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Gosto do Silvio Santos. Não que eu assista a seus programas, hoje em dia. Tenho mais o que fazer, até quando não tenho. Mas o dono e apresentador do SBT é um dos grandes nomes da comunicação no país. Apostou sempre numa programação que oscila entre o espontâneo e o vulgar, e de vez em quando o mau gosto faz bem. Soube falar com o povo e se manter relevante por muito tempo. Sua gestão de conteúdo é caótica e por isso mesmo engraçada: inventa quadros com o mesmo entusiasmo com que os destrói. A seu modo, representa uma dose saudável de incorreção política que, em tempos de puritanismo histérico, tem lugar e razão de ser.

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Só que uma coisa é incorreção política, no que tem de irreverente, outra é incorreção moral, no que tem inapropriada. Um exemplo é o “desfile” de crianças – vejam bem: crianças, não jovens – de maiô. Como se fossem mulheres. A intenção era essa: apreciar e julgar a beleza de crianças de maiô. O nome da esquisitice é “Miss Infantil”. Jurados avaliam as meninas. Meninas se expõem à avaliação. Palavras dele: “Vocês do auditório vão ver quem tem as pernas mais bonitas, o colo mais bonito, o rosto mais bonito, o conjunto mais bonito”.

Convenhamos, alguns limites não precisam – nem podem – ser transpostos. Muito embora eu veja algum exagero nas denúncias à objetificação feminina, quando se trata de adultos é uma história; existem defesas, existem debates, existem polêmicas. Quando se trata de crianças é outra bem diferente. Isso me faz pensar, a propósito, no quanto a sexualização infantil – e a objetificação infantil – é disseminada entre aqueles que se acreditam defensores da moral e dos bons costumes. Deixo mais claro: antes de acusar certos grupos de atentar contra a inocência das nossas criancinhas, talvez devamos ponderar sobre a responsabilidade de quem acusa. O que será mais perigoso: uma performance artística – de péssimo gosto, registre-se – ou uma disputa de Miss Infantil, em que o auditório avalia as pernas mais bonitas, o colo mais bonito, o rosto mais bonito, o conjunto mais bonito?

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Se a ideia de família está sob ataque, se os valores morais estão sendo erodidos – e compartilho da preocupação –, a verdade é que o ataque vem de todos os lados, de todas as frentes. Falta bom senso. Não faz sentido nenhum defender que o casamento gay, ou uma qualquer representação menos ortodoxa da sexualidade, ofenderá os valores cristãos se, em contrapartida, as famílias cristãs não forem exemplo e veículo autêntico dos valores que dizem defender. Quem mais atenta contra a família tradicional é a família tradicional falida, é a religiosidade fingida, são os pais e mães que abandonam os filhos à própria sorte, os casais que se comprometem até a semana que vem, os programas de tevê que se pretendem politicamente incorretos, destinados à família, e no fim são apenas moralmente incorretos. São apenas errados, sem mas nem porém.