Em linhas gerais, os princípios do liberalismo econômico são contra-intuitivos, ao menos para o entendimento médio do eleitor quando tem de escolher candidato e proposta respectiva. Ora, como vender o peixe do livre-mercado, se ele me cheira a desamparo social? Menos proteção trabalhista gera mais empregos? Menor regulação facilita os negócios? Austeridade fiscal é condição para um país mais abundante? Poupar é preferível a consumir?
Talvez essa dificuldade seja um dos motivos do sucesso – e, sobretudo, da resiliência – das ideologias de esquerda, ou de suas versões mais retrógradas. Estas são historicamente dirigistas, almejam planejar movimentos econômicos no presente e no futuro, prometem garantir por meio de sentenças escritas no papel direitos que não estão no papel, pretendem constitucionalizar objetos que não são constitucionais nem inconstitucionais em si mesmos: a riqueza, o trabalho, o déficit previdenciário.
Por essas e outras, uma agenda liberal tem de ser responsável e objetiva, mesmo ou principalmente quando impopular. Deve expor com cuidado o que pode e o que não pode ser feito, de que modo, em quanto tempo, e as conexões entre “o que se vê e o que não se vê”, como alertava Bastiat. E isso é tudo o que o governo não tem feito; aliás, isso é o contrário de tudo o que o governo tem feito. Jair Bolsonaro e sua trupe inventaram o populismo liberal.
Um presidente que foi durante anos e anos um deputado inexpressivo, ocupado tão somente com pautas corporativas e sindicais; uma família que seguiu as pegadas do patriarca e se perdeu nas entranhas do Estado, mais preocupada com o que poderia tirar dele; um partido-incubadora para uma candidatura in vitro; uma equipe que junta às pressas algumas figuras liberais, sem traquejo político, a outras figuras políticas, sem traquejo liberal; mais duas dezenas de militares e um puxadinho de batedores de bumbo do mais genuíno reacionarismo.
Não surpreende, portanto, o desencontro de versões, a semelhança entre as news e as fake news, o descompasso entre a expectativa e a realidade. A frustração ante a negativa dos EUA em já recomendar o ingresso do Brasil na OCDE brilha mais forte porque a vitória foi vendida como imediata, quando é possibilidade de vitória futura; o mesmo pode ser dito do acordo entre Mercosul e União Europeia, costurado por mais de vinte anos, concluído por este governo, mas que depende de um sem número de exigências, condições e ajustes que, na melhor e mais otimista das hipóteses, dará frutos depois de algum tempo.
Quais são os perigos desse jogo? O maior deles é o de terminar como o provável resultado das próximas eleições argentinas: a derrota do suposto liberalismo de Macri enterrará, por mais algum tempo, as pretensões de um novo – retifico: de um verdadeiro – governo liberal. Fazer o certo, em política econômica, nem sempre rende aplausos ou engajamento em mídias sociais. No Brasil, essa improvisada mistura de autoritarismo ideológico, incompetência administrativa e má condução política pode servir àqueles outros, de eleições passadas, de heranças malditas, que nunca tiveram vergonha em defender o puro e simples atraso, desde que empacotado com a etiqueta do social.