte: por um momento aceitemos o principal reclame de Lula, segundo o qual esse foi um julgamento “político”.

De certo modo ele tem razão como nunca antes na história deste país. Foi, sim, um julgamento político. Desde o primeiro momento, Lula e seus correligionários fincaram pé no que acreditavam ser um disparate – que o ex-presidente e atual condenado fosse inquirido, investigado, julgado e porventura condenado. Desde o primeiro dia, Lula e seus cúmplices ideológicos trataram as investigações com desprezo, deboche, acinte. A justiça tem de respeitar Lula, mesmo que ele não respeite a justiça. Ninguém pode julgar Lula. Lula pode julgar a todos.

O princípio da presunção de inocência ganhou um sentido novo e radical: Lula é inocente até que se prove o contrário. Lula é inocente ainda que provem o contrário. Lula é inocente até mesmo se, ou quando, confessar-se culpado. Lula é inocente, ponto. Porque nesses tantos meses o petista deixou pistas retóricas de que corrompia, aceitava favores, traficava influência, lavava dinheiro e ocultava patrimônio. A diferença é que Lula se acredita um tipo especial de inocente: uma versão política de Maria de Nazaré.

Se Lula não queria que esse julgamento fosse, como ele diz, “político”, que colaborasse com a justiça. Que não tratasse Sérgio Moro, promotores e desembargadores como “moleques”. Se ele não queria um julgamento político, que não chantageasse o país com a promessa de uma candidatura irresponsável, usada como arma política para exaltar ânimos já demasiado exaltados. Ele fez do julgamento um ato político porque assim se movimentava no terreno que conhece. Apostou e perdeu.

Lula não é, há muito tempo, o sindicalista que transpirava nas assembleias e inspirava nos corações algum ideal democrático que se prezasse. Lula é a elite que tanto condenou e condena: rico, arrogante, imprudente e, até segunda ordem, inocente – minto: intocável. Lula hoje é Sarney, Maluf, Collor, Renan Calheiros, Temer: a mesma elite que manda, desmanda e não admite que lhe desobedeçam as ordens e as vontades.

Talvez sua condenação, controvérsias jurídicas à parte, tenha sido “política”. Concedo – o mais do que já concedido – benefício da dúvida. Entretanto, se foi mesmo política, foi porque o feitiço terminou virando contra o feiticeiro, que exagerou na dose dos ingredientes e, sem perceber, assim o quis: com a veemência cega de quem sempre se presumiu não apenas inocente, mas intocável. Ou muito mais do que isso: acima do bem e do mal.

 

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