Semana passada eu li uma notícia que me fez coçar a cabeça. Uma mãe, do estado de São Paulo, entrou na justiça contra uma escola que negou a matrícula da sua filha, que tem Síndrome de Down, pedindo indenização por danos morais. Até esse ponto, (infelizmente) não vi nada novo.
O que me chamou a atenção foi o parecer da 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo. O pedido foi negado sob a alegação de que “A garantia de atendimento especializado para jovens portadores de deficiência física vale apenas para as instituições públicas de ensino, e as escolas privadas não têm o dever de se adaptar, podendo recusar alunos caso não contem com a infraestrutura necessária”.
O que? A aluna tem Síndrome de Down.
Além disso, a Resolução do CNE/CEB nº 2/2001, que define as diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica, determina que as escolas do ensino regular devem matricular todos os alunos em suas classes comuns, com os apoios necessários. Qualquer escola, pública ou particular, que negar matrícula a um aluno com deficiência, comete crime punível com reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos (art. 8º da Lei 7.853/89).
O Brasil é um país com práticas que confundem qualquer cidadão.
Eu reconheço os desafios da inclusão nas escolas, da mesma forma que reconheço o esforço necessário para incluir profissionais com deficiência no mercado de trabalho. Nós estamos mergulhados em uma cultura de preconceitos e medo do que não conhecemos.
A educação brasileira é falha desde o seu início, com um ensino público mal administrado, com professores que encaram salas lotadas, são mal formados e mal pagos. O ensino particular tem percalços bem parecidos e em ambos os contextos, temos alunos que não valorizam em nada o trabalho do professor e nem a oportunidade de educação que têm.
Por que?
Porque o nosso mercado de trabalho é selvagem, avaliador e orientado por pressão. Independente do cargo e função. A pressão por resultados é lei e afeta absolutamente todos os trabalhadores, que ao final do mês recebem um salário apertado (para a enorme maioria), se comprometem com o pagamento de uma série de contas e contribuem para a carga tributária mais pesada entre os países emergentes.
O Brasil não é feito de heróis e nem de vítimas.
Tanto na educação, quanto no mercado de trabalho, alunos e colaboradores olham para fora e enxergam governantes corruptos, uma justiça lenta e que não inspira confiança, uma sociedade violenta e um sentimento de descrença em relação ao próprio país.
Escrevo, porque de tempos em tempos é o que eu sinto.
Acredito que esses elementos todos contribuem para a segunda parte do brilhante parecer dos amigos da 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo. Eles declararam que “a autora não foi exposta a situação vexatória, não ostentando discriminação ou preconceito”.
Eles colocaram todo o universo da pessoa com deficiência no mesmo saco, entenderam que o ensino privado não tem a menor obrigação de se adequar (e muito menos aceitar) a matrícula de uma aluna com down e compreenderam que a privação a um direito constitucional à criança não se configura como uma situação vexatória para a mãe.
Definitivamente, o Brasil é um país de práticas que confundem qualquer cidadão.